O Conselho Federal de Medicina (CFM) e o Conselho Regional de Medicina do Tocantins (CRM-TO) apresentaram à imprensa, na manhã desta quarta-feira, 13, dados sobre a saúde do Estado. Os órgão apontaram, entre outros problemas, a falta de leitos de internação e de Unidade de Terapia Intensiva (UTI), filas de espera para cirurgias eletivas, superlotação nos hospitais dos grandes centros, necessidade de reativação das unidades de pequeno porte e déficit de profissionais no interior. Conforme as entidades, o caso mais crítico é o do Hospital de Dianópolis que provavelmente será interditado eticamente.
Durante a entrevista, a presidente do CRM-TO, Jussara Martins, definiu a saúde do Tocantins como “deficitária”. “Existem muitas unidades que o único recurso que ela tem é uma ambulância para transportar o paciente. E às vezes, a ambulância sai do município para uma cidade maior, já precisando voltar depressa pra pegar um outro paciente”, relatou.
Após elencar os problemas constatados nos hospitais durante as fiscalizações, como filas de espera, corredores superlotados, dificuldade de marcação de consultas, exames e cirurgias e retração de leitos; o presidente do CFM, Carlos Vital, pontuou ser necessário o financiamento adequado na saúde, competência administrativa para uma efetiva aplicação das verbas, além de um sistema nacional de controle e avaliação que possa evitar distorções e desvios do erário público.
Ele aponta que nos últimos dez anos o governo federal deixou de aplicar mais de R$ 170 bilhões no Sistema Único de Saúde, um recurso que, conforme o dirigente do CFM, foi aprovado no orçamento, disponibilizado, mas não foi utilizado.
Reativação dos hospitais municipais
Segundo o CRM-TO a centralização dos atendimentos nos hospitais de alta complexidade, com a desativação dos hospitais de pequeno porte é um fator que agrava a situação da saúde no Estado. Isso gera, por exemplo, a superlotação nas unidades de referência que ficam em Palmas, Araguaína e Gurupi.
A solução que vem sendo defendida já há muito tempo pelo Conselho é a reativação das unidades municipais, entre elas as de Monte do Carmo, Silvanópolis e Porto Nacional. “Os hospitais de assistência terciária, são de alta complexidade e o dia leito custa muito caro. Então, se tiver unidades secundárias, com uma boa assistência, já reduz a vinda do paciente para unidade terciária e diminui a fila de espera de cirurgias eletivas”, explicou Jussara Martins.
Corredores do HGP
Em outubro de 2016, o CRM chegou a interditar eticamente o HGP para a desocupação da tenda/anexo e dos corredores do hospital, por entender que a prática adotada era “desumana”, feria os direitos dos pacientes que ficavam expostos, além dos protocolos éticos do exercício da medicina. Em abril deste ano, ao perceber que as providências de melhorias foram tomadas, como a desinstalação da tenda e a criação da unidade de tomada de decisão, o órgão comunicou a desinterdição.
De acordo com a presidente do CRM-TO, entretanto, os problemas foram parcialmente solucionados. Jussara informou que atualmente ainda existem pacientes internados nos corredores das alas da unidade de saúde, aguardando a liberação de vagas nos leitos. Um quadro que pode explicar, pelo menos em parte, o motivo dessa superlotação do HGP, conforme mostrou o CT em reportagem exclusiva; é o encaminhamento indevido de pacientes pelas Unidades de Pronto Atendimento de Palmas (UPAs).
Em janeiro deste ano, 91% dos pacientes (719) foram encaminhados inadequadamente para o HGP, somente 7%, ou seja, 74 pacientes foram encaminhados corretamente para unidade. Os dados de fevereiro não são tão diferentes. Dos pacientes encaminhados pela UPAs de Palmas, 93% (552) poderiam ter sido atendidos nas unidades municipais e apenas 7% (41 pacientes) realmente estavam necessitados de atendimentos de alta complexidade.
O CT constatou que casos como dores na região lombar, dores de cabeça, dores de ouvido, infecção intestinal, dores de garganta, além de outros sintomas constam dos relatórios de atendidos no HGP e que foram encaminhados pelas UPAs de Palmas. Atendimentos de baixa complexidade, que deveriam ter sido feitos nos postos de saúde ou na própria UPA são encaminhados para o HGP e ajudam a aumentar as filas por atendimento.
