Na Suécia, deputados não têm assessores, dormem em quitinetes e pagam até pelo cafezinho que tomam. Segundo reportagem da BBC Brasil, seus gabinetes têm 7 metros quadrados, os apartamentos funcionais são pequenos e se impõe rígidos limites para o uso do dinheiro dos contribuintes no exercício da atividade parlamentar.
Ao contrário de nossos congressistas, deputados suecos não têm direito a verbas para fretamento de aeronaves; aluguel e demais despesas de escritório político na base eleitoral, nem ressarcimento de gastos com médicos; auxílio-creche pago por cada filho até os seis anos de idade; auxílio-mudança para se transferir para a capital; fundos para contratação de consultorias, assinaturas de publicações e serviços de TV; além de verba para divulgação de mandato. A matéria do site da BBC Brasil ainda diz mais: imunidade parlamentar é um conceito que não existe na Suécia.
A BBC conta que os carros oficiais são poucos, e para uso limitado. São apenas três, modelo Volvo S80, à disposição somente do presidente do Parlamento e seus três vice-presidentes, e para eventos oficiais. “Não é um serviço de táxi”, diz René Poedtke, do setor administrativo do Parlamento. “Os carros não estão disponíveis para levá-los para casa ou para o trabalho.”
“Somos cidadãos comuns”, disse à BBC o deputado Per-Arne Håkansson, do partido Social-Democrata, em seu gabinete no Parlamento sueco. Ele ainda acrescentou: “Não há sentido em conceder privilégios especiais a parlamentares, uma vez que nossa tarefa é representar os cidadãos e conhecer a realidade em que as pessoas vivem. Também pode-se dizer que é um privilégio em si representar os cidadãos, uma vez que temos a oportunidade de influenciar os rumos do país”.
A reportagem relata também que nenhum deputado sueco tem o privilégio de aumentar o próprio salário, que é determinado por um comitê independente, chamado Riksdagens Arvodesnämd, composto por três pessoas: um presidente, via de regra, um juiz aposentado; e dois representantes, em geral ex-servidores públicos ou jornalistas. O comitê é nomeado pela Mesa Diretora do Parlamento.
O apartamento funcional do deputado Per-Arne Håkansson tem 46 metros quadrados. Apenas políticos com base eleitoral fora da capital, e que não possuem imóvel próprio em Estocolmo, têm direito a viver neles – ou até em quitinetes – funcionais. E o presidente do Parlamento sueco não conta com residência oficial. “Os apartamentos funcionais têm em média 45,6 metros quadrados. Já as quitinetes funcionais têm apenas 16 metros quadrados. Do total de 197 imóveis administrados pelo Parlamento sueco, apenas oito dispõem de espaço entre 70 e 90 metros quadrados”, conta a reportagem.
E veja o que mais nos traz a BBC: o erário paga apartamentos funcionais exclusivamente para parlamentares. Cônjuges de deputados, familiares e afins não podem morar nem mesmo pernoitar em propriedade do Estado sem pagar. “Quando o familiar de um parlamentar passa uma temporada no imóvel funcional, o deputado tem prazo de um mês para ressarcir o erário pelos dias de pernoite”, diz a reportagem.
Se a esposa de um deputado do interior decide viver no apartamento funcional da capital com o marido, cabe a ela arcar com a metade do valor do aluguel. “É claro que não pagamos para ninguém morar de graça, a não ser os parlamentares com base eleitoral fora da capital”, diz a chefe do setor de Serviços Parlamentares, Anna Aspegren.
Ou seja, a Suécia trata os políticos como eles são: servidores públicos, nada mais que isso. Essa é a grande diferença para o Brasil. Aqui trazemos, ao longo de mais um século, a herança do império, e, por isso, tratamos nossos representantes como “sangue azul”: são barões e baronesas, duques e duquesas. Se não são tratados como servidores, mas como membros de uma corte imperial fictícia, então, têm direito a arrancar todo sacrifício do pobre contribuinte brasileiro.
O projeto indecente – mais um – aprovado pela Câmara na noite dessa quarta-feira, 15, que torna crime discriminação de políticos (ou, pelas entrelinhas, tratá-los como qualquer outro cidadão), avança mais uns quilômetros nesse sentido. Nossos “barões e baronesas, duques e duquesas” estão cada vez mais legitimando um tratamento acima dos comuns. Eles, que gozam de tudo o que é mordomia, não têm dúvida de ter esse direito.
Estamos a anos-luz de distância do tratamento exato que os políticos precisam ter, como respeitáveis – sim – servidores públicos, nada mais, nada menos que isso. A Suécia deve ser a referência de para onde devemos nos mover. Mas, para chegarmos lá, é necessário mudar a mentalidade do eleitorado e parar de tratar agentes políticos como membros de uma corte imperial que não existe no Brasil desde 1889.
Enquanto isso não ocorrer, continuaremos a eleger síndicos e a tratá-los como “barões e baronesas, duques e duquesas”, pagando uma indecência por isso, com nosso sangue e lágrimas.
CT, Palmas, 15 de junho de 2023.
P.S.: Para quem quiser ler a íntegra da reportagem da BBC News sobre o tema, é só clicar aqui.