Caro presidente Amélio Cayres,
Desculpe-me a insistência, mas é que precisamos conversar mais sobre a questão das emendas parlamentares. Não basta apenas perguntar a prefeitos, como vi semana passada, se eles concordam com o aumento de recursos para esse fim. É como questionar o macaco se ele gosta de banana. É óbvio que sim. A discussão aqui na planície é outra: moralidade e transparência. Nem uma, nem outra conseguimos enxergar nesse caso.
Pessoalmente, sou contra a existência de emendas para parlamentares não apenas na Assembleia, mas também no Congresso e câmaras municipais. Elas deturpam a relação Legislativo-Executivo, porque se tornam um fim em si mesmo e parte-se para o vale-tudo para recebê-las; abrem brechas enormes para a corrupção, como estamos vendo nas operações policiais no Legislativo estadual e outros Parlamentos; dificultam a oxigenação da política, já que viram moeda de troca para campanha eleitoral, na medida em que os prefeitos são “amarrados” com esse recursos; e é intromissão indevida nas prerrogativas do Executivo, considerando que obras devem ser fruto de um planejamento macro, não da vontade pessoal de senador, deputado ou vereador.
Contudo, todos os que pensamos assim somos votos vencidos, admitimos, órgãos de controle se calam e sabemos, então, que as emendas vieram para ficar. Mas, pelo menos, que tenham moralidade e transparência. Por isso, gostaria sugerir ao senhor duas medidas que poderiam ser muito úteis para esse objetivo.
A primeira é restringir ao máximo o gasto com shows e eventos. Se o cada deputado deve passar a ter R$ 10 milhões em emendas, é inadmissível que seja franqueado a eles o envio de valores exorbitantes para festas, diante de tantas dificuldades enfrentadas pelos cidadãos tocantinenses. Assim, a primeira sugestão é que os recursos destinados a esse fim não ultrapassem os 5%, o que daria um total máximo de R$ 500 mil a cada um. É impensável que o parlamentar reserve R$ 1 milhão ou muito mais para festança.
Veja só esse dado, presidente, como exemplo das nossas precariedades: de acordo com o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), com base em números de 2020, dos 1,5 milhão de tocantinenses, só 26,9% habitam em residências com sistema de rede de coleta de esgoto, e apenas 30,2% do volume de esgoto gerado no Estado é tratado. Como alguém que tenha o mínimo de responsabilidade pode pensar em derramar milhões de recursos públicos em festança? O único objetivo para quem comete tal desfaçatez é fazer campanha eleitoral com o suor do contribuinte, ou algo não republicano, como apontam as operações policiais.
A segunda sugestão é que se coloque um banner na home do site da Aleto para uma página que detalhe todas as informações sobre essas emendas por deputado. Assim, poderíamos saber de cada parlamentar para qual instituição enviou, o valor, a finalidade e o contato dos responsáveis pelo recebimento. De forma clara, objetiva, sem o labirinto desses Portais sem Transparência, nos quais é mais fácil encontrar o Minotauro do que a informação desejada.
Caro presidente, a sociedade não quer ser inimiga da Assembleia, mas também não quer ser esfolada por nosso Legislativo. Depois da gravidade do que mostraram três operações da Polícia Federal e Polícia Civil, os principais preocupados em dar o máximo de transparência e moralidade ao uso dessas emendas deveriam ser os próprios deputados, para deixar claro ao Tocantins que têm responsabilidade na utilização desses recursos e que a prioridade o interesse público. Hoje, como esse tema é tratado de forma totalmente obscura, não é a impressão que deixam.
Saudações democráticas,
CT