A relação que já ia de ruim a pior, tornou-se tenebrosa com o mutirão dessa quarta-feira, 27, em que, após reunião com o governador Mauro Carlesse (PHS), deputados não só aprovaram todas as matérias questionadas pelos delegados da Polícia Civil, entre elas o polêmico Manual de Procedimentos, como também surpreenderam e retiraram da categoria a inamovibilidade prevista pela Constituição do Estado. Uma emenda assinada por nada menos do que 19 dos 24 parlamentares, num verdadeiro “tratoraço” sobre esses profissionais da Segurança Pública.
[bs-quote quote=”O Brasil precisa extirpar esse câncer, que não pode continuar em seu processo metastático, sugando bilhões de reais que deveriam ir para a saúde, segurança, educação e infraestrutura, num país, em pleno século 21, ainda imerso em profundas e históricas desigualdades sociais a serem superadas” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2018/02/CTAdemir60.jpg”][/bs-quote]
Essa mudança constitucional talvez tenha sido o maior golpe contra a categoria, uma vez que agora os delegados ficam sujeitos a transferência para as calendas gregas caso deixem algum coronel local ou regional insatisfeito por qualquer motivo. Como fazer operações policiais que firam interesses de autoridades sob essa total insegurança funcional?
Pior é que a retirada desse benefício conta com a chancela do Ministério Público Federal, numa Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) em que deixa mais evidente o ego ferido de Suas Excelências procuradores, promotores e juízes, por verem os colegas policiais tratados como iguais, do que um legítimo interesse em garantir condições efetivas para os delegados combaterem o crime.
Se há erros em operações, como foi o caso da prisão por engano do irmão do deputado estadual Amélio Cayres (SD), não se pode jogar a água com a criança dentro, como diziam os antigos. A coluna é crítica dessas operações pirotécnicas, sempre se colocou contra a condução coercitiva circense proibida num ato de bom senso do STF e vê o vazamento para imprensa de informações de uma mera coleta de provas como um verdadeiro estupro à presunção da inocência.
Mesmo o acompanhamento da imprensa, que chega aos locais alvos com câmeras em punho antes da Polícia, esta coluna encara como “liberdade para ter audiência”, não se trata de liberdade de imprensa. Nessas operações apenas se faz coleta de possíveis provas de supostos crimes. Isto é, numa operação não existe nada de concreto. Mas a imprensa está lá dando nomes, julgando e condenando, em códigos aparentemente neutros, mas que, por si só, trazem uma condenação que é eterna. Porque, ainda que a Justiça absolva o suspeito anos depois, ele será um corrupto por toda a vida. Isso é de uma violência absurda contra os direitos e garantias individuais, que devem sempre se sobrepor à “liberdade para ter audiência”.
Até aí, tudo bem. No entanto, por isso ou por qualquer outro motivo, não se deve impedir a investigação, seja pela antecipação de que a operação vai ocorrer, como passa a exigir o Manual de Procedimentos, ou por colocar o delegado em risco de ser transferido por ousar apurar possíveis crimes cometidos por autoridades.
A corrupção é um problema crônico e se tornou cultural na política brasileira. Por isso, precisa ser combatida com todo o rigor, com apoio da alta cúpula do Poder Executivo, Legislativo e Judiciário. Afinal, se não há o que temer por que fragilizar as condições de investigação?
O Brasil precisa extirpar esse câncer, que não pode continuar em seu processo metastático, sugando bilhões de reais que deveriam ir para a saúde, segurança, educação e infraestrutura, num país, em pleno século 21, ainda imerso em profundas e históricas desigualdades sociais a serem superadas. Também precisamos impedir que a política seja apenas um excelente negócio, em que se gasta duas ou três vezes mais para se eleger — ou comprar um mandato — do que a remuneração de quatro anos porque o retorno com as possibilidades de esquemas será até cem vezes maior.
Dessa forma, a condução da Polícia Civil pelo cabresto atenta contra a cidadania e vai contra todo o esforço do povo brasileiro para vencer a corrupção e moralizar a política.
As mudanças legais que ensejam o enfraquecimento da Polícia Civil representam a derrota de todo o povo tocantinense.
CT, Palmas, 28 de março de 2019.