O termo democracia tem origem grega, podendo ser etimologicamente demos (povo), kratos (poder). Em geral, democracia é a prática política de dissolução, de alguma maneira, do poder e das decisões políticas em meio aos cidadãos. A democracia ocidental tem origem em Atenas, na Grécia Clássica. Os gregos antigos criaram a ideia de cidadania, que se estendia àquele que é considerado cidadão e poderia, portanto, exercer o seu poder de participar da política da cidade.
A experiência brasileira com a democracia, não reflete em absoluto, o espírito que a concebeu, desde a Constituição do Império, as tentativas de implantação dos preceitos democráticos sempre sofreram as adaptações peculiares do nosso povo, na Assembleia Constituinte de 1823, quando o Imperador percebera a possibilidade de redução de seus poderes e a maior participação dos representantes populares nas decisões, tratou de dissolve-la, e por conta própria outorgou a primeira Constituição do país, de lá pra cá, o Brasil sofreu altos e baixos no avanço democrático, revezando entre períodos de abertura e ditaduras, onde sempre prevaleceu a vontade daqueles que estão no poder.
Com o advento da Constituição de 1988, e passado mais de 30 anos buscou-se aprimorar o conceito democrático de participação popular e os mecanismos de liberdade em geral. O povo brasileiro, de modo geral, não é muito afeto ao estudo e a compreensão dos seus deveres e direitos, ele os defende na medida da necessidade ou dos acontecimentos que o envolve, grosseiramente, seria os mesmo que comparar com a compra de um equipamento eletrônico qualquer numa determinada loja , a grande maioria tenta aprender com o manuseio efetivo e nunca se propõe a examinar e seguir o manual e as recomendações de fábrica.
Dados alguns acontecimentos nacionais (Manifestações em passeatas e redes sociais pró fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal, pedidos de intervenção militar, dentre outros) revelam o sentimento de descontentamento popular com certas instituições, estas por sua vez, repelem com rigor, classificando tais manifestações como movimentos antidemocráticos. Daí questiona-se: O que seria a liberdade de expressão dentre os preceitos democráticos?
De acordo com a Constituição artigo 5º,’’ I – ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei’’, independente do mandamento constitucional, se torna óbvio que manifestações filosóficas e políticas devem ser livres em uma democracia, resguardados naturalmente, os preceitos de respeito as leis e a ordem social. Assim, entendemos que, uma vez de forma ordeira e respeitosa, pode-se defender todo e qualquer pensamento, até mesmo contra a própria democracia. Evidentemente que um regime (democracia) que propõe a participação nas decisão, é absolutamente legitimo àqueles (povo), que realmente detém o poder, optar pela mudança de regime, defendo pra si, até mesmo o fim da própria democracia, se isso lhe parecer mais apropriado, refletindo assim o preceito de liberdade na sua plenitude.
Presenciamos recentemente exemplos como do Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição e do estado democrático, instaurar inquérito, investigar e julgar por conta própria, atos de manifestações contra seus membros. Estranho é, democraticamente falando, um dos órgãos de poder, instituído pra gerar equilíbrio entre os poderes, promova a auto defesa corporativa, tal atitude inquestionavelmente, atropela todo e qualquer menção a segurança jurídica. Não defendemos aqui os eventuais exageros, ofensas pessoais e injustas cometidos por manifestantes, até porque as leis preveem medidas de responsabilização pra aquele que cometer. Entretanto, a liberdade tem sido alvo de má interpretação, com fins de coibir manifestações populares, conceito de aplicação da lei se aproxima substancialmente da censura. A posição das instituições em classificar e repelir tais manifestações como antidemocráticas representa grande equívoco, visto que no universo verdadeiramente democrático, defender uma ideia não significa efetivamente concretiza-la, e se tal ideia for uma tendência nacional, modifica-se então, de ideia pra vontade geral, o que também é absolutamente legitimo.
Vivemos momentos que requer um debate nacional profundo sobre o que é realmente democracia, alguns implementam que é a igualdade, a outros, a liberdade, a justiça, a legalidade, enfim, mas sempre visto de forma fragmentada. É certo que todos esses citados, são preceitos democráticos, contudo, não se resume só nisso, a democracia deve ser vista como um conjunto de preceitos que promovem entre todos os indivíduos da sociedade um sentimento de dignidade uniforme, onde cada cidadão, de forma consciente e ativa, se sente parte de um corpo forte, que o protege e o valoriza como membro deste corpo.
No Brasil é comum a expressão: ”SOU DEMOCRÁTICO, MAS TEM QUE SER DO MEU JEITO”, em geral as decisões, que deveriam contar com ampla participação popular por meio do voto, dos debates nacionais, do acompanhamento das ações representativas, acabam por serem tomadas por grupos restritos. Momentos importantes são marcados pelo desinteresse da população nos assuntos do estado e posteriormente, quando tais decisões isoladas refletem negativamente na sociedade, esta tenta reagir, mas sempre de maneira tardia e sem planejamento, movendo esforços desmedidos, que se apresenta quase sem efeito, diante de um sistema viciado e rígido que o próprio povo concebeu.
De modo superficial, segue o povo brasileiro, instituições e indivíduos, sem entender o real significado e como praticar o exercício democrático. Rotineiramente se tornam vitimas de um sistema que impõe a democracia a sua maneira. Confusos por não entender a amplitude e os limites do direito de liberdade, se movimentam a esmo, no afã de defender suas ideias, tropeçando em seus ímpetos e vaidades, moldam um modelo de democracia impar, cheia de arranjos e remendos, que na maioria das vezes buscam, tão somente satisfazer parte do poder ou parcela da população. Fundada na alienação, preservando a essência da pessoalidade e individualidade, que determina o comportamento de todos. Assim, ainda distante do real espírito da liberdade democrática , se faz o Estado Democrático brasileiro, refletindo a nossa ignorância política, instituindo desse modo, uma nova e lamentável liberdade de circunstâncias da famigerada DEMOCRACIA TUPINIQUIM.
RAUCIL APARECIDO
É professor universitário e mestre em Direito Constitucional
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