Não é de hoje que a advocacia vive uma luta diária em defesa de suas prerrogativas, buscando avanços e, infelizmente, ainda tendo que enfrentar obstáculos para preservar conquistas que pareciam já consolidadas. Nessa jornada contínua, após ampla mobilização da classe, obtivemos êxito na reafirmação da expressão estampada no art. 85 do CPC, especialmente no que diz respeito aos honorários sucumbenciais.
A regra, que inicialmente era clara e objetiva, estabelecendo percentuais de 10% a 20% na fixação dos honorários sucumbenciais, sofreu indevida flexibilização por alguns julgadores – inclusive aqui no Judiciário tocantinense – sob o argumento de que representava uma suposta violação aos princípios da razoabilidade, proporcionalidade e equidade, com o objetivo de preservar o erário público.
No entanto, como Paulo Bonavides já nos ensinava, os limites entre a interpretação e a criação do direito são tênues, inseguros e instáveis, e às vezes o intérprete passa quase imperceptivelmente da interpretação declaratória para a interpretativa, e dessa forma, o mais grave, para a interpretação contrária à lei. O juiz ou o intérprete corre o risco de não apenas interpretar a lei, mas de reformá-la.
Não se pode esquecer que os honorários têm natureza alimentar, o que torna contraditória a abordagem e a “preocupação” de alguns julgadores com o eventual ônus imposto aos cofres públicos, considerando que eles próprios são tão bem remunerados por esse mesmo ente pagador. A propósito, Claudio Lamachia e Estefânia Viveiros, em uma obra específica sobre o tema, já alertavam que “os honorários representam para o advogado o mesmo que os subsídios representam para a magistratura. Na atividade privada que exercemos, não recebemos subsídios todos os meses, auxílio-moradia, férias de dois meses por ano ou aposentadoria garantida. O sustento de nossas famílias e a manutenção dos escritórios dependem exclusivamente do sucesso de nossa atuação profissional. Cabe à magistratura cumprir e fazer cumprir a lei, não desrespeitar a advocacia”.
Resta agora mobilizar nossa classe aqui no Tocantins para garantir que a magistratura local, em todas as suas instâncias, aplique o Tema 1076, que deixou claramente estabelecido que “a fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados”.
Durante o julgamento, o Ministro Og Fernandes refutou veementemente a tese utilizada para descumprir a norma processual, ao afirmar que “quando o parágrafo 8º do artigo 85 menciona proveito econômico ‘inestimável’, refere-se claramente a casos em que não é possível atribuir um valor monetário à disputa (como pode ocorrer em ações ambientais ou ações familiares, por exemplo). Não devemos confundir ‘valor inestimável’ com ‘valor elevado‘”.
Esse entendimento foi reforçado posteriormente com a publicação da Lei 14.365/2022, que acrescentou os §§ 6º-A e 8º-A ao art. 85 do CPC, proibindo a apreciação equitativa quando o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou o valor atualizado da causa forem líquidos ou liquidáveis. Além disso, estabeleceu que, quando a fixação equitativa for aplicável, deverá observar os valores recomendados pelo Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil a título de honorários advocatícios ou o limite mínimo de 10%, prevalecendo o que for maior.
A Presidente do STF, Ministra Rosa Weber, em abril do presente ano, ao julgar o Recurso Extraordinário com Agravo (Are) 1.432.032/SP, garantiu a vigência do art. 85, reafirmando o que foi decidido no ano anterior no julgamento do Tema 1076.
Assim, ao longo de minha trajetória na advocacia, tenho percebido que a luta pelas nossas prerrogativas será constante e talvez interminável, enquanto as promessas de candidatos que se apresentam como o “defensor máximo das prerrogativas” a cada três anos nas eleições da classe se mostram apenas retórica eleitoral. No Tocantins, devemos respeitar o trabalho de todas as gestões anteriores que lutaram por essas conquistas, e é oportunista qualquer discurso que tente monopolizar um tema tão importante e caro para a classe.
Neste exato momento, está em tramitação o Projeto de Lei 4.830/2020, que busca assegurar à advocacia previdenciária o direito de receber seus honorários contratuais diretamente no âmbito dos processos administrativos. Essa medida representará, sem dúvida, um avanço significativo para a classe. Ao dizer “classe“, refiro-me à advocacia como um todo, independentemente de atuar ou não na área previdenciária. Portanto, devemos nos unir para garantir a aprovação desse projeto, pois cada conquista possibilita o avanço de outras pautas em uma matéria tão importante para todos nós.
Se o saudoso Alexandre Magno Abrão, conhecido como Chorão, lutasse nos tribunais como nós, talvez um de seus versos mais cantados seria “nossa história, dias de luta, dias de mais luta!“. Sigamos lutando e escrevendo nossa própria história!
LEONARDO MACIEL
É advogado