O Tocantins perdeu 108 vidas para a Covid-19 de abril até esta segunda-feira, 8. São filhos e filhas, pais e mães, irmãos e irmãs, avôs e avós, que tinham muito a contribuir com o Estado, seja pelo ofício que exerciam, seja pelo afeto à sua família em tempos em que todos estamos tão carentes, encurralados pelo vírus em nossos lares e cercados pela insensibilidade psicopata de nosso líder maior, pela estupidez de quem o aplaude acefalamente e pela irresponsabilidade de líderes que colocam negócios à frente da vida. Tempos de um apagão moral, humano e ético.
Levantamento da Coluna do CT mostra que eram 47 avós e avôs com mais de 70 anos, grupo que representa 43,5% das 108 vítimas; e ainda outras 21 pessoas de 61 a 70 anos, num total de 68 idosos, 63% dos mortos. Aqueles segmentos a que, cinicamente, os eugenistas da pandemia se referem como “só velhos”, ao falar dos alvos do novo coronavírus. Muitos saudáveis e a maioria apenas com hipertensão e diabetes, doenças que, com os devidos cuidados, permitem que seus portadores vivam por décadas, desfrutando anos de merecida aposentadoria, de lazer e descanso, ao lado de toda a família.
Interessante que os lunáticos apedeutas seguidores do presidente da República insistem que o que matou esses homens e mulheres não foi a Covid-19, mas a comorbidade. É lógico que não há como dar lucidez a quem escolheu viver na estupidez, mas, para os que ainda guardam um razoável nível de bom senso, é de se perguntar se sem o novo coronavírus essas pessoas morreriam do mesmo jeito agora, ou se continuariam a desfrutar da convivência e do carinho dos seus por muito mais tempo.
É elementar, mas não para quem se deixou consumir seja pela paixão política rasa, seja pela idiotia, e aceita, sem questionar, o discurso genocida que vendem de Brasília numa roupagem de pseudo racionalidade e lógica. Aderem às mais estapafúrdias teorias da conspiração, negam a ciência marcando uma oposição obscurantista e anulam assim o Iluminismo, ostentando suas teses esdrúxulas em postagens nas redes sociais como um ato de vaidade pessoal e orgulho da própria burrice.
Se há os que se amarram ao campo do delírio, enredados por teorias da conspiração que vitimam analfabetos funcionais e completos idiotas, fazem aliança com eles nessa verdadeira frente pró-Covid-19 os que se deixam convencer de que podem retornar à normalidade em meio aos estragos que ainda faz um vírus de altíssima transmissibilidade. Se a ação dos primeiros é marcada pela completa estupidez, a desses últimos é pelo desespero, o que é mais compreensível, mas nem por isso menos fatal, porque esse microorganismo não considera necessidades sociais, políticas ou econômicas.
Diante de um governo federal apático e que sempre procurou ignorar a pandemia, o socorro prometido às empresas não chegou, a necessidade se impôs e a pressão cresceu sobre as autoridades locais. O resultado é o que estamos assistindo assustados, no Tocantins e em todo o Brasil, a flexibilização precipitada das atividades econômicas, antes de o País atingir o pico da doença.
As expectativas daqui em diante são muito piores do que mostra a fotografia neste momento em que todo mundo finge que a Covid-19 é coisa do passado. Um misto de desespero pela sobrevivência e ignorância plena não permitiu sequer que pudéssemos fazer uma quarentena de qualidade. Agora, com a precipitação do fim do isolamento social, vamos adiar por muito mais tempo a chegada ao cume da montanha.
Objetivamente, isso significa que teremos muito mais casos e muitos mais mortos pelo novo coronavírus. Vidas que poderiam ser poupadas agora estão sendo levadas para o cadafalso. Poderão insistir no mesmo argumento cínico de que a letalidade é baixa, circunscrita a idosos e pessoas com comorbidades. Claro, um discurso muito cômodo de se fazer quando quem vai ser sacrificado não é seu pai, sua mãe, seu filho, sua filha, seu avô e sua avó.
No entanto, essa postura é muito reveladora de quem somos e de que sociedade nos tornamos, totalmente entorpecida pela estupidez e pela falta de empatia.
Diante do inevitável, continuarei nesta mesma trincheira em defesa da vida. Como já afirmei antes, não lavarei minhas mãos nessa bacia de sangue.
A todos os familiares dos 108 tocantinenses vítimas da Covid-19, nossos mais profundos sentimentos, respeito e consideração.
CT, Palmas, 8 de junho de 2020.