Caro secretário Deusiano Amorim,
Escrevo-lhe para cumprimentá-lo pelo acordo que resultou no encerramento dos protestos dos policiais penais, o que estava gerando apreensão não só em parentes e presos, mas em toda a população tocantinense. Afinal, um motim num presídio coloca em risco, para além das partes envolvidas, todos os moradores da cidade e região onde ele ocorre. Por isso, é um alívio para a sociedade o entendimento com a categoria.
Por mais que o governo tenha sua razão ao dizer que os policiais penais contam com um dos melhores salários do País, a categoria também está certa de cobrar a mesma remuneração do antigo cargo de agente penitenciário (R$ 7.315). Se o policial penal substituiu o agente penitenciário, por que ganha menos? Diminuiu o serviço? Se tem algo em escalada no Brasil é a população carcerária. Ou seja, o trabalho desses profissionais é cada vez maior, bem como os riscos que correm. Então, por que não conceder a isonomia?
De toda forma, que bom, secretário, que o movimento chegou ao fim. Houve até um reconhecimento do presidente do Sindicato dos Policiais Penais do Tocantins (Sindippen), Wilton Angelis, sobre a compreensão do governo, o que mostra a satisfação alcançada, ainda que a questão da isonomia salarial tenha ficado pendente.
O movimento provocou uma reflexão sobre a importância desses profissionais para a segurança do Estado. O Tocantins tinha em outubro 3.738 presos para 1.063 policiais penais, distribuídos em 24 unidades prisionais. Parece um número pequeno, mas, na comparação com os vizinhos e considerando o fato de sermos um Estado pobre, a situação carcerária tocantinense é preocupante.
Estamos distantes de São Paulo, cujo número de presos representa 1,74% de sua população total, e do Rio de Janeiro, com 0,3%. Mas, quando olhamos os Estados vizinhos, algo estranho acontece. Enquanto o número de presos em unidades tocantinenses representa 0,24% de sua população — na verdade, não tão longe assim do Rio –, no Pará esse índice é de 0,15%, no Maranhão, de 0,14%; em Goiás de 0,23%; e no Piauí, de 0,19%.
Não tenho dúvida, secretário, de que essa proporção elevada da ocupação carcerária no Tocantins é resultado da conjunção social, política e econômica nefasta de miséria (um terço da nossa população está abaixo da linha de pobreza) com falta de recursos para se investir no sistema penitenciário e falhas na segurança pública.
De toda forma, Dr. Deusiano, esse barril de pólvora sobre o qual o Tocantins tenta repousar tranquilamente só não explode por causa dos homens e mulheres que compõem a Polícia Penal. Além de amargar a desvalorização profissional — o que se consolida com a falta de isonomia, uma vez que a categoria que a antecedeu tinha remuneração maior –, ainda colocam suas vidas diariamente em risco, convivendo com a situação de completa desumanidade dos presídios brasileiros, onde seres humanos — sim, eles o são, mesmo tendo cometido crimes por vezes horrendos, pelos quais devem pagar, mas não de forma indigna — são tratados como os detentos das masmorras medievais.
Claro que não é um cenário criado por um governo, mas resultado de um processo histórico de marginalização, sobretudo, das populações socialmente excluídas. Isso fica muito evidente, secretário, quando se observa o perfil do preso brasileiro: jovens, negros e com baixa escolaridade. Claros traços, antes de tudo, de segregação social, de uma sociedade em que a elite se regateia com recursos dos pobres contribuintes, sem se preocupar em garantir dignidade e cidadania às camadas mais frágeis estocadas na base de sua pirâmide.
Enfim, secretário, hoje essa mesma elite tocantinense que come bem e mora bem vai dormir mais tranquila com o fim do movimento dos policiais penais, que, para o conforto dela, continuarão colocando suas vidas em risco diariamente.
Saudações democráticas,
CT