Caro deputado Ricardo Ayres,
Gostaria de cumprimentá-lo pelo seu voto favorável à criação do Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF), mecanismo já previsto pela Constituição de 1988, mas nunca regulamentado. Infelizmente, não foi o suficiente para a aprovação. A elite brasileira agiu e derrubou a proposta da Reforma Tributária, garantindo que os multimilionários continuem vivendo sob a complacência da injustiça secular pela qual se sustenta desde o Brasil Colônia. Seria uma pequena taxação de 0,5% para fortunas entre R$ 10 milhões e R$ 40 milhões, de 1% para quem tem entre R$ 40 milhões e R$ 80 milhões, e 1,5% para acima de R$ 80 milhões, gerando um incremento de R$ 70 bilhões para as contas públicas do País. Um imenso recurso que poderia ser utilizado no combate das nossas abismais desigualdades.
Sabe, Ricardo, tenho lido bastante os livros do professor Jessé de Souza, hoje um dos maiores sociólogos do Brasil e do mundo, e concordo plenamente quando ele diz que a escravidão não acabou, apenas tomou novos contornos. O ser humano escravizado não está mais concentrado na plantação de cana-de-açúcar, nem na mineração do ouro, mas pilotando perigosamente sua moto ou dirigindo seu carro por 14 ou 16 horas por dia para ganhar a vida a serviço dos aplicativos. Está na falta de perspectiva de uma favela, onde o tráfico recruta adolescentes que não conseguem vislumbrar um futuro digno; e ainda nos mais de 8 milhões de brasileiros que vivem na extrema pobreza, com menos de R$ 209 mensais per capita.
Caro deputado, lamentável que nossa elite política seja insensível à penúria a que estão submetidos milhões de irmãos brasileiros e ainda à dura vida de outros muitos mais milhões para não caírem nesse poço de absoluta falta de horizonte de prosperidade. Na verdade, é mais do que insensibilidade: a maior parte de nossos políticos vampiriza a miséria, pois é ela que os sustenta. Buscam votos dos desvalidos e colocam seus mandatos a serviço das grandes fortunas. Assim, não se interessam em ver uma população bem alimentada, estudada e consciente. Seria o fim da carreira deles. Melhor tê-la sob as rédeas dos coronéis do Brasil profundo, na dependência do favor para a sobrevivência em troca do voto, tratado, dessa forma, feito gado, como em grande parte dos pobres municípios tocantinenses. A votação do Imposto sobre Grandes Fortunas, nesse sentido, Ricardo, é reveladora do compadrio daqueles que o professor Jessé de Souza chama com propriedade de elite do atraso.
Um dia teremos um país realmente justo, em que ninguém vai passar fome, e político para ter mandato terá que, efetivamente, se colocar como servidor público à disposição de seu povo. Não se portar como nobres herdeiros monárquicos de sangue azul, vivendo da exploração da miséria e dando seus préstimos a multimilionários que sugam a sociedade sem sequer pagar impostos para retribui-la.
Mais uma vez, meus parabéns por sua postura humanista nesse caso.
Saudações,
CT