Para entender o que ocorreu nessa quarta-feira, 31, vamos rememorar os fatos em ordem cronológica:
1º ato
A presidente da Assembleia, deputada Luana Ribeiro (PSDB), anunciou na sessão vespertina de terça-feira, 30, que a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) do subteto do funcionalismo estadual entraria na pauta da manhã do dia seguinte.
Ainda no início da noite de terça, o autor da PEC, deputado Nilton Franco (MDB), apresentou um requerimento à presidente para que a matéria fosse retirada de pauta porque não poderia comparecer à sessão, já que estava acompanhando a esposa, que faria um procedimento cirúrgico em Goiânia.
[bs-quote quote=”Há muitos anos que um governador não conseguia um grupo tão amplo de deputados. Resultado da votação expressiva de Carlesse nas duas eleições de 2018, mas que não é definitiva. No meio político, a avaliação é de que esta base vai se consolidar na eleição da Mesa Diretora. A configuração da disputa vai deixar claro quem é governo e quem não é” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2018/02/CTAdemir60.jpg”][/bs-quote]
2º ato
Por volta das 10 horas dessa quarta, a coluna fez contato com a assessoria da presidente questionando sobre a decisão dela quanto ao requerimento. A informação foi de que Luana retirou a PEC da pauta e que a matéria só seria votada semana que vem.
3º ato
Quase todos os deputados foram para o regabofe oferecido no Palácio Araguaia pelo governador Mauro Carlesse (PHS).
4º ato
Ao sair do Palácio, alimentada física e mentalmente, a presidente da AL anunciou que a PEC do subteto entraria em votação já naquela tarde.
O que ocorreu com Luana entre a decisão que tomou pela manhã de retirar a PEC da pauta e o início da tarde, em que a colocou em votação?
Hipótese 1
Animada pela conversa amistosa do regabofe palaciano, a deputada esqueceu que já tinha retirado a matéria de pauta e a recolocou.
Hipótese 2
Alguém, com muito poder de influenciá-la, pediu para que ela colocasse a matéria em votação imediatamente.
Tem gente que acha que somos desses patetas que acrescentam Lula ao próprio nome e pede que acreditemos na primeira hipótese. É claro que algo ocorreu naquele almoço que levou a presidente da AL a mudar de ideia e a colocar a matéria em votação ainda na tarde dessa quarta depois de ter decidido, pela manhã, deixar a discussão para semana que vem em respeito ao autor da PEC, Nilton Franco, que estava ausente. Quem conhece bem Luana sabe que ela jamais atropelaria o colega por mero capricho pessoal.
O encadeamento desses fatos, por si só, seria o suficiente para provar que o CT não mentiu, como covardemente foi acusado justamente por um “Pateta Lula”, que, ao contrário da valentia que arrotou em plenário, votou o tempo todo com os governos Siqueira Campos (DEM) e Marcelo Miranda (MDB), e só deixou de acompanhá-los a partir do momento em que essas duas gestões entraram em desgraça. Com o governo Carlesse não será diferente, como deixou evidente nessa quarta, ao votar com o Palácio na PEC do subteto.
Porém, temos mais elementos de que o pedido do governador ocorreu. Logo após o almoço, a coluna recebeu a ligação de um deputado ansioso, que corria para o plenário. Por que? “O governador pediu para que votássemos a PEC hoje [quarta] e a derrubássemos”, justificou. Conversamos com outros dois parlamentares, que confirmaram a história, com um atenuante. Segundo eles, é verdade que Carlesse pediu a votação, mas não, diretamente, que ela fosse derrubada. O governador direcionou o rumo dos votos ao falar sobre a gravidade da situação do Estado e o quanto um aumento de despesas de pessoal dessa magnitude neste momento seria prejudicial.
Além disso, dois discursos em plenário — de Ricardo Ayres (PSB) e Stálin Bucar (PR) — deixaram claro o pedido da votação ainda nessa quarta e a fala sobre a crise das contas.
