Os antigos já diziam que “em casa em que falta pão todo mundo briga e ninguém tem razão”. Mas com essa ação junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) para arrancar do Estado R$ 119.796.263,98 de restos a pagar do duodécimo, o Tribunal de Justiça do Tocantins se apegou a outro dito popular: “Se a farinha é pouca, meu pirão primeiro”.
[bs-quote quote=”Se conseguirem a liminar de Fux, suas Excelências desfrutarão de um delicioso peru de Natal, mas o gosto dele será amargo no ano novo, quando se depararem com a realidade do Estado, que terá virado terra arrasada” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2018/02/CTAdemir60.jpg”][/bs-quote]
A coluna tem dito já faz dois anos que um dos maiores gargalos desta profunda crise fiscal do Estado é a falta de contribuição dos Poderes para a sua solução. Isso porque a turbulência que o Tocantins atravessa é responsabilidade de governo, sociedade e de todos os setores públicos que dependem da arrecadação e da boa gestão para se manter. Assim, os Poderes não podem continuar no seu rame-rame como se não tivessem nada a ver com isso. Atualmente, suas Excelências de TJTO, TCE, MPE, Defensoria e Assembleia são pedaços da Suíça dentro do Tocantins.
Só nos últimos tempos, quando o Executivo já mostrava sinais de que não dá mais conta de carregá-los nas costas, que começaram a se preocupar. E, claro, não com a crise do Estado, mas com as próprias dificuldades, uma vez que o Palácio Araguaia não consegue mais transferir na íntegra o duodécimo fantasioso a que eles têm direito, e as contas passaram a se acumular.
É totalmente absurdo o fato de esses Poderes receberem sobre o orçado e não sobre o arrecadado. Veja só: as famílias tocantinenses, as empresas e o governo do Estado estimam que receberão X valor no ano. Contudo, vão ajustando seus gastos à realidade. Se a família esperava uma renda de R$ 20 mil e receber R$ 12 mil, terá que se virar, cortar despesas para viver de acordo com essa receita. As empresas funcionam assim e o Executivo também. Mas os Poderes, não. Se foram orçados R$ 44 milhões, mas o Estado teve uma frustração enorme de receita, pouco importa. O governo que dê seus pulos, absorva essa frustração, mas que repasse o valor integral previsto num orçamento fantasioso.
Ao longo do tempo esses Poderes incharam absurdamente suas folhas de pagamento, com salários totalmente incondizentes com a realidade da arrecadação do Estado, benesses legais mas imorais, como o auxílio-moradia, e agora o Tocantins não dá mais conta de bancá-los. Se tornaram insustentáveis. Ou todos colocam a cabeça no lugar, cedem e continuam vivendo, ou continuarão nessa tensão por recursos todos os meses. O elástico esticou o que dava. Se não for distensionado, vai arrebentar. Isso é mais que matemático. É óbvio.
O Palácio Araguaia está preparando um orçamento mais realista para 2019, o que significará pelo menos um duodécimo um pouquinho menos “fora da casinha”. Tem mesmo que reduzir essas previsões de forma a dar um pequeno choque de realidade às suas Excelências. Até porque elas, naturalmente, se tornarão ainda mais caras ano que vem.
O presidente Michel Temer, candidatíssimo a presidiário a partir de 2019, deve sancionar até quarta-feira, 28, conforme anuncia O Globo, o reajuste de 16,38% para os ministros do STF. Com processos gravíssimos nas costas, o presidente, como a coluna já tinha avisado, não tem nenhuma moral para peitar esse abuso do Judiciário.
Com isso, haverá o efeito cascata. Todos os que vivem às custas do contribuinte — Poderes e Parlamentos — vão se lambuzar nessa festança do dinheiro público. No Estado, o Jornal do Tocantins fez um levantamento que mostra que o impacto será de R$ 24 milhões anuais, com o repasse do reajuste para TJTO, MPE, TCE e Defensoria.
Porém, se o ministro do STF Luiz Fux conceder a liminar ao TJTO e mandar o Estado pagar os R$ 119.796.263,98 de restos do duodécimo, a alegria vai durar muito pouco. Se o Judiciário meter o pé na porta do erário tocantinense, o Estado vai entrar para o time do Rio de Janeiro, não terá condições de pagar salários, 13º e custeio da máquina. Serviços já precários, como a saúde, vão piorar ainda mais. Sem dinheiro público circulando, toda a economia será impactada. Ou seja, essa ação ordinária do TJTO jogará o Tocantins no caos.
Com isso, se conseguirem a liminar de Fux, suas Excelências desfrutarão de um delicioso peru de Natal, mas o gosto dele será amargo no ano novo, quando se depararem com a realidade do Estado, que terá virado terra arrasada. A situação que já é crítica agora, se tornará absolutamente insustentável. Olhem a situação do Rio e vejam se é algo a se desejar.
Neste momento de crise, os Poderes precisam aprender a compartilhar da dificuldade para reduzir os solavancos provocados pelas intempéries. Judicialmente só conseguirão aprofundar o buraco em que o Estado se encontra.
É preciso ter juízo e espírito público elevado.
CT, Palmas, 26 de novembro de 2018.