Concluído nesta quarta-feira, 21, o primeiro inquérito da Operação Espectro, que investiga a existência de funcionários fantasmas na Administração pública municipal e estadual do Tocantins. Nesta etapa, a Polícia Civil desvendou esquema entre servidores da Assembleia Legislativa (AL). O ex-diretor Geral da Casa Antônio Ianowich, o coordenador de Almoxarifado, Flávio Negreiros, além do servidor fantasma Danilo Parente, foram indiciados por vários crimes. Após a PC citar a participação de Negreiros nos atos ilícitos, a Assembleia Legislativa decidiu exonerá-lo.
Essa primeira fase da operação foi conduzida pelo titular da Delegacia de Repressão a Crimes de Maior Potencial contra a Administração Pública (Dracma), Guilherme Martins. Em coletiva à imprensa, na manhã desta quinta-feira, 22, ele orientou a atual gestão do Legislativo tocantinense focar na fiscalização da frequência efetiva dos servidores, com instalação de ponto eletrônico, e exigir moralidade administrativa.
Conforme o delegado, o valor recebido por Danilo Parente ilegalmente foi de aproximadamente R$ 170 mil, incluindo salário, férias, auxílio alimentação, décimo terceiro e encargos. Num único dia ele chegou a sacar R$ 90 mil, numa agência de Paraíso do Tocantins e repassou ao operador da organização Flávio Negreiros, em Palmas.
A polícia solicitou à Justiça o bloqueio de bens, prisão temporária dos envolvidos e outras medidas cautelares, mas o juiz da 3ª Vara Criminal de Palmas, Rafael de Paula, indeferiu todos os pedidos, mesmo com o parecer favorável do Ministério Público Estadual (MPE). Segundo o delegado, o valor pago indevidamente também não foi recuperado. A Assembleia teria abrido um processo administrativo para recuperar esse dinheiro, mas ainda não recebeu nenhum centavo.
Deputados não são alvos
De acordo com Martins, os deputados estaduais não são alvos das investigações. O delegado também afastou a suspeita de envolvimento do então presidente da AL, Osires Damaso (PSC), que assinava as nomeações. “Ele não é investigado. Ele foi ouvido e colaborou”, explicou o delegado.
Instauração do inquérito
Na mudança de gestão, no início do ano passado, o Legislativo publicou no Diário Oficial diversos atos que haviam ocorrido no período de recesso. Na publicação do dia 1º de fevereiro de 2017 constava o Decreto nº 998 de 2016, nomeando o funcionário Danilo Parente para gerir a Diretoria de Modernização Tecnológica da Assembleia.
O que chamou atenção da imprensa foi o fato da exoneração ter sido publicada no mesmo ato e da nomeação ser retroativa a janeiro de 2016, ou seja, ele teria a receber 12 meses de salário.
Segundo o delegado, a divulgação do caso na mídia foi “primordial” para que o esquema fosse desarticulado. “A imprensa fez uma pressão indireta no elo mais fraco dessa corrente do esquema, que é o servidor fantasma”, salientou.
Com a repercussão, o servidor fantasma decidiu se apresentar, espontaneamente, ao Ministério Público Estadual. O órgão de controle colheu depoimento e encaminhou o caso à Polícia Civil para instauração do inquérito.
O esquema era composto por três pessoas, afirmou o delegado. O líder da organização era o ex-diretor Geral da Assembleia, Antônio Ianowich, que atuou na casa entre 2015 e 2017. O intermediador entre Ianowich e o funcionário fantasma era o coordenador de Almoxarifado, Flávio Negreiros, que continua empregado no mesmo cargo. Já Danilo Parente era o servidor fantasma. Ele recebeu de uma vez só cerca de R$ 170 mil referente a um ano de trabalho que ele não realizou.
Tentativa de ocultar o delito
Após aprender o celular de Danilo, a polícia teve acesso a vários diálogos de negociações entre os integrantes do grupo que comprovaram o crime. Nas conversas de Whatsapp, ficou constatado ainda que Ianowich tentou fazer um “arranjo” para encobrir o esquema e ocultar as evidências do delito.
“Depois que saiu na mídia, eles combinaram como iam justificar para amenizar a situação. Antônio Ianowich ia prestar uma declaração alegando erro administrativo, que a nomeação seria do dia 1º de novembro de 2016 e que o retroativo deveria ser devolvido. Tal conduta foi concretizada e comprovou todo esquema para tentar acobertar o delito”, detalhou o delegado.