Por fim, reproduzo a seguir o comunicado distribuído por WhatsApp pelo presidente do Sindicato dos Auditores de Rendas do Estado (Sindare), Jorge Couto, a seus filiados, assim que soube por Nilton Franco que a matéria seria votada ainda na tarde dessa quarta:
“URGENTE: O deputado Nilton Franco acaba de nos informar que a Deputada Luana Ribeiro indeferiu o seu pedido para retirada de pauta da PEC 02/2017, e assim, a matéria irá à votação em plenário na tarde desta quarta-feira, 31. Pedimos aos filiados do Sindare, residentes em Palmas, que se dirijam imediatamente à Assembleia Legislativa do Tocantins, a fim de acompanharmos tal deliberação.
O deputado Nilton Franco se encontra em Goiânia e sequer acompanhará a votação. Houve uma séria discussão por telefone entre o deputado Nilton e os deputados Olynto Neto e Luana Ribeiro, estes últimos favoráveis à vontade do governo de pautar logo a PEC e ‘derrubá-la’. Segundo o deputado Nilton Franco, esse indeferimento da deputada Luana Ribeiro afronta o regimento da casa de leis que prevê o direito do autor da PEC de pedir a sua retirada de pauta”.
No final da noite, a coluna perguntou a Couto se ele tinha dúvida do pedido do Palácio aos deputados: “Não temos dúvida. Foi o governador, sim, que agiu em tal sentido”, respondeu.
O episódio foi a primeira grande demonstração de força do governador Mauro Carlesse junto à Assembleia. Desde sua posse, em abril, ainda não tinha havido nenhum embate que colocasse essa relação em teste. Ele passou com louvor.
Além de ter antecipado uma votação que só ocorreria semana que vem, Carlesse conseguiu 13 dos 17 votos em plenário. Dois foram contrários — estranha e surpreendentemente de quem chegou a dizer à coluna que era contra a matéria, Eduardo Siqueira Campos (DEM) e Paulo Mourão (PT) — e dois não votaram — Rocha Miranda (PHS) e Jorge Frederico (MDB). Dos sete ausentes, apenas Nilton Franco não votaria com o governo por ser auditor e autor da PEC. Pode-se colocar que a base do Palácio, considerando esse primeiro teste, pode chegar neste momento a quase 20 deputados.
Há muitos anos que um governador não conseguia um grupo tão amplo de parlamentares. Resultado da votação expressiva de Carlesse nas duas eleições de 2018, mas não é uma situação definitiva. No meio político, a avaliação é de que esta base vai se consolidar na eleição da Mesa Diretora em fevereiro. A configuração da disputa pela presidência do Legislativo vai deixar claro quem é governo e quem não é.
De toda forma, ainda que consiga uma base significativa, o Palácio terá dois desafios enormes para mantê-la. O primeiro é continuar com a popularidade elevada, o que não é fácil, em tempos em que terá que tomar medidas drásticas para equilibrar as contas do Estado. Até por isso articuladores palacianos explicaram a pressa de Carlesse para votar uma matéria polêmica como a PEC do subteto. Com as insatisfações da eleição da mesa diretora e os desgastes naturais das medidas de ajuste, o Palácio pode não ter em fevereiro a mesma força de agora.
Além disso, outro desafio para a manutenção de uma base ampla é atender as demandas dos deputados: pagamento de emendas, empregos a aliados, entre outras. Se o governador conseguir segurar o alto índice de popularidade, o poder de barganha dos deputados é menor. Contudo, se Carlesse se desgastar mais que o esperado, a pressão dos parlamentares tende a crescer.
Que a relação possa ter um equilíbrio. Um Palácio com capacidade de atropelar tudo e todos é tão ruim quanto um governo altamente desgastado e, por isso, refém do Legislativo.
CT, Palmas, 1º de novembro de 2018.