Ao longo das últimas décadas, testemunhamos, no Brasil, uma transformação significativa que reconfigurou as bases econômicas, culturais e políticas do país. E o epicentro dessa metamorfose foi o setor agropecuário, que emergiu como uma força dominante. Enquanto isso, a industrialização, outro símbolo de progresso, parece estagnada. O agro, outrora visto como uma atividade predominantemente rural, ganhou destaque como motor da economia nacional. A expansão das fronteiras agrícolas, os avanços tecnológicos no campo e a adoção de práticas sustentáveis adotadas pelos produtores, convergiram para estabelecer o Brasil como um player destacado no cenário de exportação agropecuária global. Os grãos que saem dos campos brasileiros não apenas alimentam as nações, mas também impulsionam a economia doméstica, gerando receitas substanciais e fomentando a geração de empregos. Esse boom agropecuário não se limita apenas às cifras nos relatórios econômicos, ele permeia de maneira intrínseca a esfera cultural, moldando a identidade nacional de forma imprevista.
A música brasileira, por exemplo, absorveu os ecos do campo. Letras que antes marcadas por temas relacionados às dinâmicas fabris, agora narram o dia a dia do trabalhador rural, sua relação com a terra e os ciclos da natureza. Gêneros como o sertanejo e o forró, que antes eram nichos regionais, apresentaram projeção nacional, refletindo a nova realidade sociocultural do país. No domínio da moda, as passarelas também refletem a estética inspirada no ambiente rural, com estilistas incorporando elementos do campo em suas criações, conferindo sofisticação a aspectos antes considerados simples. O sotaque linguístico, caracterizado pelos mecanismos industriais, experimentou uma metamorfose, ressoando agora com as nuances provenientes das áreas rurais. Estas características linguísticas carregam ênfase em entonações e vocabulários específicos dessas localidades, contribuindo para a formação de uma identidade singular.
A esfera política no Brasil, historicamente vinculada aos centros urbanos industriais, experimentou uma realocação significativa de poder. Essa dimensão da sociedade testemunhou uma mudança paradigmática. Políticos ligados ao agronegócio ascenderam, trazendo consigo uma visão fundamentada na valorização do campo, na promoção da sustentabilidade e na formulação de políticas destinadas a catalisar o desenvolvimento do setor agropecuário. A elite, que tradicionalmente se ancorava nos centros industriais urbanos, viu-se agora representada entre os barões do agronegócio, reconfigurando substancialmente a estrutura de poder nacional. Tal mudança na composição da elite econômica e política contribui para uma redefinição nas dinâmicas de poder no país. Isto não apenas sugere uma transferência de influência dos setores urbanos-industriais para as áreas rurais-agropecuárias, mas também aponta para a emergência de uma nova ordem política e econômica no cenário brasileiro.
Enquanto isso, o setor industrial, outro símbolo de desenvolvimento, parece estagnado em um passado que não se adequa mais à dinâmica contemporânea. As instalações fabris que um dia foram epicentros de produção em larga escala, enfrentam desafios para competir em um mundo cada vez mais digital e globalizado. A ausência de iniciativas inovadoras e de adaptação às demandas do mercado resultou na diminuição da participação industrial na estrutura econômica, cedendo espaço para a vitalidade demonstrada pelo setor agropecuário.
A estagnação industrial, além de seu impacto econômico, projeta-se nas transformações sociais observadas. Antigas cidades industriais, que em outros tempos pulsavam com atividade, testemunham agora uma redistribuição demográfica, à medida que seus habitantes buscam oportunidades nas áreas rurais. Este movimento é motivado pela atração exercida pelos benefícios econômicos e pela qualidade de vida proporcionada pelas regiões agrícolas em expansão. O êxodo urbano, por conseguinte, reconfigura a demografia urbana e a dinâmica cultural, onde a vida rural emerge como uma temática celebrada e progressivamente incorporada.
Entretanto, o contraste entre o renascimento agropecuário e a estagnação industrial, embora marcante, suscita desafios complexos. A dependência excessiva de um único setor econômico expõe a nação a vulnerabilidades decorrentes das flutuações nos mercados internacionais e das variabilidades climáticas, destacando a necessidade premente de uma abordagem equilibrada para garantir a sustentabilidade a longo prazo. Nesse cenário de transformação, torna-se imperativo que as lideranças políticas e empresariais compreendam a necessidade de diversificar a matriz econômica e do investimento em inovação. O desafio subjacente não se resume a meras substituições de um setor por outro, mas sim à integração sinérgica das potencialidades do agronegócio e da indústria, capitalizando as virtudes distintas de cada um.
A busca por soluções sustentáveis figura como aspecto fundamental desse processo. O renascimento agropecuário deve ser orientado por práticas que promovam a preservação ambiental, a equidade social e do fomento ao desenvolvimento econômico. Tecnologias avançadas, notadamente na esfera da agricultura de precisão e métodos sustentáveis, apresentam-se como contribuições essenciais para aprimorar a eficiência do setor, garantindo que o crescimento não comprometa os recursos naturais cruciais para a continuidade do sucesso agropecuário.
Simultaneamente, é indispensável que o setor industrial reoriente sua abordagem, investindo vigorosamente em tecnologias de vanguarda, automação e aprimoramento da capacitação da mão de obra. A formação de parcerias entre os setores industrial e agropecuário surge como uma estratégia propícia para catalisar oportunidades de inovação, impulsionando ambas as esferas e consolidando a robustez da economia como um todo.
Em análise conclusiva, o Brasil está imerso em uma transformação significativa, na qual o setor agropecuário emerge como protagonista preponderante, influenciando não apenas as dinâmicas econômicas, mas também os aspectos culturais, políticos e sociais. Concomitantemente, uma indústria, outrora vigorosa, enfrenta desafios consideráveis ao buscar sua posição em um ambiente de transformações contínuas. O desafio central reside na conquista de um equilíbrio que permita a maximização dos benefícios decorrentes do renascimento agropecuário, ao mesmo tempo em que impõe a necessidade de revitalizar e redefinir o papel da industrialização no cenário nacional. O que exige uma visão estratégica e um comprometimento substancial. Assim, a interdependência entre o renascimento agropecuário e a estagnação industrial revela-se uma teia intricada, mas oferece perspectivas para uma transformação positiva. A habilidade de harmonizar esses dois pilares econômicos, sem dúvida, configurará não apenas o destino econômico do país, mas também sua identidade cultural e os contornos de sua sociedade ao longo das décadas subsequentes.
Prof. Dr. FRANCISCO VIANA CRUZ
É economista e professor do IFTO