A inelegibilidade é um impedimento temporário do exercício do sufrágio passivo, ou seja, o cidadão inelegível tem seus direitos políticos parcialmente prejudicados e, em regra, fica impedido de disputar o pleito eleitoral, não podendo, consequentemente, ser eleito. Trata-se da restrição de ser votado.
Gomes (2017, p. 195) aponta que inelegibilidade “trata-se de um fator negativo cuja presença obstrui ou subtrai a capacidade eleitoral passiva do nacional, tornando-o inapto para receber votos e, pois, exercer mandato representativo”. Dessa forma, busca-se proteger a moralidade e probidade administrativa contra possíveis abusos, além de resguardar o processo eleitoral, para que esse seja normal, legítimo e transparente.
As causas de inelegibilidade estão expressamente previstas na Constituição Federal, no artigo 14, §§ 4º a 7º, e em Lei Complementar (LC), como é o caso da LC nº 64/90 (Lei das Inelegibilidades). Dentre as hipóteses que acarretam o impedimento do cidadão disputar um cargo político-eletivo, pode-se citar o caso dos analfabetos, estrangeiros e dos conscritos (indivíduos que estão cumprindo o serviço militar obrigatório).
A lei complementar referida apresenta um extenso rol de situações que, se praticadas, tonam o cidadão inelegível, e outras que precisam ser superadas para viabilizar a participação na disputa por um cargo eletivo. Nesse sentido, o artigo 1º, inciso I, alínea “e”, 1, da Lei das Inelegibilidades, determina que são inelegíveis para qualquer cargo os condenados, por decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado (tribunais ou turmas recursais), pelos crimes contra a economia popular, fé pública, a administração pública ou patrimônio público.
Para Gomes (2017), ao criar o citado dispositivo legal, o Legislador Complementar objetivou cumprir o disposto no § 9º, do artigo 14, da CF/88, o qual manda que seja considerada a vida pregressa do candidato, com fim de que seja preservada a moralidade para o exercício do mandato.
Com base nisto, o Tribunal Superior Eleitoral firmou entendimento, no Recurso Especial Eleitoral nº 0600505-79, de que a prática do crime de desacato a superior, espécie de crime contra a administração pública militar, atrai a supracitada inelegibilidade.
O artigo 298, do Código Penal Militar, aponta que é crime contra a administração militar desacatar superior, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, ou, procurando deprimir-lhe a autoridade. Verifica-se, portanto, que o bem jurídico tutelado é a administração pública militar, sobretudo no que concerne ao desempenho e ao prestígio da função exercida em nome do Estado.
Ressalta o relator da matéria, Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, que desacatar significa “tratar com menos valia a função pública exercida pelo servidor público com o intuito de degradar a própria administração”.
A Corte Eleitoral analisa que a incidência da causa de inelegibilidade leva em consideração, também, a prática de crimes previstos leis penais fora do Código Penal, como é o caso do dispositivo legal que tipifica o crime de desacato no âmbito militar. Vislumbra-se, portanto, repreender condutas atentatórias aos interesses da atividade administrativa.
Dessa forma, para avaliar a ocorrência da inelegibilidade por condenação em crime contra a administração pública, observa-se que é irrelevante o diploma legal onde a conduta está tipificada, porquanto o que é levado em consideração é o objeto jurídico desrespeitado. Assim, independe se a conduta fora tipificada no código penal ou em legislação extravagante, o que se pondera é a lesão à estrutura administrativa e suas atividades.
O militar que cometer o crime de desacato a superior e for condenado estará inelegível desde a condenação até o transcurso do prazo de 8 (oito) anos após o efetivo cumprimento da pena.
Por fim, vale salientar que a simples prática da conduta, sem a existência de um processo para apurar e julgar o crime militar, não é suficiente para ensejar o impedimento ao sufrágio passivo. Se faz necessário observar o devido processo legal, com a garantia do contraditório e ampla defesa ao militar processado. Por conseguinte, somente há de se falar em inelegibilidade após sentença transitada em julgado ou decisão de tribunal.
HENRIQUE ARAÚJO
É advogado, sócio do escritório de advocacia Araújo e Lima Advogados Associados, membro da Comissão Especial de Direito Eleitoral da OAB/TO, pós-graduando em Direito Eleitoral pela PUC-MINAS, em Direito Constitucional Aplicado e Direito do Consumidor pela FALEGALE.
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