O setor mais prejudicado pelas aventuras e irresponsabilidades fiscais ocorridas no Tocantins em vários governos por longos 13 anos foi o servidor público. Nesse período foram construídos Planos de Cargos, Carreiras e Subsídios (PCCS) sem qualquer conexão com a realidade arrecadatória do Estado. Em consequência, hoje acumula-se uma montanha de passivos com o funcionalismo formada por progressões e datas-base que não podem ser liquidadas por absoluta incapacidade de pagamento do erário estadual.
Quando houve uma ação de ajuste com o ex-governador Mauro Carlesse (UB) — diga-se: totalmente necessária —, o sacrifício coube primeiro ao servidor, com o congelamento de seus direitos trabalhistas: progressões e datas-base. Ou seja, seja com a falta de planejamento e estudos de impacto na implantação de direitos, seja depois para remediar seus efeitos colaterais, quem sempre sai prejudicado é o funcionalismo. Por isso, sempre defendi a importância dos sindicatos buscarem conquistas, mas sem perder a noção da realidade. Afinal, os políticos, que só se importam com votos, passam, mas os servidores ficam.
Com a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) do teto do funcionalismo estadual de autoria do Executivo, enviada à Assembleia na terça-feira, 15, logo pensei que o pesadelo do “vale tudo por reeleição”, causa de nossa tragédia fiscal naqueles 13 anos citados acima, havia voltado. Não é contra a reivindicação. Depois de ouvir as categorias atingidas e de refletir sobre o tema, avalio que os servidores do alto da pirâmide do Estado têm razão.
Não podem ser discriminados ou relegados para último nível da escala das prioridades porque ganham bem. Estudaram muito, passaram em concurso, têm função de altíssima responsabilidade. Garantir a eles uma excelente remuneração é uma obrigação do governo. No mérito, a reclamação é justa: enfrentam enormes perdas salariais há anos, seu ganho vinculado ao salário do governador pode tornar suas vidas reféns de joguetes políticos e os técnicos mais qualificados do Estado ficam desmotivados a assumir funções estratégicas porque não há compensação financeira, por causa do teto de remuneração rebaixado.
Porém, com as políticas de ajustes implantadas a partir de 2018, o governo está ainda em meio a uma situação delicada em que começa a querer ganhar condições de respirar sem aparelhos. Qualquer medida de concessão de diretos agora deve ser precedida por um profundo estudo de impacto nas contas e que, a partir disso, integre um planejamento de médio e longo prazos.
Seria absurdo o governador Wanderlei Barbosa (Republicanos) aceitar a implementação de qualquer direito em favor de classe A ou B, simplesmente por pressão corporativa ou política — esta última vinda de representantes populares que serão beneficiados pelo ato e que, por isso, legislam em causa própria.
Na conversa que tive com uma importante fonte palaciana sobre o tema na noite dessa quarta-feira, 16, três pontos se destacaram: o primeiro foi o reconhecimento de que o envio da PEC para Assembleia foi um açodamento, como resultado da intensa pressão contra o governo; depois que o recuo é para que o Palácio estude, neste momento ainda de recomposição das contas públicas, uma medida que beneficie o máximo possível de servidores, ao invés de apenas uma categoria; e — para mim o mais importante — trata-se de uma demonstração pública de que o governador Wanderlei está efetivamente comprometido com o equilíbrio fiscal.
Isso chama-se responsabilidade. Wanderlei está no Palácio desde 2018 como vice e como governador desde outubro do ano passado. Viu a situação em que o Estado foi encontrado e acompanhou, passo a passo, a luta para o ajuste das contas. Dessa forma, adotar as mesmas políticas desastrosas que ao longo de pouco mais de uma década levaram o Tocantins ao fundo do poço fiscal, no caso dele, seria uma atitude até mais irresponsável do que a dos governantes do passado, responsáveis por esse tombo do Estado.
Dessa forma, vejo esse recuo sobre a PEC do Teto, com todo o desgaste natural que ele gera em meio às categorias que seriam favorecidas, como um sinal de Wanderlei à sociedade tocantinense de que está realmente comprometido com a saúde fiscal do Tocantins.
Quem acompanha esse drama do Estado há anos e sabe de seus efeitos devastadores na vida do povo tocantinense, não tem dúvida de isso é muito bom.
CT, Palmas, 17 de março de 2022.