Com essas informações, além de depoimentos e extratos bancários, a PC responsabilizou o ex-diretor Geral da Assembleia por viabilizar a nomeação criminosa e enviar as folhas de frequências assinadas por Danilo para o setor de recursos humanos do Legislativo. Conforme Martins, ele vai responder pelos crimes de concussão, peculato, falsidade ideológica, supressão de documentos, associação criminosa, bem como, lavagem de dinheiro.
O operador do esquema, Flávio Negreiros, vai responder por concussão, peculato, associação criminosa e lavagem de dinheiro. Já o funcionário fantasma foi indiciado por peculato, associação criminosa e lavagem de dinheiro. “Devido a sua confissão e colaboração com a investigação ele terá atenuantes”, lembrou o titular da Dracma.
Crimes contra a administração
A Dracma foi criada em abril do ano passado, especificamente para investigar e reprimir os crimes praticados contra a administração pública. Vários outros inquéritos sobre existência de funcionários fantasmas no serviço público, inclusive na AL, estão em andamento por requisição do MPE.
“Tem várias frentes de investigações, vários inquéritos apurando diversos tipos de fraudes nesse sentido, em todos os âmbitos da administração pública”, informou o titular da Dracma, ao ressaltar que os supostos casos de funcionários fantasmas na AL estão sendo investigados na estrutura administrativa, “não envolve, até então, os gabinetes dos parlamentares”.
A PC não pode adiantar nenhuma informação para não atrapalhar as investigações. Contudo, o titular da Dracma destacou que o trabalho está sendo feito de forma “séria e imparcial”. “Trata-se de polícia de Estado e não de governo. A lei é pra todos”, avisou.
Resposta da AL
Em nota ao CT, a Assembleia Legislativa informou que “após tomar conhecimento da suposta participação do servidor [Flávio Negreiros] em atos ilícitos, a Assembleia Legislativa decidiu exonerá-lo imediatamente”.
A Casa alega que uma sindicância realizada em fevereiro de 2017, para apurar possíveis desvios de conduta dos servidores citados, não comprovou a participação de Flávio Negreiros nas supostas irregularidades. Segundo a Casa, isso “só veio à tona nesta data, após a conclusão do inquérito instaurado pela Polícia Civil”.
O Legislativo ressaltou que a investigação se refere a atos administrativos praticados pelo ex-diretor geral da Assembleia Antônio Ianovich, ocorridos no ano de 2016 e início de 2017, ou seja, na gestão anterior.
Conforme a nota, a atual gestão abriu processo licitatório para a contratação e instalação de um sistema de registro biométrico de frequência eletrônica. O pedido foi feito no início do ano pelo MPE, com objetivo de garantir o controle mais eficaz do cumprimento da jornada de trabalho de todos os servidores.
Confira a íntegra da nota da AL:
“Operação Espectro da Polícia Civil: Assembleia reafirma compromisso com a legalidade e a transparência
Ao reafirmar seu compromisso com a legalidade e a transparência de seus atos, a Assembleia Legislativa informa o seguinte:
A Direção Geral desta Casa de Leis determinou a instauração de uma Comissão de Sindicância em 15 de fevereiro de 2017 para apurar possíveis desvios de conduta dos servidores Antônio Ianovich (ex-diretor geral), Flávio Negreiros (coordenador de almoxarifado) e Danilo Parente Barros, supostamente envolvidos na nomeação irregular do último para o cargo de diretor de Modernização Tecnológica.
Após a apuração das denúncias, a Assembleia enviou o processo ao Ministério Público Estadual para as devidas providências.
Na época, entretanto, não ficou comprovada pela Comissão de Sindicância a participação de Flávio Negreiros nas supostas irregularidades, fato que só veio à tona nesta data, após a conclusão do inquérito instaurado pela Polícia Civil.
Desta forma, após tomar conhecimento da suposta participação do servidor em atos ilícitos, a Assembleia Legislativa decidiu exonerá-lo imediatamente.
Vale ressaltar que a coletiva de imprensa convocada pela Polícia Civil nesta quinta-feira se refere a atos administrativos praticados pelo ex-diretor geral da Assembleia Antônio Ianovich, ocorridos no ano de 2016 e início de 2017 na gestão anterior.
A atual gestão do Legislativo estadual já abriu processo licitatório para a contratação e instalação de um sistema de registro biométrico de frequência eletrônica na Assembleia, com vistas a garantir o controle mais eficaz do cumprimento da jornada de trabalho de todos os servidores da Casa e tornar mais eficiente o serviço prestado à população.
Assembleia Legislativa do Estado do Tocantins
Diretoria de Comunicação.”