Por meio de portarias publicadas no Diário Oficial do dia 23 de março, a Prefeitura de Palmas se utilizou de requisições administrativas para garantir atendimento de algumas especialidades na rede municipal saúde. A medida gerou reação de alguns médicos que acionaram a Justiça e conseguiram liminarmente a suspensão dos atos. O sindicato da categoria (Simed) criticou o município pelo posicionamento “ilegal” e “arbitrário”.
A requisição administrativa é um instrumento de intervenção estatal no qual o Poder Público utiliza bens móveis, imóveis ou serviços particulares, mas com a devida indenização posterior. A medida está prevista no inciso XXV do artigo 5º da Constituição Federal, mas somente “em caso de iminente perigo público”. A Lei do Sistema Único de Saúde (SUS) também prevê diligência, porém a limita para “atendimento de necessidades coletivas, urgentes e transitórias”.
Com base nestes dispositivos que o juiz Roniclay Alves de Morais, da 4ª Vara da Fazenda e Registros Públicos de Palmas, suspendeu liminarmente os efeitos das requisições administrativas da Secretaria Municipal de Saúde (Semus). O pedido foi feito pelas médicas Greice de Cássia Sousa Oliveira, Ludmila Franco e Marielza dos Santos em Ação Ordinária e Declaratória de Nulidade de Ato Administrativo.
Roniclay Alves argumenta na decisão proferida no sábado, 14, que a requisição administrativa deve, “no mínimo”, suceder a um ato do chefe do Poder Executivo que tenha decretado alguma situação de emergência estabelecida na Legislação, o que, segundo destaca, não acontece no caso. “Nota-se a inexistência de Decreto emitido pelo prefeito de Palmas a respeito da existência do perigo público iminente sustentado pela municipalidade”, anota.
Segundo o magistrado, a Prefeitura de Palmas apenas decretou à Semus a competência para expedir ato de requisição administrativa no âmbito da gestão municipal, o que foi feito por meio de portarias, medida que também foi questionada. “Não é a via adequada para atingir os autores, por se tratarem de particulares”, justifica Roniclay Alves. O juiz ainda reforça que as médicas responsáveis pela ação ainda são servidoras do Estado e também exercem a medicina no âmbito privado.
“Caso as requisições administrativas não sejam suspensas nesta fase processual, possivelmente os autores terão prejuízos físicos, psicológicos e financeiros vez que terão um aumento significativo de carga horária para cumprimento da requisição, sem prejuízo dos serviços já prestados, na esfera estadual e privada”, completa Roniclay Alves antes de conceder a liminar.
“Abuso de direito”
A 1ª Vara da Fazenda e Registros Públicos de Palmas também concedeu liminar para suspender requisições administrativas da Semus. O juiz Manuel de Farias Neto atendeu na sexta-feira, 13, o mandado de segurança impetrado pela médica Raquel Prudente de Carvalho Baldaçara. Na decisão, o magistrado também questionou a maneira como a medida foi adotada pela Prefeitura de Palmas.
“A um só tempo, é possível verificar abuso de direito tanto no exercício de delegação que foi atribuída ao secretário, ao editar Portaria de Requisição Administrativa que não nas hipóteses expressas ali previstas de ‘perigo iminente, de calamidade pública ou de irrupção de epidemias’, quanto na justificativa apresentada pela autoridade impetrada, em desalinho com a legislação federal descrita”, anotou.
Secom
As requisições administrativas foram assinadas pelo ex-secretário Nésio Fernandes. Na época, a prefeitura argumentou que a medida foi adotada para garantir atendimento médico aos usuários do SUS de Palmas nas especialidades de nefrologia, nefropediatria, neuropediatria, gastropediatria, hematologia, alergia e imunologia.
Em material da Secretaria de Comunicação de Palmas (Secom), Nésio Fernandes afirmou que as requisições administrativas foram “medidas excepcionais” adotadas após terem sido esgotadas todas as possibilidades de contratação dos serviços. “Nós fizemos concurso público, editais de credenciamento, propostas de terceirização, uma série de iniciativas que a Semus tomou para poder garantir a oferta de atendimentos médicos especializados”, garantiu.
“Infelizmente, existe uma ausência de interesse da iniciativa privada, seja ela desenvolvida por profissionais liberais ou por empresas, de participar de maneira suplementar do SUS. Quando se esgota todas as possibilidades de contratualização, existe um instrumento chamado requisição administrativa, que pode ser usado como último recurso num processo de garantia de acesso a serviços diversos, no nosso caso, os serviços de saúde”, argumentou por meio da Secom de Palmas.
Medida arbitrária
Sobre o caso, a presidente do Sindicato dos Médicos (Simed), Janice Painkow, disse que aguardará o julgamento final das ações, mas adiantou ter confiança de que a Justiça manterá o entendimento de que as requisições têm sido “ilegais e arbitrárias”.
“O município precisa realizar concurso público, implantar uma política de recursos humanos com remuneração adequada e um plano de carreira que contemple todos as especialidades, só assim terá condições para suprir a ausência de profissionais na rede pública e combater eventuais demandas reprimidas de especialidades”, defendeu.
O CT acionou a Secom de Palmas por e-mail para se manifestar sobre as decisões e as críticas do Simed, mas não recebeu resposta até a publicação desta matéria.