Uma troca de tiros entre policiais militares e suspeitos de roubo de um carro terminou em quatro mortes na noite desta terça-feira, 15. Em coletiva à imprensa, o chefe da Assessoria de Comunicação da Polícia Militar do Tocantins, capitão Gleidison Antônio Carvalho, explicou a ocorrência e disse que três criminosos chegaram a ser atendidos, mas não resistiram aos ferimentos.
De acordo com Carvalho, por volta das 8 horas desta terça, a Polícia Militar foi acionada para atender uma ocorrência de roubo de veículo. Quatro homens renderam o proprietário do carro na Região Norte de Palmas e, após circular pela cidade, o abandonaram, amarrado e sem algumas peças de roupa, na Quadra 901 Sul. Informações extraoficiais apontaram que a vítima é motorista do aplicativo de transporte de passageiros Uber. A PM, porém, não confirmou.
Perseguição
Carvalho contou que após a ação, os assaltantes seguiram para o município de Tocantínia, que fica a 85 quilômetros de Palmas. “Não se sabe se lá em Tocantínia eles realizaram algum tipo de crime. Porém, nós recebemos através de denúncias anônimas que eles estavam na cidade. Então, viaturas de Palmas deslocaram até lá para fazer a abordagem”, informou o capitão.
Ainda a caminho de Tocantínia, segundo Carvalho, as viaturas da Polícia Militar se depararam com os quatro suspeitos retornando para a Capital no carro da vítima. Nas proximidades do Clube Itapema, saída para Lajeado, os policiais fizeram a abordagem, mas os homens não atenderam a ordem de parada e continuaram a fuga. Na altura da Quadra 212 Sul, a Polícia Militar conseguiu novamente fazer a interceptação, mas foi recebida a tiros, afirmou o capitão.
“Na troca de tiros três autores foram alvejados, sendo que um veio a óbito no local e dois foram atendidos no serviço de saúde. Um quarto elemento se escondeu num matagal próximo a região da abordagem. Outras viaturas fizeram a interceptação e este autor, infelizmente, tentou revidar a ação da PM, desferindo tiros. A equipe, para se defender, cessar a injusta agressão e aplicar a lei, efetuou disparos contra o infrator, que foi atendido pelo Corpo de Bombeiros”, detalhou o chefe de comunicação da corporação.
Uma das viaturas chegou a ser atingida durante a ação, mas nenhum policial ficou ferido. Já os três suspeitos que foram encaminhados para atendimento médico no Hospital Geral de Palmas (HGP) não resistiram aos ferimentos e morreram no local. Conforme carvalho, com eles foram encontrados quatro armas de fogo e duas facas. Questionado se os assaltantes já tinham registros de passagens pela polícia, o capitão informou que os mesmos não portavam documentos e, por isso, ainda não foram identificados.
O Grupo de Operação com Cães (Goc), a Ronda Ostensiva Tática Metropolitana (Rotam), a força tática e viaturas de área, com cerca de 16 militares, atuaram nesta ocorrência. O capitão ressaltou que o intuito inicial da Polícia Militar não é usar força letal durante abordagens, mas, de acordo com ele, se o infrator oferece resistência não existe outra alternativa. “Nos casos de ocorrências em que os cidadãos infratores tentam revidar a atuação da PM, não obedecem a ordem de parada, efetuam disparos contra as equipes; não há outra alternativa se não repelir essa injusta agressão para preservar vidas e aplicar a lei”, argumentou.
Condução do inquérito
Ao término da ocorrência, os policiais se apresentaram ao Batalhão de Choque e agora está sendo instaurado um Inquérito Policial para apurar as circunstâncias da ação. O Sindicato dos Delegados de Polícia de Civil do Estado do Tocantins (Sindepol/TO) questionou o fato dos militares não terem se apresentado na delegacia após a ação: “Agiram de forma ilegal”, disse o presidente da entidade, Mozart Felix, em nota.
Segundo a entidade, a legislação brasileira e ampla jurisprudência dos Tribunais Superiores deixam claro que cabe à Polícia Militar a missão constitucional de realizar o policiamento preventivo e atuar na investigação “tão somente dos crimes militares” e não dos crimes contra civis.
“A Constituição Federal, em seu artigo 125, § 4º, diz que a competência para processar e julgar os crimes contra a vida praticados contra civil, ainda que a autoria seja atribuída a um militar, é do Tribunal do Júri, não da Justiça Militar. Assim, logo após o desfecho da ocorrência, os policiais militares envolvidos deveriam ter se dirigido à Delegacia de Polícia de Plantão e informado o ocorrido ao delegado para que fossem adotadas as medidas cabíveis”, apontou o presidente.
