Só a repercussão do anúncio da desistência é o suficiente para mostrar a força eleitoral do ex-governador Siqueira Campos (DEM). O meio político do Tocantins praticamente parou em torno dessa notícia na noite dessa quarta-feira, 15. Aos 90 anos, caminha para o fim uma das carreiras mais bem sucedidas de um político brasileiro. Afinal, quantos lideraram a luta pela criação de um Estado, venceu e o governou por quatro vezes? Como ser humano, Siqueira é digno das mais diversas e justas críticas, mas também dos mais elevados elogios. É um marco na história política brasileira.
O reconhecimento disso está em todos os quadrantes do Tocantins, até entre aqueles que combateram o ex-governador ao longo dos últimos 30 anos. Conforme as últimas pesquisas, Siqueira lidera com imensa vantagem a corrida pelo Senado.
Quem já o acompanhou em viagens pelo interior, como o caso deste colunista, sabe do carisma desse grande líder e até do fervor que desperta por todas as regiões. Vi marmanjos chorando ao abraçá-lo. Nunca tinha me deparado com essa situação até constrangedora numa cobertura política de quase três décadas.
Por isso, os pré-candidatos a senador que me visitaram nos últimos meses falavam em disputar o segundo voto para o cargo. O primeiro, avisavam, já estava garantido ao Siqueira. Era o voto da devoção, do reconhecimento e do agradecimento, diziam.
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Com o ex-governador fora do páreo, a disputa pelo Senado se torna mais equilibrada, com candidatos de força mais homogênea. O ex-deputado federal Eduardo Gomes (SD) chega em pé de igualdade com os demais concorrentes, até porque não acredito na transferência de votos. Quem votava em Siqueira, em geral, era pelas razões acima apontadas: devoção, reconhecimento e agradecimento. Esses motivos não se aplicam a Gomes. Mas é um candidato muito competitivo, como deixou claro nas eleições de 2014, quando perdeu por mísero 0,87 ponto percentual para a senadora Kátia Abreu (PDT).
Além disso, ele recebe agora de Siqueira, com quem está desde os 17 anos, a resposta da fidelidade que sempre demonstrou ao velho cacique. O ex-deputado federal ficou ao lado de Siqueira até depois dos últimos suspiros da União do Tocantins, em 2010, quando, inclusive, já era para ser o candidato a senador, mas foi preterido. Absorveu o impacto, ergueu a cabeça e continuou do mesmo lado. A recompensa chegou.
Assim, são totalmente descabidas as teorias da conspiração que começam a surgir. A conversa é de que tudo não passou de uma armação dos dois Eduardos (Gomes e Siqueira Campos) e do prefeito de Araguaína, Ronaldo Dimas, muito próximo dos três personagens.
Não há indícios disso. Se fosse para armar algo do tipo não fariam agora, já que Siqueira poderia ser trocado até 20 dias antes das eleições. Fariam como o PT no caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Montariam o circo fingindo que o ex-governador era candidato para inflar seu nome ao máximo e só fazer a substituição no limite do prazo.
O que constatei após o caso vir a público é que todos foram pegos de surpresa. Eduardo Siqueira correu para o Hospital Santa Tereza, onde o pai estava internado desde a manhã dessa quarta-feira, o governador Mauro Carlesse (PHS) soube pela imprensa, quando estava em Fortaleza do Tabocão; e Gomes, pasmo com a notícia, não sabia o que dizer.
A impressão que ficou é que Siqueira sentiu que suas energias chegaram ao limite, o que admitiu na entrevista ao jornalista Tião Pinheiro, editor-chefe do Jornal do Tocantins. Para o ex-governador dizer isso é porque a situação é muito séria. Ele nunca se permitiu admitir em público qualquer fraqueza física. Em campanha, acompanhá-lo nas caminhadas pelos bairros e comércio era como participar de uma prova de velocidade a la Usain Bolt. Dormia e acordava de madrugada com a mesma energia. Isso tudo depois dos 80 anos, a partir das eleições de 2006. Lembram dele atravessando a nado a piscina de uma escola da Capital de roupa e tudo nas disputas de 2010, incorporando o Siqueirido?
O fato é que Siqueira não está bem de saúde. Ninguém teve dúvidas disso quando viu as tristes fotos da convenção de Carlesse que circularam pelas redes sociais. Ele entrando quase que arrastado, sentado todo o tempo na solenidade, com um semblante que não lembrava nem de longe aqueles rompantes de braços erguidos e voz estrondosa que marcavam seus discursos em outras épocas.
O que me pareceu foi que Siqueira, ciente do total esgotamento físico, mas com a mesma personalidade forte, sem consultar família e companheiros, ligou a Tião Pinheiro e colocou a notícia para impactar o Estado. Sabia que só assim estaria livre das pressões para permanecer na disputa e que, a partir da publicidade do fato, não haveria mais como recuar.
Ou seja, como grande líder que é, ciente de seus limites e conhecedor como ninguém das exigências até desumanas de um processo eleitoral, foi Siqueira, como sempre, quem deu a última palavra.
CT, Palmas, 16 de agosto de 2018.