Com o nome de PFL, o partido saiu da costela da Aliança Renovadora Nacional, a indigesta Arena, sigla que incorporava a ditadura militar. No Tocantins, era muito forte. Por ele Marcelo Miranda se elegeu governador em 2002, até ser empurrado pelo siqueirismo para o PSDB, pouco depois de sua posse.
Quando do rompimento da União do Tocantins, em 2005, o PFL, presidido pelo senador João Ribeiro, passou por uma intervenção nacional. Articulação toda pensada e executada pela então deputada federal Kátia Abreu, extremamente fortalecida na cúpula pefelista. Ela mesma acabou ficando com a presidência regional e a legenda se tornou a única a trocar o siqueirismo pelo marcelismo.
[bs-quote quote=”No Tocantins, as transformações políticas iniciadas com o fim da hegemonia da velha UT dão asas aos líderes, que também passam por renovações e fazem voos solos” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2018/02/CTAdemir60.jpg”][/bs-quote]
Ante a popularidade do primeiro governo Lula, o cheiro de naftalina ditatorial exalado pelo PFL não pegava bem, e o partido resolveu trocar de roupagem. Passou a se chamar Democratas, com a sigla DEM. De um extremo a outro: de herdeiros diretos da ditadura, seus filiados romperam com o passado e passaram a ostentar o antônimo do que representavam.
Adentramos no período de grande transformação da sociedade e de aumento das interações com o advento das redes sociais. A cobrança sobre os políticos e seus partidos se intensificaram, em meio à total confusão ideológica que até hoje impera. O PT, por exemplo, a grande esperança de uma política com ética, se tornou protagonista do maior escândalo de corrupção do mundo, ao se lambuzar no mensalão e depois no petrolão com seus sócios em comissões MDB, PP, entre outros. Não só essas, mas praticamente todas siglas precisam passar por uma assepsia, incluindo o próprio DEM, cujos alguns dos principais líderes, como os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (AP), e da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), estão sob questionamentos.
No Tocantins, as transformações políticas iniciadas com o fim da hegemonia da velha UT deram asas aos líderes, que também passaram por renovações e fizeram voos solos. A própria Kátia Abreu, já senadora, surpreendeu ao se aproximar de seus arquiinimigos petistas, dos quais se tornou até ministra da Agricultura. Antes já havia deixado o DEM e sua nova roupagem de liberal sem ditadura para empreender na aparente social-democracia do novato PSD.
Nesta etapa de sua vida política, Kátia moderou o discurso, reviu posturas e abraçou bandeiras mais populares, afastando-se assim dos pilares liberais puristas dos quais havia se tornado uma das maiores porta-vozes do País. Deixou o PSD e foi para o MDB. Depois de perfazer caminhos espinhosos, embarcou no PDT e virou candidata a vice-presidente da República. Pessoalmente, a mudança lhe fez bem e a humanizou, mas ainda é incompreendida por seu eleitorado.
Derrotado em 2006, Siqueira voltou vitorioso em 2010, vestido de “siqueirido”, mas, vencido pela profunda crise em que as disputas pelo Poder jogaram o Estado, se auto-proclamou “gerentão de folha de pagamento”. Renunciou sem concluir o mandato.
Vitorioso de 2006, Marcelo se viu em desgraça em 2009, ao ser cassado pelo TSE. Foi redimido em 2014, mas, também envolto numa crise sem fim, não conseguiu driblar o absurdo “boom” do custeio do Estado, resultante das disputas com os siqueiristas para a reeleição de anos antes. Em 2018, foi novamente afastado do mandato pelo TSE.
Nessas idas e vindas, o Tocantins, enfim, deixou de ser dividido entre marcelistas e siqueiristas. Novos grupos e novos líderes surgiram, mas, como resultado dos traumas iniciados 13 anos atrás, há um Estado a ser reconstruído.
É neste ponto que a história colocou um novato em política, Mauro Carlesse, de perfil liberal, porém, num partido sem qualquer expressão ideológica. Assim, o encontro de um liberal com o “novo” DEM pode ser salutar no momento em que a gestão pública não comporta mais experimentos, diversionismos e populismo. Essa corda não estica mais no Tocantins e no Brasil.
Por isso, os partidos do campo liberal cumprem um papel fundamental num Brasil que ainda não sabe o que é liberalismo e que insiste em apostar, erroneamente, num Estado agigantado, visto como “pai de todos”.
Ao romper com o passado de apoio aos militares e mirar a construção de um país moderno, em que o liberalismo inspire o empreendedorismo desde o berço, e tire os cidadãos do parasitismo estatal e da esmola governamental, o DEM, como demais partidos da mesma matiz, pode dar uma contribuição decisiva para a transformação cultural mais importante da história brasileira.
Ao embarcar no DEM neste momento histórico, Carlesse pode encontrar a sustentação ideológica às lições liberais que ele próprio já aplicou no Estado para ajustar as contas públicas segundo o salutar princípio de que os governos não devem gastar mais do que arrecadam.
Vão continuar as pedradas de quem ainda quer o Estado bancando tudo e todos, flertando com a irresponsabilidade fiscal que atrasa o desenvolvimento. Mas insistir no caminho da economia aberta, de uma gestão pública responsável e na formação de uma sociedade empreendedora é o único possível para o Tocantins e o Brasil não se decepcionarem com o futuro.
CT, Palmas, 22 de abril de 2019.