Foi sensata a decisão do juiz Rodrigo Perez Araújo que concedeu mais seis meses para a Câmara de Palmas promover a redução do número totalmente absurdo de comissionados que emprega. Da primorosa sentença do magistrado, extraio a essência do que revela ser o fundamento da contratação excessiva de comissionados não só no Legislativo palmense, mas em grande parte dos parlamentos brasileiros:
“As circunstâncias narradas nos autos, diga-se, revelam a possível utilização da criação de cargos de provimento em comissão como moeda de troca de apoio político, com intuito meramente eleitoral, sem se atentar, contudo, ao efetivo atendimento do interesse público”.
[bs-quote quote=”Os parlamentares gostam de encher a folha de pagamento das Casas com comissionados por dois motivos: para ter cabo eleitoral pago pelo contribuinte e aumentar a própria receita, com a apropriação ilegal e imoral dos salários de esse pessoal” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2018/02/CTAdemir60.jpg”][/bs-quote]
Lapidar! Dr. Rodrigo acertou na mosca. Trocando em miúdos, é usar dinheiro do contribuinte para bancar cabos eleitorais.
É claro que as relações — todas elas — que se dão no âmbito legislativo são políticas. No entanto, isso é normal até o ponto em que a conta é passada para o cidadão. Aí não dá para aceitar. Discussões em plenários, discursos inflamados, e até mesmo os fora de tom; troca de apoios por cargos na Mesa Diretora ou nas comissões permanentes, tudo isso faz parte do jogo parlamentar. Agora a contratação de pessoal que extrapola todos os limites da lei, aí não. É colocar o contribuinte para pagar o salário para que cabos eleitorais peçam votos a seus padrinhos.
Nesse quesito, a Câmara de Capital foi muito, mas muito mesmo, além do tolerável. A ação Civil Pública do Ministério Público constatou 328 comissionados, dos quais 192 são de assessores parlamentares. No entanto, são míseros 49 servidores efetivos.
Contudo, em 2006, esses números, conforme o Relatório de Inspeção elaborado pela Divisão de Fiscalização de Atos de Pessoa do Tribunal de Contas do Estado constatou, a Câmara chegou a ter 541 servidores, dos quais 454 comissionados, 37 contratados temporariamente, 50 efetivos e outros 19, que, apesar de serem efetivos, ocupavam cargos comissionados. Vejam a gravidade disso: 82% de cargos comissionados para apenas 18% de cargos efetivos.
Em abril do ano passado, um liminar da Justiça determinou que a Assembleia exonerasse 1,3 mil comissionados. O Legislativo tinha 1.635 não concursados e apenas 257 efetivos, segundo levantamento do MPE. Em agosto, o Judiciário deu um ano para a Casa exonerar o excesso de comissionados. Sob atual gestão, o Legislativo conseguiu se enquadrar ao teto fixado pela Lei de Responsabilidade. No primeiro quadrimestre do ano passado gastava 1,80% da Receita Corrente Líquida com pessoal, quando o correto é 1,77%, índice a Casa que alcançou no segundo quadrimestre de 2018.
É preciso profissionalizar o quadro de pessoal dos Parlamentos de todo o País. Não adianta o esforço dos Executivos para ajustarem suas contas, se os Legislativos continuarem empregando cabos eleitorais de seus integrantes com um sacrifício absurdo da sociedade.
O episódio do senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) é a ponta do iceberg de outra prática nefasta e disseminada pelos Parlamentos: a receita extra que os parlamentares produzem com os salários de seus assessores. Estão colocando Flávio como “boi de piranha” por ser filho do presidente da República, e a mídia não age errado. Venderam “santidade” e agora precisam entregá-la ao País. No entanto, esse modus operandi é epidêmico nos Legislativos.
O que significa que os parlamentares gostam de encher a folha de pagamento das Casas com comissionados por dois motivos: para ter cabo eleitoral pago pelo contribuinte e aumentar a própria receita, com a apropriação ilegal, imoral e indecente de parte dos salários desse pessoal.
A coluna já afirmou e repete: o Legislativo é uma instituição falida, a de mais baixa credibilidade diante da sociedade. Por isso, defendo que esse sistema de freios e contra-pesos da democracia precisa ser repensado. Os Parlamentos não cumprem a missão de representar os diversos segmentos da sociedade. Seus representantes se portam como o mandato fosse deles e não uma procuração do eleitorado. São, no geral, um saco sem fundos, em termos recursos públicos, e origem da maior parte da corrupção existente no País. Constitucionalmente, produzem, na média, leis ridículas e não fiscalizam o Executivo, a não ser quando os interesses não são atendidos.
Para reconquistar a credibilidade, os Legislativos precisam se repensar, se reconstruir. Um primeiro passo é justamente ceder e profissionalizar sua área de recursos humanos, com concursos, deixando os comissionados para os cargos meramente diretivos.
CT, Palmas, 23 de janeiro de 2019.