A instauração da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) proposta pelo vereador Filipe Fernandes (DC) e outros 11 parlamentares para apurar dois aditivos ao contrato da BRK Ambiental se justifica pelo inaceitável silêncio da empresa sobre as graves denúncias que o Legislativo da Capital tem trazido a público faz alguns meses. Não se trata de prejulgamento. O que a sociedade quer são respostas, o que até agora não vem sendo dadas a contento pela BRK. Se tudo estiver dentro da legalidade, então, que ela mostre as provas nesse sentido e as suspeitas se esvairão. Agora se calar ou dar meias respostas, como permissionária de um serviço público, diante das altas absurdas das contas de água nos últimos anos, é que não dá para admitir.
O problema originário apontado pelos vereadores foram as duas alterações ao contrato feitas entre município e BRK no governo Carlos Amastha (PSB) sem a devida autorização legislativa. Em sua participação no quadro “Entrevista a Distância” do CT, o vereador Milton Neris (PP), que se tornou um profundo estudioso deste caso, disse que as mudanças contratuais contribuíram para uma elevação de 52% da tarifa de água desde 2014.
[bs-quote quote=”Na era da marketagem que imperava, o que se vendia era que esses investimentos saíram por conta da empresa, numa pressão meramente altruísta da administração municipal de então em troca do contrato de universalização do saneamento de R$ 240 milhões” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2018/02/CTAdemir60.jpg”][/bs-quote]
Segundo ele, foram essas modificações que permitiram que a BRK incluísse na planilha de custo até 8% dos investimentos que a concessionária fez nos últimos anos, a título de “ações complementares”. Foram obras diversas e sem qualquer ligação com o saneamento, a pedido da gestão passada, como praças, parques, lama asfáltica e — pasmem! — até reforma e manutenção do Estádio Nilton Santos.
Na era da marketagem que imperava, o que se vendia era que esses investimentos saíram por conta da empresa, numa pressão meramente altruísta da administração municipal de então em troca do contrato de universalização do saneamento de R$ 240 milhões. No entanto, conforme Neris, esses investimentos da BRK, chegam a R$ 57 milhões e podem, conforme um dos aditivos, ser cobrados da conta de água dos consumidores palmenses.
Veja: esses recursos, conforme o vereador, serão empurrados aos consumidores de Palmas, que já pagam impostos altíssimos para que essas mesmas obras sejam realizadas pelo município. Assim, se confirmada esta denúncia, estamos sendo bitributados.
Agora, o problema não atinge apenas o cidadão palmense. Aí é outro problema que precisa ser apurado não só pela Câmara de Palmas. Conforme Neris, existe uma única planilha de custos da tarifa de água para 47 municípios. O vereador acusa a empresa de colocar o custo dessas obras da Capital para que todos os moradores dos 47 municípios paguem. Araguaína e Gurupi viram a festa, gostaram e também quiseram participar, afirmou Neris. Assim, as quase 50 cidades estão dividindo a mesma conta de obras sem qualquer relação com o saneamento. Isso é verdade?
Outro fato que merece uma profunda apuração: um comitê de gestão criado no governo passado da Capital, composto por secretários do município — portanto, já devidamente bem remunerados para defender os interesses de Palmas —, que receberiam inicialmente R$ 2 mil e depois R$ 2,4 mil por reunião para decidir as obras que a BRK bancaria para o município.
O vereador Milton Neris calcula que esse brincadeira resultou em outros R$ 2 milhões para também serem cobrados dos consumidores de água. De novo: isso é verdade? Se confirmado, seriam dois custos para o contribuinte: das obras que eles definiam e da participação deles na reunião.
Na época da participação de Neris no “Entrevista a Distância” (vídeo ao final deste artigo), o CT pediu uma manifestação à BRK, detalhando as denúncias, mas recebeu apenas uma nota genérica, que a coluna reproduz a seguir:
“Nenhum custo decorrente de obras complementares e/ou do comitê gestor, citados na reportagem, fez parte da composição da tarifa praticada pela concessionária, logo não há que se falar em prejuízos para o Município de Palmas. Pelo contrário, a cidade é uma das únicas capitais universalizadas em saneamento no país, em atendimento de água e esgoto”.
É pouco. Precisa dar a resposta detalhada. É uma planilha só para 47 municípios? Esses 8% de investimentos da empresa em obras complementares são, então, doações dela para o município, num total de R$ 57 milhões para um contrato de universalização de saneamento de R$ 240 milhões, ou 23,8% do total? Esse comitê gestor recebia mesmo R$ 2,4 mil por reunião, cada um de seus membros? Se sim, a quem foi pago e quanto cada um recebeu? Esse custo também é doação da BRK a Palmas? Não entra na planilha de custo? Por que os aditivos não passaram pela apreciação da Câmara? Por que a conta de água subiu tanto nos últimos anos?
Como se vê, há muitas perguntas e quase nada de respostas. A BRK atua numa área essencial para o cidadão, que é o saneamento. Palmas está universalizando o setor, mas não é motivo para deixar milhões de reais dos contribuintes vazar pelos ralos da marketagem e das facilidades questionáveis.
É preciso total transparência e que a Câmara dê as devidas respostas aos cidadãos. Que não siga o caminho da Assembleia, onde, até uns poucos anos atrás, todo início de ano legislativo um deputado falava de investigar a Saneatins e depois não tocava mais no assunto até o início do outro ano legislativo.
Nossa expectativa é de que essa investigação agora seja levada com seriedade, responsabilidade e que as respostas venham à tona doa a quem doer. E, se houver irregularidades, que esses aditivos sejam imediatamente suspensos.
CT, Palmas, 15 de fevereiro de 2019.