O Brasil passou por um tsunami no dia 7. A grande onda varreu políticos tradicionais e não deixou que chegassem ao poder petistas ilustres tidos como eleitos. Essas águas arrasadoras lamberam o Tocantins, onde os dois senadores que precisavam renovar o mandato foram barrados pelo eleitor — Vicentinho Alves (PR) e Ataídes Oliveira (PSDB). Contudo, a renovação ainda foi baixíssima. Manteve no governo uma figura nova na política tocantinense, Mauro Carlesse (PHS), mas um representante autêntico do establishment, bem como todos os deputados estaduais que buscaram a reeleição e quase todos que tentaram retornar à Câmara Federal, com exceção de Josi Nunes (Pros) e Lázaro Botelho (PP).
[bs-quote quote=”Apesar do erro, é a primeira vez na história das eleições do Tocantins que um outsider incomoda o campo tradicional. O imenso assédio a Márlon depois da suplementar é uma prova disso” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2018/02/CTAdemir60.jpg”][/bs-quote]
Contudo, algo novo passou por perto das eleições tocantinas e apontou para uma reviravolta num horizonte não muito distante. A candidatura de Carlos Amastha (PSB) levantou o debate sobre a necessidade de mudança na política estadual, mas a representação dessa ruptura com a hegemonia dos tradicionais não foi a candidatura do ex-prefeito de Palmas, mas, sim, a do ex-juiz e advogado Márlon Reis (Rede).
Um dos criadores da Lei da Ficha Limpa, o ex-candidato da Rede fez um primeiro turno à margem da política convencional. Sem aliados poderosos e sem recursos, restou-lhe as redes sociais para levar sua mensagem a todo o Estado. A ideia de comícios virtuais, através de lives no Facebook, foi simplesmente incrível, com Márlon chegando a milhares de pessoas sem nenhuma mega estrutura de palco e som. A forma purista como se conduziu no primeiro turno da suplementar conquistou o apoio até de membros da sociedade que nunca tinham se exposto eleitoralmente, mas acreditavam na nova mensagem e no seu mensageiro.
Com esse formato, Márlon foi conquistando pessoas que não viam Amastha como “novo” e muito menos estavam dispostas a dar seu voto ao establishment. Infelizmente, o descrédito em que a política se encontra não permitiu que o ex-juiz conquistasse a volumosa massa de eleitores que prefeririam se abster, votar branco ou nulo. Mesmo assim, quase 57 mil pessoas deram seu voto de confiança ao candidato da Rede, o que o tornou o grande fenômeno num Estado em que os considerados “nanicos” dificilmente ultrapassam a casa do 1% dos votos válidos. Márlon chegou a quase 10% — 9,91% —, com colocações surpreendentes nos principais colégios. Foi o terceiro em Palmas, Araguaína, Gurupi e Paraíso.
No entanto, para as eleições ordinárias, faltou tranquilidade ao ex-juiz e seus principais apoiadores ao escolher como perderia para o Palácio. Como a coluna sempre pregou, a estrutura política do Estado ainda não permite que um outsider vença. Reforçando: ainda. Assim, restava a Márlon definir como gostaria de perder a eleição. Uma derrota com sabor de vitória, como na suplementar; ou uma derrota completa.
Para a primeira possibilidade era só repetir a receita anterior: sem grandes aliados, sem recursos, mantendo o mesmo discurso e muita rede social. Diante da escolha de Amastha por caminhar com alguns daqueles que sempre defenestrou, não havia outra possibilidade. Márlon, natural e legitimamente, representaria a verdadeira terceira via e poderia ultrapassar facilmente os 57 mil votos do primeiro turno da suplementar. Até porque não havia mais outros candidatos competitivos — Vicentinho Alves e Kátia Abreu (PDT).
Entretanto, o ex-juiz fez a segunda opção: buscou musculatura acreditando no impossível, que venceria a máquina do Estado. Com aliados do próprio campo tradicional, que apenas queriam uma vaga para concorrer — nunca acreditaram no projeto do candidato da Rede —, Márlon recebeu de volta apenas o desgaste e um tempo de TV absurdo, já que não tinha recursos para preenchê-lo, o que tornava esse espaço um latifúndio improdutivo.
Como esperado, os líderes de seus candidatos no campo tradicional pediram voto para Carlesse. Nada mais óbvio de que era isso que ocorreria. O resultado é que, numa disputa com menos candidatos competitivos do que no primeiro turno da suplementar, o ex-juiz fez cerca de 10 mil votos a menos (47.046) e 3,3 pontos percentuais abaixo de junho (6,68% dos votos válidos).
Apesar do erro, é a primeira vez na história das eleições do Tocantins que um outsider incomoda o campo tradicional. O imenso assédio a Márlon depois da suplementar é uma prova disso. Amastha e o ex-juiz abriram um debate que não acabou com os resultados do dia 7. Muito pelo contrário. Na esteira do tsunami que varreu o Brasil e continuará a limpeza com a ressaca dos próximos anos, o Tocantins também sentiu os seus reflexos, ainda que de leve. E virá uma segunda onda.
A nova política, representada por Márlon, precisa fazer uma profunda reflexão dos erros deste ano para surfar nessa onda e não ser engolido novamente por ela. À “velha política”, se quiser sobreviver também terá que se reinventar e se adequar aos novos tempos de um país que está querendo renascer.
CT, Palmas, 15 de outubro de 2018.