A geometria plana, como conhecemos hoje, evolui lado a lado com a agrimensura, para possibilitar aos profissionais encarregados da tarefa de medir e demarcar terras, desempenharem seu trabalho, com cada vez mais precisão.
Três são os pontos basilares da medição de terras, quais sejam, sua representação espacial, por meio do mapa ou croqui, sua representação em coordenadas por meio do memorial descritivo, analógico ou em planilha, e sua representação física, por meio dos marcos de divisa, que comumente podem orientar cercas e outros instrumentos de estremação, que estão intimamente ligados ao moderno instituto do Georreferenciamento, constituindo-se na base do sistema de Gestão Fundiária do INCRA o SIGEF.
Os marcos são estruturas físicas colocadas em pontos estratégicos do perímetro do imóvel, visando indicar o contorno do mesmo, geralmente em vértices onde uma determinada angulação, provoca uma quebra na linha de medição.
Tais objetos sempre existiram em nossa história, e eram comumente feitos em madeira ou pedra, fixados ao solo. Geralmente quando feitos em pedra continham indicação do ano e finalidade gravada em uma de suas faces.
Atualmente tais marcos são feitos em concreto armado ou plástico, e podem conter as seguintes informações: o órgão responsável por sua certificação, ano da medição, credencial do profissional responsável, bem como o código inequívoco do vértice, no centro da qual será realizada a medição.
Tais marcos devem ser fixados de modo permanente, e recebem, por óbvio, a devida proteção legal.
O marco representa o ponto geodésico, mas não é o ponto, é tão somente a representação física do local onde o ponto foi coletado, com a finalidade de ser inserido no sistema.
A coleta de tais pontos devem ser feita com muita cautela, pois um mínimo deslocamento de seu eixo base, altera significativamente os limites das áreas contiguas em diversos hectares.
Por outro lado, questão comum, quando há algum conflito de divisas entre proprietários de imóveis contíguos, é que haja a destruição dos marcos de divisa.
A parte que comete tal conduta de invasão, comete o crime previsto no Art. 161, II do Código Penal, e as sanções penais cabíveis.
A parte que destrói os marcos de delimitação de propriedade alheia, sob qualquer pretexto, comete crime previsto no Art. 161 do Código Penal, e pode ser condenado a pena de um a seis meses e multa.
Ocorre ainda, que por força do Art. 186 do Código Civil, tal conduta está sujeita ainda a apreciação pelo Juiz, na esfera cível para condenação em perdas e danos, em favor da parte lesada.
As partes envolvidas nesse tipo de situação, muitas vezes praticam tais atos movidos pelo calor do momento, por meios inadequados.
Os marcos são elementos basilares do georreferenciamento, e são a expressão física dos limites dentro dos quais a parte afirma sua propriedade absoluta e externa sua posse.
Por isso, se assentados fora do local correto, são fonte de serias discórdias, que podem causar ações precipitadas das partes envolvidas.
A parte que assim se comporta, o faz, não sabendo que, é simples requerer o cancelamento do georreferenciamento de outrem, se este estiver sobreposto a propriedade que não lhe pertence, seja de modo parcial, ou integral.
E mais simples ainda rever as divisas entre dois imóveis, caso se suspeite que sua área está, em parte, ou no todo, ocupada por outrem.
Tal cancelamento, pode ser pleiteado tanto não via administrativa, quanto judicial, bem como as provas de extensão e limites físicos da propriedade, podem ser aduzidas em procedimento cível próprio, caso se faça necessário.
Lembramos sempre ao leitor, que os marcos de divisa, apenas facilitam a identificação dos pontos de confrontação, mas, que a justiça tem que lidar com esse tipo de conflitos, desde os primeiros dias da humanidade, e que existem diversas formas de se elucidar, no curso de um processo, se alguém de má-fé alterou marcos e divisas entre propriedades, causando prejuízo e dano a outrem.
Dessa forma, é interessante sempre consultar um Advogado de sua confiança, quando confrontado com uma situação tão complexa.
Por fim, depois de um assunto tão tenso… vamos descontrair com uma história curiosa, que serve também de exemplo da importância real dos marcos de divisa.
Um agricultor que quase redefiniu o limite entre nações.
Os limites entre os países são firmados por tratados, que contem mapas e memórias precisos dessas linhas divisórias, mas são também, representados por marcos de fronteira.
Alguns desses marcos tem séculos e até milênios.
Imaginem a situação de um agricultor, que é proprietário de um imóvel na região fronteiriça entre a Bélgica e a França.
Agora imaginem que a propriedade desse agricultor confronta especificamente com os limites entre as duas nações, estabelecido pelo Tratado de Kortrijk, assinado em 1820, ou seja a mais de 180 anos, e que pós fim aos conflitos de fronteira causados pelas Guerras Napoleônicas.
Pois bem, o agricultor incomodado com marco de pedra existente na divisa de sua propriedade, e que o incomodava a trafegar com seu trator, resolveu mudá-lo de localização, imaginando que isso faria pouca diferença.
A situação passou desapercebida até que, um dia certa pessoa, com conhecimento sobre história e as fronteiras dos dois países, estava passeando na floresta entre Bélgica e França quando percebeu que a pedra que marcava a fronteira havia sido deslocada em 2,29 metros.
Acontece que um mínimo deslocamento de um marco, pode alterar em quilômetros a extensão da área demarcada, e no caso concreto a fronteira entre a França e o que agora é a Bélgica se estende por 620 km, já imaginaram a confusão?
No passado, esse tipo de mudança causaria uma dor de cabeça enorme entre os proprietários de terras privadas, ressaltou ele, e também entre os Estados vizinhos.
Ainda bem que em vez de causar um alvoroço internacional, o incidente foi recebido com sorrisos e piadas em ambos os lados da fronteira.
As autoridades belgas devem entrar em contato com o fazendeiro para pedir que ele recoloque a pedra no seu local original. Se isso não acontecer, o caso pode, ter diversos desdobramentos nas esferas penal, cível e de relações internacionais.
ANTÔNIO RIBEIRO COSTA NETO
É consultor jurídico, professor universitário e escritor; Advogado com escritório especializado em Regularização Fundiária, Direito Agrário e de Direito de Propriedade; Membro da Comissão Nacional de Direito do Agronegócio-ABA; Membro Consultor da Comissão de Relações Agrárias-OAB/TO; Especialista em Direito Imobiliário-UNIP/DF;
costaneto.jus.adv@gmail.com