O Tocantins passa por turbulências desde 2006 em consequência de abusos eleitorais. O resultado foram as duas cassações do ex-governador Marcelo Miranda (MDB). Por isso, suspeitas de irregularidades no processo eleitoral precisam mesmo ser denunciadas e devidamente apuradas. Contudo, as instituições devem ter o cuidado de não permitir que sejam instrumentalizadas de forma a se tornarem parte das disputas.
Se houver abusos no processo, os devidos procedimentos precisam mesmo ser instaurados e, infelizmente, poderemos ter nova cassação de um governador. Contudo, até lá, tem todo um percurso a ser feito: ouvir os lados envolvidos, as testemunhas, enfim, todo o rito até o julgamento. Não dá para Ministério Público Federal e Polícia Federal posarem de justiceiros, antecipando julgamentos, exercendo um papel que não lhes convém, o de cabos eleitorais.
Algo parecido foi feito nas eleições de 2010, entre Carlos Gaguim (DEM) e Siqueira Campos (DEM). Um triste espetáculo circense em que as instituições foram instrumentalizadas. Uns dois anos depois as acusações contra Gaguim foram arquivadas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
[bs-quote quote=”Essas operações devem mesmo ocorrer e as investigações precisam avançar para provar ou não abusos no uso da máquina pública. O Tocantins já passou por experiências doloridas demais, mas isso tem que ser feito com discrição para se evitar prejulgamentos e o desequilíbrio das disputas em curso” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2018/02/CTAdemir60.jpg”][/bs-quote]
Ao se colocar no papel de justiceiros, antecipando julgamento antes mesmo do transcorrer do devido processo legal, essas instituições, indiretamente, avalizam o outro lado da disputa, desequilibrando a eleição. Dessa forma, atua, sim, ainda que de forma inconsciente, como cabo eleitoral de um dos polos.
As pirotecnias dessas operações que o Brasil assiste desde 2014, para as quais a “convocação” de emissoras de TV para colher as imagens parece imprescindível, são um atentado aos direitos individuais. Assim, no rumo contrário da maré, a coluna avalia como um importante passo a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) ao proibir nessa quinta-feira, 14, as abusivas conduções coercitivas circenses. Ninguém defende que bandidos sejam tutelados e preservados, mas não se pode permitir que eventuais inocentes tenham as vidas destruídas pela sede de holofotes de setores do aparelho judiciário.
Essas operações devem mesmo ocorrer e as investigações precisam avançar para provar ou não abusos no uso da máquina pública. O Tocantins já passou por experiências doloridas demais, mas isso tem que ser feito com discrição para se evitar prejulgamentos e o desequilíbrio das disputas em curso. As instituições não devem ser parte de candidaturas.
Como repercussão, toda essa pirotecnia produziu as desinformações mais absurdas do mundo nessa agitada quinta-feira. Houve até a insanidade de se falar que já havia delação premiada em andamento e que a eleição suplementar do dia 24 estaria em risco. A coluna ouviu três advogados eleitorais e avaliação deles é de que é pouco provável que, ainda que tenham sido constatadas irregularidades, que esse processo esteja transitado em julgado antes de dezembro.
A eleição do dia 24 vai ocorrer normalmente, e a diplomação será no dia 9 de julho, sem a mínima chance disso ser mudado. Uma delação não se fecha no mesmo dia da operação em curso. Levam-se semanas e até meses de negociações. Fechada, tem que ser colhida e, depois, homologada. Estamos falando de alguns meses. Ainda assim, a delação só tem valor para a espetacularização da notícia. Juridicamente, é tão somente o início de todo um penoso processo de investigação para que se prove o que foi dito.
Com essa Ação de Investigação Judicial Eleitoral (Aije) não será diferente. Colhidos documentos, precisam ser analisados, depois os lados são ouvidos, testemunhas arroladas, fora as manobras protelatórias que podem arrastar o caso meses a fio. Até a cassação de Marcelo Miranda, por exemplo, foram mais de três anos.
Neste momento de turbulência é preciso o mínimo de racionalização para que a crise deste Estado tão maltratado não se aprofunde ainda mais. É lamentável que estejamos diante da possibilidade de passar por um novo processo de investigação que até pode lá na frente resultar numa terceira cassação de governador. E se tiver que ocorrer, que ocorra. Quem abusou que arque com as consequências.
Contudo, isso não impedirá que o Estado conclua esta eleição suplementar. A operação da PF dessa quinta-feira trará como único efeito prático imediato alimentar os debates eleitorais dos adversários de outubro, que já tem, portanto, suas emoções garantidas, caso o governador interino Mauro Carlesse (PHS) vença no dia 24.
Fora isso, a vida segue normalmente.
CT, Palmas, 15 de junho de 2018.