Tem um dito popular de que em briga de peixe grande, arraia-miúda cai fora, mas gostaria de meter o bedelho onde não fui chamado. O presidente da Assembleia, Mauro Carlesse (PHS), entra no jogo quando responde as provocações do ex-prefeito de Palmas Carlos Amastha (PSB), que tenta por todos os meios se manter na mídia, após a renúncia do dia 3. Como perdeu a agenda pública fora da prefeitura, Amastha parte para uma prática em que é mestre: usar as redes sociais para provocar desavenças e chamar a atenção.
Os demais caciques da política do Estado, como os senadores Vicentinho Alves (PR), Kátia Abreu (PDT) e o governador Marcelo Miranda (MDB), por exemplo, já entenderam isso há algum tempo e não dão mais corda. Tornaram-se sem graça. Por isso, Amastha virou seu teclado para um neófito do seleto grupo de grandes líderes tocantinenses, Mauro Carlesse. Caiu rapidinho.
No mérito da questão, quando o ex-prefeito de Palmas sugere que Carlesse não assuma o governo do Estado, caso confirmada a cassação de Marcelo e da vice-governadora Cláudia Lelis (PV), comete algumas incoerências ao falar de espírito público. Isto é, para Amastha, pimenta nos olhos de Carlesse é refresco.
[bs-quote quote=”Para ser coerente com o que pediu a Carlesse, portanto, Amastha tinha que desistir da eleição suplementar” style=”default” align=”left” color=”#ffffff” author_name=”Cleber Toledo” author_job=”É jornalista e editor do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2018/02/CTAdemir60.jpg”][/bs-quote]
Como “o novo” e “o bom combatente” da “moralidade” da política tocantinense, o ex-prefeito também deveria dar o exemplo e não disputar nem a eleição suplementar, nem a ordinária. Vou detalhar o raciocínio.
Primeiro devo dizer que não me agrada muito a configuração heterodoxa das bancadas que o grupo de Carlesse implantou na AL. Contudo, é preciso admitir que em sua gestão nem a Polícia Federal, nem a Polícia Civil foi ao Legislativo em grandes escândalos de corrupção. Há processos, denúncias, como em toda gestão, mas não houve, ainda, viaturas policiais na porta da Casa.
Carlesse tem razão quando diz que está cumprindo um papel constitucional ao assumir o governo do Tocantins, em caso de vacância. É direto seu e um dever imposto pelo cargo que ocupa. Como a legislação lhe permite ainda disputar a eleição suplementar e as eleições de outubro, então, não há problema. Quem abriria mão? Sua omissão neste momento poderia até interromper sua carreira política.
Aí começam as incoerências de Amastha. Porque quem vai tumultuar a eleição suplementar não será o futuro governador interino, mas o próprio ex-prefeito da Capital. Como a coluna já explicou, ele deve registrar sua candidatura sem condições de elegibilidade para este pleito suplementar. A Constituição Federal o impede de ser candidato já que não renunciou com seis meses de antecedência. Como a resolução do Tribunal Regional Eleitoral do Tocantins (TRE-TO) se omite neste ponto — nem poderia ser diferente porque não pode mudar a Constituição —, vale a Carta Magna e o ex-prefeito não pode disputar. Isso é claríssimo e foi um dos motivos, inclusive, que fez o prefeito de Araguaína, Ronaldo Dimas (PR), desistir de concorrer.
Contudo, Amastha insistirá, como tem dito, em se candidatar, aproveitando as brechas das nossas esburacadas leis, com recurso após recurso, só para se manter em evidência na eleição, jogando ainda mais instabilidade política e jurídica sobre o Tocantins. Onde está o espírito público?
Se resistir até o final, diante da morosidade do Judiciário, e ganhar, aumenta ainda mais o quadro de incertezas do Estado, porque não poderá tomar posse já que sua candidatura é irregular. Como, então, ficará o Estado? Assim, como falar em “espírito público”, “em respeito ao sofrido povo tocantinense”, “transparência” e “democracia” se não tem a capacidade de sequer aceitar as regras do processo eleitoral?
Para ser coerente com o que pediu a Carlesse, portanto, Amastha tinha que desistir da eleição suplementar.
Aí vem a segunda incoerência. O ex-prefeito já chamou a maioria dos políticos tocantinenses de “vagabundos” e os deputados estaduais de “bandidos” e “nojentos”. Apresenta-se como “novo” na política do Estado, como exemplo de “pureza” e “retidão”.
Porém, já teve Polícia Civil, pela Operação Jogo Limpo, e Polícia Federal, pela Nosotros, invadindo sua gestão. A PF o indiciou por corrupção passiva e associação criminosa. O delegado do caso, Júlio Fujiki, afirmou no indiciamento que uma “associação criminosa” se instalou na Prefeitura de Palmas, comandada por Amastha, com o objetivo “lucrar com as valorizações em terrenos decorrentes das obras do BRT”.
O prefeito garante que é inocente, chamou o delegado de vaidoso e disse que Fujiki deveria era se desculpar com ele. Até agora o agente federal não pediu desculpas, e é bom frisar que o governador Marcelo Miranda, na Operação Reis do Gado, e o ex-governador Sandoval Cardoso (SD), na Ápia, também se dizem inocentes. Por que Amastha acredita que só ele é o perseguido?
Além disso, é bom lembrar que também garante inocência aquele que se dizia a “alma viva mais honesta” da face da terra, que, no sábado, 7, começou a cumprir 12 anos e um mês de prisão, após condenação em primeira e segunda instâncias por corrupção e ainda lavagem de dinheiro.
Amastha é culpado? Marcelo é culpado? Sandoval é culpado? Não sei. Não tenho elementos fáticos para dizer uma coisa ou outra. Por isso, temos que esperar que a Justiça se pronuncie. É ela quem deve dizer.
Da mesma forma, Amastha, para manter seu discurso, para provar para o Tocantins inteiro que não é corrupto, nem lidera uma associação criminosa, como lhe acusa a PF; e que é um legítimo e coerente defensor da moralização da política do Estado, também não deveria disputar as eleições de outubro e aguardar o Judiciário se pronunciar sobre seu caso. Aí, sim, devidamente inocentado, seria, inclusive, um candidato fortíssimo, num momento em que o País vive uma onda moralizadora.
Do contrário, candidato, pregando moralidade e apontando o dedo julgador para terceiros, sob a suspeita de corrupção passiva e associação criminosa pesando contra si, Amastha se colocará na mesma situação da personagem Desirée, da novela O outro lado do paraíso, que resistia às investidas do noivo Juvenal, se dizendo “pura” e “virgem”, enquanto, sem o coitado saber, atendia seus fregueses no cabaré.
CT, Palmas, 12 de abril de 2018.