O Sindepol salientou que não está colocando em dúvida a legalidade da ação a qual resultou na morte de quatro indivíduos. “Apenas reafirmamos nosso compromisso com o cumprimento das leis e o respeito ao Estado Democrático de Direito”, explicou.
A entidade disse que vai oficiar a Secretaria de Segurança Pública, Delegacia Geral da Polícia Civil, Ministério Público, Defensoria Pública, Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Tocantins (OAB-TO), Poder Judiciário e Comando Geral da Polícia Militar, para que tomem as devidas providências “no sentido de impedir que essa ilegalidade venha a se repetir”.
Sem receios
Durante a coletiva, o capitão da PM Gleidison Carvalho havia adiantado que a Corregedoria da corporação vai decidir quem será responsável por conduzir o inquérito. Mas ele pontuou que “segundo o Código Penal Militar essa é uma atribuição da Polícia Militar” e acrescentou que o documento vai ser remetido ao MPE e à Justiça militar. “É um documento aberto, então, não há porque termos, talvez, receios referente a condução desses trabalhos”, concluiu.
Confira a íntegra da nota do Sindepol:
“Nota de esclarecimento sobre a tutela de investigação criminal
O Sindicato dos Delegados de Polícia de Civil do Estado do Tocantins (Sindepol/TO), por meio do seu presidente, Mozart Felix, vem a público esclarecer sobre as reponsabilidades da Polícia Militar no que se refere a investigação criminal e a obrigação da Polícia Civil neste mesmo quesito.
Sobre o fato ocorrido nesta terça-feira, 15, em Palmas (no qual quatro assaltantes foram mortos em confronto com policiais militares), esclarecemos que, segundo amplamente noticiado, logo após o ocorrido os policiais militares envolvidos na ocorrência procuraram a Autoridade Judiciária Militar, agindo de forma ilegal, pois a legislação brasileira e ampla jurisprudência dos Tribunais Superiores deixam claro a responsabilidade da Polícia Judiciária (Polícia Civil ou Federal) na apuração dos crimes dolosos contra a vida praticados por militares. Cabe à Polícia Militar a honrosa missão constitucional de realizar o policiamento preventivo e atuar na investigação tão somente dos crimes militares.
A Constituição Federal, em seu artigo 125, § 4º, diz que a competência para processar e julgar os crimes contra a vida praticados contra civil, ainda que a autoria seja atribuída a um militar, é do Tribunal do Júri, não da Justiça Militar. Assim, logo após o desfecho da ocorrência, os policiais militares envolvidos deveriam ter se dirigido à Delegacia de Polícia de plantão e informado o ocorrido ao Delegado para que fossem adotadas as medidas cabíveis. Salientamos que não estarmos colocando em dúvida a legalidade da ação a qual resultou na morte de 04 indivíduos, apenas reafirmamos nosso compromisso com o cumprimento das leis e o respeito ao Estado Democrático de Direito.
O entendimento do Juiz de Direito do TJTO (Presidente dos Conselhos da Justiça Militar Estadual), Dr José Ribamar Mendes Júnior, vai ao encontro de tudo o que expusemos aqui, vejamos a Decisão prolatada nos autos do processo nº 001503-32.2016.827.2729:
DECISÃO Trata-se de Inquérito Policial Militar que buscou apurar o óbito de Leandro Alves de Souza, na cidade de Gurupi – TO, após troca de tiros deste com policiais militares no dia 06/02/2016. A Constituição Federal resguardou a competência do Tribunal do Júri para processar e julgar os referidos crimes quando praticados contra civil (artigo 125, §4º), mesmo que a autoria seja atribuída a Militares. No mesmo sentido, também dispõe o artigo 9º, parágrafo único, do Código Penal Militar. A Carta Magna determina expressamente a competência da Justiça Militar Estadual, em seu artigo 125, §4º: “Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças” (Grifo). Os fatos descritos no IPM não se enquadram em nenhuma das hipóteses previstas no artigo 9º do Código Penal Militar. Por tais motivos, defiro o requerimento ministerial do Evento n. 08, determinando o encaminhamento dos presentes autos a Justiça Comum da cidade de Gurupi – TO, com as devidas baixas, posto que esta Justiça Castrense não é competente para apreciar o feito. Cumpra-se. Palmas – TO, data certificada pelo sistema. Juiz de Direito – José Ribamar Mendes Júnior Presidente dos Conselhos da Justiça Militar Estadual (grifos nossos).
Informamos ainda que oficiaremos a Secretaria de Segurança Pública, Delegacia Geral da Polícia Civil, Ministério Público, Defensoria Pública, OAB, Poder Judiciário, Comando Geral da Polícia Militar, para que tomem as devidas providências no sentido de impedir que essa ilegalidade venha a se repetir.
Mozart Felix
Presidente do Sindepol/TO”