A excelente entrevista a Quadrilátero da empresária Ana Paula Setti, presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes no Tocantins (Abrasel), evidenciou que o Tocantins, como todo o Brasil, corre sério risco de entrar num buraco do qual levará décadas para sair, com o fechamento generalizado de pequenos negócios. Só no setor dela, a estimativa é de que 68% de bares e restaurantes possam ser extintos com a pandemia da Covid-19. Eles não conseguem atuar plenamente e, volta e meia, precisam suspender o atendimento por conta das medidas restritivas.
No ano passado, a situação foi muito levemente desestressada pelo capengo apoio de linhas de crédito especial, como o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) e o Benefício Emergencial para Preservação do Emprego e da Renda (BEm). Houve muita reclamação de que o crédito não chegava na ponta. Ficou mais no discurso do que na prática. De toda forma, aliviou para quem conseguiu acesso.
O que fica cada vez mais claro, porém, é que não adianta crédito, ainda que com juros subsidiados, carência e prazo alongado. Há limite para o endividamento. Grande parte dos micro e pequenos empresários está endividado e queimando todo o patrimônio para sobreviver à pandemia e às necessárias medidas de restrição.
Contudo, passaram do limite do possível e do suportável. É preciso uma ação urgente e coordenada de União, Estado e municípios para injetar recursos a fundo perdido para salvar a economia. Não se trata apenas de uma empresa. Todo o sistema econômico está ruindo. A partir de parâmetros bem definidos, como vulnerabilidade e empregabilidade, os três entes federativos devem sacrificar parte de seu ajuste fiscal dos últimos anos para socorrer empregos e até a própria arrecadação, que também corre risco. Estamos em estado de guerra, totalmente fora da normalidade.
Sempre enchem o peito para dizer que 70% dos postos de trabalho no Tocantins são gerados pelos pequenos negócios. Pois são justamente eles que correm o risco de ser dizimados se não houver uma injeção de recursos para a sua sobrevivência.
Até porque a situação não se normalizará enquanto não houver a vacinação em massa e, pelo andar a carruagem, estamos muito distantes dela. Mas as contas dos micro e pequenos se avolumam, o desemprego e o desespero aumentam.
Na verdade, os entes não querem abrir mão de parte da arrecadação, enquanto impõem que o empresário renuncie ao seu faturamento em nome da saúde pública. É um absurdo, por exemplo, que os estabelecimentos tiveram que pagar em janeiro taxas cheias de Vigilância Sanitária e de funcionamento, inclusive com a devida correção.
Outro ponto a ser debatido: por que o Estado não pode, se não isentar, pelo menos reduzir drasticamente o ICMS sobre energia e água durante a pandemia? IPTU e ISS do município também precisam ser reduzidos. É uma afronta que o Poder Público, em todas as instâncias, esteja cobrando normalmente seus tributos, como se a vida aqui fora seguisse como antes desta tragédia que assola o Brasil e sua economia.
Ou os três entes se unem para encontrar uma forma de injetar dinheiro nos micro e pequenos negócios para garantir sua sobrevivência, ou vamos cair num abismo social e econômico tão profundo que sabe-se lá quando conseguiremos sair dele.
Falta essa sensibilidade. A saúde é fundamental e a suspensão das atividades, em vários momentos, inevitável; mas o Poder Público não pode deixar que saiamos dessa crise num cenário de terra arrasada.
E caminhamos celeremente para isso.
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Post Scriptum
Excelente iniciativa – O projeto “Acipa contra a fome” é uma excelente iniciativa. Não podemos esperar que apenas o Poder Público aja para socorrer os grupos mais fragilizados por esta crise. É responsabilidade de toda a sociedade. Vivemos num mesmo país, Estado e cidade. A dor do outro precisa tocar a todos.
Elitismo sanitário – É uma grande temeridade a autorização para empresas comprarem vacinas contra a Covid-19. A impressão é de que estamos criando mais um degrau na nossa pirâmide social de total desigualdade: as classes dos vacinados e dos não vacinados. Empresários deveriam é pressionar o governo inerte de Jair Bolsonaro a agilizar a aquisição de vacina. Mas a aplicação deveria ficar com o sistema público. O radialista Carlos Andreazza, na CBN, precisou o termo do que está ocorrendo: elitismo sanitário.
Pré e pós-iluminismo – Na manhã desta quarta-feira, numa atitude pré-iluminista, Jair Bolsonaro foi a Chapecó visitar o prefeito “curandeiro”, que oferece o já comprovado ineficaz “tratamento precoce” contra Covid-19 e que, por isso, foi elogiado na live circense do presidente. Tudo embromação. Por lá, mortes e casos se avolumam. Na noite desta quarta, Bolsonaro jantará com empresários para mostrar compromisso com a economia, o que exige postura pós-iluminista. Qual a chance dele ser levado a sério?
O ideal é não pegar – A pressão sobre o governo e prefeituras para a instalação de mais UTIs está grande. O tanto mais que for possível implantar melhor. Mas estamos chegando a um esgotamento nacional: colocar UTI é mais fácil do que ter gente especializada para operá-la. E faltam profissionais no mercado. O ideal mesmo é tomar as medidas sanitárias adequadas e evitar aglomerações. Ou seja, mais eficiente que UTI é não ser pego pela Covid-19.
CT, Palmas, 7 de abril de 2021.