Sobre essa deficiência, a presidente do CRM-TO comentou que “a falha na atenção básica acaba gerando uma doença que precisa de hospitalização”. Jussara, que é pneumologista, lembrou que a tuberculose, por exemplo, é pra ser diagnosticada na unidade básica, ou seja, no posto de saúde. “Quando a unidade básica não diagnóstica e o paciente adoece ele vai para o hospital. Mas o hospital não é lugar de fazer diagnóstico de tuberculose, não é lugar de chegar uma pneumonia simples, mas chega”, enfatizou.
Médicos no interior
Outro ponto mencionado pelo CRM-TO durante a coletiva, e que constantemente é usado pelos gestores como justificativa da precariedade nos atendimentos, é o déficit de profissionais no interior do Estado. O representante do Tocantins no Conselho Federal de Medicina no Tocantins, Nemésio Tomasella, disse que o órgão defende a carreira pública para o médico como solução para esse problema.
“O concurso público resolveria o nosso problema no SUS”, afirmou. “O Tocantins poderia dar o pontapé inicial e criar a carreira estado para o médico. Ou seja, ele vai saber o que ele vai poder trabalhar e o tempo que ele vai precisar para poder chegar numa cidade maior”. Segundo Tomasella, na realidade, não há déficit de médicos, o que existe é a “má distribuição” e a “falta de interesse” da gestão de implementar incentivos salariais para o profissional de saúde permanecer no interior.
Hospital de Dianópolis
Uma unidade de saúde que vem apresentando há meses problema de falta de profissionais é o Hospital de Referência de Dianópolis. Equipe de fiscalização do CRM visitou o local, nesta semana, para averiguar se houve alguma melhoria orientada pela entidade para não efetivar a interdição ética. Contudo, o órgão constatou que nenhuma mudança foi implementada e que a escala dos plantões continua comprometida.
O hospital tem trabalhado com no máximo dois médicos de plantão por dia. Segundo o CRM-TO, além de “insuficiente” a prática é “desumana” e “desrespeitosa” para com os pacientes e profissionais médicos. De acordo com a Resolução 2.077/14 do CFM, por ser um hospital de referência ele deveria contar com o mínimo de especialidades distintas diariamente (um clínico geral, um pediatra, um gineco/obstetra, um anestesista e um ortopedista) além do plantonista, o que não ocorre.
Na próxima reunião plenária que acontecerá nesta quinta-feira, 14, o CRM-TO avaliará o caso e dará encaminhamento aos trâmites. Segundo o conselheiro federal Nemésio Tomasella, provavelmente a unidade sofrerá interdição ética, ou seja, não poderá internar mais nenhum paciente.
Fiscalização
Nesta quarta-feira os órgãos também realizaram fiscalizações no Hospital Geral de Palmas e no Hospital e Maternidade Dona Regina. Possivelmente, após a elaboração dos relatórios, os órgãos de controle serão acionados. O CRM-TO destacou que o objetivo dessas medidas é reduzir os problemas do Sistema Único de Saúde no Estado.
Também estiveram presentes na coletiva de imprensa, o secretário geral do Conselho Federal de Medicina, Henrique Batista; o diretor financeiro do CFM, José Iran Gallo, e o 2º vice-presidente do CFM, Jecé Brandão; além de conselheiros do CRM-TO.
Outro lado
Em nota ao CT, a Secretaria Estadual de Saúde informou que vai tomar providências assim que receber comunicado oficial dos Conselhos Regional e Federal de Medicina, referente às visitas realizadas nas unidades hospitalares do Estado.
Confira a íntegra da nota do governo:
“NOTA DE ESCLARECIMENTO
A Secretaria de Estado da Saúde informa que até o momento não recebeu nenhuma comunicação oficial dos Conselhos Regional e Federal de Medicina, referente às visitas realizadas nas Unidades Hospitalares da SES essa semana.
A SES informa ainda que todos os apontamentos, oficializados, serão analisados pelos setores técnicos responsáveis e as providências serão tomadas o mais breve possível, a fim de manter um atendimento de qualidade aos usuários do sistema público de saúde.
Palmas, 13 de junho de 2018.”