Estimados leitores e leitoras! Como estão vocês, neste período de quaresma? A Quaresma, como prática obrigatória, foi instituída no século IV, mas, desde sempre, os cristãos se preparavam para a Páscoa com oração intensa, jejum e penitência. Será que isto continua a acontecer? Cabe a cada um de nós vivermos a quaresma de acordo com nossas convicções, não é mesmo? O importante é que tenhamos consciência do que aconteceu no passado longínquo para podermos viver em paz no nosso presente.
Hoje quero falar com vocês sobre um tema que pode gerar interpretações diferentes, mas que é bastante interessante. Recentemente tive acesso ao “ensaio” ou “artigo”, como vocês melhor compreenderem, publicado na Revista de Direito/Viçosa, pela Drª. Priscilla de Souza Pestana Campana, que esta concluindo seu mestrado em Direito Público pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), ela também é pós-graduada em Direito do Estado e da Regulação pela Fundação Getúlio Cargas (FGV), advogada e Bacharel em Direito Pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O título do seu trabalho é: “A CULTURA DO MEDO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E A INEFICIÊNCIA GERADA PELO ATUAL SISTEMA DE CONTROLE”. Pedi autorização a ela para poder levar até vocês, resumidamente, parte do seu trabalho.
[bs-quote quote=”As instâncias de controle têm cada vez mais aumentado o seu próprio poder punitivo, atuando de forma extremamente rígida e inflexível no controle dos atos administrativos, o que não necessariamente tem obtido êxito no combate à corrupção” style=”default” align=”left” color=”#ffffff” author_name=”Tadeu Zerbini” author_job=”É economista e consultor” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2018/02/TadeuZerbini60.jpg”][/bs-quote]
Vou me ater aos cargos de prefeitos e presidentes de câmaras municipais. Imaginem vocês a briga que não é para um candidato ser eleito prefeito ou presidente de uma câmara municipal. Quando são eleitos, ficam radiantes de felicidade, até que assumam seus cargos. Muitos, despreparados tecnicamente, vão conhecer a realidade da gestão pública pós Constituição de 1988. Na hora que começam a trabalhar, para implantar o que haviam prometido, vão começar a escutar “isto não pode”, “assim você vai ser preso”, “viu o que aconteceu com fulano? Tá respondendo a dez processos”. A partir daí, o medo se instala na gestão.
As prefeituras recebem recursos financeiros do Estado e da União, além dos seus próprios e tem que prestar contas das suas aplicações aos órgãos controladores. Acontece que, conforme a Drª Priscilla, desde a Constituição de 1988, o ordenamento jurídico brasileiro tem ampliando cada vez mais a sua gama de instituições e normas que, direta ou indiretamente, controlam a atuação da Administração Pública e buscam evitar o abuso de poder e a corrupção que tanto mancham a imagem das Administrações Públicas pelo país afora. No âmbito Federal, temos hoje, o TCU, a CGU, o MPF, a AGU, o CADE, a CVM, a Polícia Federal, O Poder Judiciário e o Legislativo, por meio das Comissões Parlamentares de Inquérito. No âmbito Estadual, temos o TCE, Ministério Público e Polícia Civil. Se recebe o dinheiro da União, é fiscalizado pelos órgãos de controle federal, se recebe do Estado ou se são próprios, é fiscalizado pelos órgãos estaduais.
A diferença entre a qualificação dos servidores dos órgãos federais e estaduais de controle e a qualificação dos servidores das prefeituras e das câmaras municipais é de uma distância extraordinária. A baixa qualificação dos servidores municipais, principalmente de pequenas prefeituras e câmaras municipais, retardam as ações dos gestores, simplesmente por medo de fazerem alguma coisa que não seja interpretada como correta pelos órgãos de controle. O medo de se estar fazendo alguma coisa errada e passível de penalização, faz com que os serviços oferecidos pelas prefeituras fiquem aquém do que a população espera.
Na prática, as prefeituras e câmaras municipais utilizam-se dos seus controles internos e de suas procuradorias para poder ter um mínimo de confiança nas tomadas de decisão. A falta de conhecimento da legislação impacta negativamente o resultado final da gestão. A burocracia para se fazer alguma coisa na gestão pública é imensa e desafia os bons gestores. Quantas licitações que são feitas acabam sendo judicializadas pelos participantes? Em quantas licitações o vencedor desiste de executar ou fornecer serviços e obras? Existem vários modelos de licitação e até de dispensa de licitação. A contratação direta por uma prefeitura é o fim do mundo. É vista como sinal de corrupção, enquanto que ao se aderir a uma “ATA”, com preços exorbitantes, é o normal.
Nos últimos anos temos acompanhado várias ações policiais, prisões temporárias, prisões preventivas, indisponibilidade de bens e tantas outras decisões contra os gestores públicos de todas as esferas. Não discordo disto, o que acho, concordando com a Drª. Priscilla, é que as instâncias de controle têm cada vez mais aumentado o seu próprio poder punitivo, atuando de forma extremamente rígida e inflexível no controle dos atos administrativos, o que não necessariamente tem obtido êxito no combate à corrupção.
As denúncias irresponsáveis e as oposições políticas aos gestores públicos tornam-se um pesadelo diário para os gestores de pequenos municípios. O controle burocrático, aliado às novas tecnologias exige investimentos que nem todos os municípios podem fazer. As demandas por parte dos órgãos de controle exigem batalhões de contadores e advogados das prefeituras e das câmaras municipais, para responderem, com certa qualidade, os questionamentos dos órgãos de controle e, mesmo assim, nem sempre conseguem.
Outro fato importante diz respeito à demora que um processo iniciado pelos órgãos de controle chegue ao seu final. O desgaste político-administrativo é letal. Tem gestor público que acha que, ao término do seu mandato, passou ileso pelos órgão de controle. Se enganou. Temos muitos casos de processos que são abertos posteriormente ao período do mandato do gestor e após muitos anos gastando dinheiro com advogados e contadores, consegue provar que estava certo, mas para a vida política e pessoal dele, o estrago aconteceu.
Aqui no Tocantins, tivemos prefeitos renunciando aos cargos no primeiro ano de mandato, porque vislumbraram sérias dificuldades para proporcionar uma melhor qualidade de vida para seus munícipes.
O medo que o gestor tem dos órgãos de controle, prejudica a população e empobrece os municípios. Algo tem que ser feito para, ao menos, equilibrar o entendimento pedagógico das legislações de controle. Com as tecnologias disponíveis, seria possível unificar as demandas dos órgãos de controle. Os gestores públicos municipais devem promover um debate nacional sobre este assunto para que a administração pública não fique engessada e extremamente burocrática como esta acontecendo. O medo não pode prejudicar os serviços públicos prestados pelos municípios.
TADEU ZERBINI
É economista, especialista em Gestão Pública, professor e consultor
ctzl@uol.com.br