Caros eleitores e eleitoras lascados,
A Câmara acaba de aprovar o projeto de lei complementar que aumenta de 513 para 531 o número de deputados, alegando que a “auto-bondade” se deveu ao crescimento populacional. Os Estados não aumentaram de tamanho e não há novos municípios, apenas mais moradores, nada que sufoque “Suas Excelências” com mais trabalho. A vida deles, por isso, não mudou em nada, continua linda e maravilhosa. Contudo, defendem que isso justifica o gasto extraordinário de milhões e milhões de reais que vocês — melhor, nós todos — teremos que desembolsar para bancar a festança. Dois doutores em economia, Mariana Piaia Abreu e João Pedro Bastos, se debruçaram sobre o tema e publicaram um artigo no site Poder360 no dia 1º de fevereiro [clique aqui para ler].
Senhores e senhoras encalacrados com essa Câmara, os dois estudiosos se basearam numa elevação menor, de 513 para 527 novos deputados, e concluíram que essa brincadeira com o nosso bolso representaria um custo adicional de R$ 46,2 milhões por ano. Ou seja, no mandato, que é de quatro prazerosos (para eles) anos, teríamos que lhes dar R$ 184,8 milhões a mais. Mas não será isso, a “auto-bondade” custará ainda mais, porque a Casa extrapolou a expectativa e criou novas 18 cadeiras, elevando o número de seus membros para 531.
Interessante, senhoras e senhores, é que vemos essa gente se revezar na tribuna para cobrar responsabilidade fiscal do governo. O que eles querem, vejam, é que o Palácio do Planalto combata o déficit fiscal cortando gastos com programas sociais que garantem um mínimo de dignidade à enorme parcela da população largada à sorte por uma exploração cruel e secular praticada pela elite brasileira, da qual a maior parte dos nossos parlamentares é legítima representante. Querem uma prova? A rejeição da proposta de tributar os multimilionários.
Assim, meus caros e minhas caras, quando é para favorecer os ricos e a si mesmos, são mãos abertas. Olhem este caso do aumento de cadeiras para os que vivem numa mamata sem equivalente em democracias ocidentais, da blindagem das emendas PIX (dinheiro nosso que tratam como se fosse pessoal) e para garantir uma vida cada vez melhor e. mais fácil para milionários financiadores de sua campanha — ou vocês, bobinhos e bobinhas, acreditam mesmo que só buscam voto com o fundo eleitoral?
Volto a insistir: o brasileiro tem que parar de tratar políticos como herdeiros da monarquia. Como se fossem condes, marqueses, duques e quetais. Precisamos dar a eles o devido tratamento, sempre respeitoso, como são, na verdade, servidores públicos. Volto a recomendar, com toda insistência, o livro “Um país sem excelências e sem mordomias”, da brasileira Cláudia Wallin, sobre como a Suécia enxerga e trata seus representantes, do primeiro-ministro aos deputados. Eles não contam com gabinetes enormes, formado por incontáveis assessores, nem com auxílio disso e daquilo, nem com carro oficial, nem com mansões ou confortabilíssimos apartamentos funcionais.
Esse abuso que a Câmara dos Deputados acaba de cometer contra a população brasileira, senhoras e senhores, é fruto desse tratamento de “Excelência” que lhes damos, num servilismo que os anima a lidar com a coisa pública como se privada fosse.
Nossa esperança é que o Senado tenha a grandeza de barrar mais essa atrocidade contra uma sociedade refém de seus políticos, que sequestraram a democracia, a República e o orçamento.
Que assim seja.
Saudações democráticas,
CT