A Secretaria de Meio Ambiente Recursos Hídricos do Tocantins (Semarh) recebeu na tarde de quarta-feira, 9, uma carta que cobra a criação de uma Unidade de Conservação de Uso Sustentável, Reserva Extrativista (Resex) ou Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) no Rio Caiapó. O documento é assinada pela Colônia de Pescadores de Araguacema (Copesca Z-5), organizações locais, além da Câmara e Prefeitura de Araguacema.
ENTENDA
Conforme o vice-presidente da Colônia de Pescadores, Valdemi Lima, apesar de existir um acordo de pesca para proteger a região, a fiscalização vem sendo realizada voluntariamente pelos próprios pescadores e não tem apresentado os resultados esperados para a manutenção da vida do Rio Caiapó. “É uma área de berçário de peixes e criar uma unidade de conservação é uma coisa que acreditamos que vai fortalecer devido a fragilidade de a gente fiscalizar. A gente trabalha voluntário e diante dessa situação estamos sendo persistente apesar da dificuldade”, pontua.
ACORDO NÃO SE CLASSIFICA COMO LEI
Apesar dos esforços da comunidade em restringir a pesca a determinados locais catalogados, a pesca irregular na região e a falta de apoio na fiscalização não têm surtido o resultado esperado, defendem. O Acordo de Pesca conta com regimento interno aprovado pelo Instituto Natureza do Tocantins (Naturatins) com apoio do Ministério Público Federal, no entanto não se classifica como uma lei.
VISITA
Na Semarh, o vice-presidente da Copesca esteve acompanhado de outras organizações que compõem a Coalizão Vozes do Tocantins por Justiça Climática e foram recebidos pela Chefe de Gabinete, Joice Macedo, e pelo Gerente de Biodiversidade e Áreas Protegidas, Cláudio Carneiro.
Confira o documento na íntegra
CARTA DE ARAGUACEMA – 10 DE AGOSTO DE 2023
Nós, Pescadoras e Pescadores do município de Araguacema, Estado do Tocantins, nos reunimos na Colônia de Pescadores, em 10 de agosto de 2023, para debater o contexto do Acordo de Pesca no Rio Caiapó, sobretudo com relação às dificuldades de vigilância do local e às alternativas para garantir a conservação da área e dos nossos meios de vida.
Desse modo, solicitamos a criação de uma Unidade de Conservação de Uso Sustentável (Reserva Extrativista ou Reserva de Desenvolvimento Sustentável) que garanta de modo mais efetivo a conservação dos recursos naturais e mantenha nossos modos de vida.
A área que utilizamos para pesca é uma porção inserida na Área de Proteção Ambiental Ilha do Bananal/Cantão, criada em 1997, em área de transição entre o Cerrado e a Amazônia, possui uma área total de 1.678.000 (um milhão, seiscentos e setenta e oito mil) hectares, abrangendo os municípios de Abreulândia, Araguacema, Caseara, Chapada de Areia, Divinópolis, Dois Irmãos, Marianópolis, Monte Santo e Pium.
A região do rio Araguaia é considerada prioritária para conservação da biodiversidade, sendo um importante ecossistema por suas características de transição de biomas, o que a torna ainda mais rica em biodiversidade. O município de Araguacema possui uma população estimada de 5.927 habitantes, e uma média de renda de 1,5 salários mínimos, sendo que 48,3 % da população possui um rendimento nominal de ½ salário mínimo, segundo informações do IBGE.
Embora a área que utilizamos esteja no interior de uma APA, percebemos, em 1996, que os estoques pesqueiros em Araguacema estavam reduzindo, com base nos dados de produção dos pescadores artesanais e relatos de turistas que praticavam a pesca esportiva no local.
Buscamos, então, reverter essa situação que ameaçava nossos meios de subsistência e, por meio da Colônia de Pescadores Z-05 de Araguacema e da COOPTER, iniciamos, há quase 10 anos, uma ação de Acordo de Pesca para garantir a proteção e o manejo comunitário e sustentável da pesca artesanal, denominado “Projeto Pescar”.
Esse projeto vem desenvolvendo, desde então, um trabalho de organização social, monitoramento da população do pirosca (pirarucu) e manejo comunitário da pesca em 37 dos mais de 80 lagos naturais formados com as águas dos rios Araguaia e Caiapó, no município de Araguacema-TO, tendo como principal objetivo a conservação da fauna, principalmente aquática, e da flora através de práticas sustentáveis de manejo da pesca e territorial, integrando os trabalhadores das águas e sua sustentabilidade.
Uma das nossas principais ações que vêm acontecendo é a vigilância, que ocorre diuturnamente, realizada voluntariamente por nós, onde foram obtidos resultados importantes como o aumento do número de peixes, a redução das queimadas e o aumento da fauna silvestre, tornando o lugar um paraíso para os amantes da prática de pesca esportiva (pesque e solte), trazendo mais renda e alternativa de trabalho para os comunitários da região. Além disso, lutamos para que fosse feito o primeiro acordo de pesca no Tocantins.
Embora nossa luta tenha avançado e o Acordo de Pesca tenha sido um importante passo para a conservação dos recursos pesqueiros isso tem sido insuficiente para garantir a proteção da área. A necessidade de fazermos a vigilância no local, de forma voluntária e diuturnamente, nos coloca em situação de risco, pois ainda é preciso manter o combate à pesca e à caça ilegal na área do manejo, além do combate às queimadas.
As ameaças principais são a pesca predatória e ilegal, pessoas que adentram a área e ameaçam os pescadores que fazem a vigilância no local. Além disso, turistas ingressam no local do acordo de pesca, sem autorização, não cuidam da natureza, levam peixes em grandes quantidades e deixam lixo no local, além de fazerem ameaças. Recentemente, vem ocorrendo situações ainda mais graves, com a abertura de estradas nas fazendas que têm acesso aos lagos e por elas ingressam pescadores e caçadores ilegais.
Ressaltamos, ainda, que os órgãos responsáveis precisam estar mais presentes na região do Acordo de Pesca, com a realização de ações de fiscalização, reforçando a proteção da área e a realização de estudos para outros usos sustentáveis, como a apicultura, que pode gerar renda para a comunidade. Além disso, é importante que sejam desenvolvidas ações de recuperação das áreas desmatadas na beira do rio e de fortalecer continuamente ações de educação ambiental (Programa de Educação Ambiental).
Ressaltamos que criação de uma unidade de conservação (Resex ou RDS) do Berçário do Rio Caiapó é uma solicitação nossa, pescadoras e pescadores da Colônia de Pescadores Z-5 de Araguacema, para que possamos continuar a manter nossa área e os nossos modos de vida vivos.
A criação da UC pleiteada contribui também para a proteção da Amazônia e do Cerrado, importantes biomas para garantir a biodiversidade brasileira e combater as mudanças climáticas.
Assinam essa Carta a Colônia de Pescadores Z-05 e as seguintes organizações e instituições que apoiam nossa solicitação:
- Colônia de Pescadores Z-05 de Araguacema – TO.
- Cooperativa de Trabalho, Prestação de Serviços, Assistência Técnica e Extensão Rural – COOPTER.
- Prefeitura Municipal de Araguacema -TO.
- Instituto Sociedade, População e Natureza – ISPN.
- Câmara Municipal de Vereadores de Araguacema-TO.
- Associação dos Marinheiros e Pescadores do Araguaia – AMA.