A presidente da Agência Tocantinense de Regulação (ATR), Juliana Matos, garante que não haverá a mínima possibilidade de a BRK Ambiental incluir no ciclo da tarifa da água as chamadas “ações complementares”, que são os investimentos sem qualquer relação com o saneamento que os vereadores dizem que a empresa fez em Palmas. Conforme os parlamentares, é um montante enorme de recursos aplicados pela BRK em obras das mais diversas, como, de acordo com os vereadores, o Parque dos Povos Indígenas, manutenção e reforma do Estádio Nilton Santos, toda a lama asfáltica utilizada para o recapeamento das principais avenidas do plano diretor, entre outras.
[bs-quote quote=”Considerando que a racionalidade deve imperar nas operações comerciais, podemos aventar a real possibilidade de que a empresa aceitou o jogo político com a condição de que poderia recuperar esses recursos via tarifa, e só por isso aceitou bancar obras que em nada diziam respeito à sua concessão” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2018/02/CTAdemir60.jpg”][/bs-quote]
No total, o vereador Milton Neris (PP) estima R$ 57 milhões, dos quais seriam R$ 40 milhões daquela operação de R$ 240 milhões para universalização do tratamento de esgoto da Capital; e depois mais R$ 15 milhões com o aditivo 3 e outros R$ 2 milhões para pagamento da espécie de jetom dos secretários municipais da gestão Carlos Amastha (PSB) que participavam do comitê gestor que decidia onde a BRK deveria aplicar esses recursos. Cada participante dessa festa, conforme os vereadores, abocanhava inicialmente R$ 2 mil por reunião, valor que teria chegado a R$ 2,4 mil. A prefeita Cinthia Ribeiro (PSDB) foi a mosca da sopa e acabou com a brincadeira, ao extinguir o malfadado comitê.
Antes de tudo, se esses investimentos complementares forem mera obra de ficção política, tudo fica fácil. A BRK emite uma nota pública negando sua existência e o raciocínio a seguir deve ser completamente ignorado.
Agora, se a informação dos vereadores for verdadeira, é importante perguntar: uma empresa faz filantropia dessa forma, investindo em obras que são obrigações do município e não dela? R$ 57 milhões, se confirmados, são uma soma absurda de recursos para serem jogados a fundo perdido por quem visa lucro em suas operações. Se, como diz Neris, dos R$ 240 milhões para a universalização do tratamento de esgoto, a BRK ou Odebrecht Ambiental, que era quem detinha o contrato na época, deu R$ 40 milhões para obras da gestão Amastha, isso significa que abriu mão de 16,7% dos recursos que deveriam ir exclusivamente para o saneamento. Só perguntando, não é uma afirmação: essa obra estava superfaturada? Sim, para uma empresa doar um volume desses, é uma possibilidade. Como a Caixa, muito rigorosa nos critérios técnicos, foi a operadora do financiamento e dando crédito à boa-fé da BRK/Odebrecht Ambiental, então, podemos excluir essa hipótese. Assim vem outra questão: a empresa tirou essa dinheirama de seu lucro de todas as operações que realiza para satisfazer o ex-prefeito?
Mas, considerando que a racionalidade deve imperar nas operações comerciais, podemos aventar a real possibilidade de que a empresa aceitou o jogo político com a condição de que poderia recuperar esses recursos via tarifa, e só por isso bancou obras que em nada diziam respeito à sua concessão.
Agora, se a ATR está dizendo que esses investimentos não entram na tarifa, em nenhuma hipótese, como a BRK vai fazer? Daí vem outras possibilidades:
1) Vai tentar convencer a ATR de que tem amparo legal para cobrar do contribuinte a “bondade” que fez para Amastha? — mas, com a Câmara suspendendo os aditivos ao contrato, essa base foi abalada.
2) Então, vem uma segunda possibilidade: vai pulverizar esses R$ 57 milhões em ações compatíveis com as exigências da ATR para que sejam incluídos na tarifa sem que ninguém perceba?
3) Como se deve supor que a agência de regulação vai estar bem atenta, sobra uma última hipótese: a americana Brookfield Business Partners LP, que comprou a concessão por nada menos do que US$ 908 milhões, ficou com o mico da Odebrecht Ambiental, empresa expert na Lei de Gerson, como a Operação Lava Jato tem mostrado?
Sim, porque ou esses investimentos complementares de R$ 57 milhões nunca existiram (mas o silêncio da BRK fala alto sobre o fato de que realmente podem ter ocorrido), ou a ATR vai ceder em algum momento para a inclusão desses valores na tarifa, o que a presidente Juliana Matos nega de pé juntos; ou a empresa americana foi passada para trás pela brasileira que se tornou símbolo de corrupção.
Esse é o resumo da ópera.
CT, Palmas, 15 de maio de 2019.