Novamente vou nadar contra a maré e me posicionar contra uma proposta que tem apoio quase unânime entre a população e, sobretudo, políticos de mandato municipal, interessados em ganhar mais dois anos de poder. Acho um despropósito a unificação das eleições no Brasil, sob o único argumento de que será mais barato, esvaziando-se o significado político do processo eleitoral.
[bs-quote quote=”Como ficará a cabeça do cidadão ouvindo propostas dos mais diversos candidatos a presidente, governador e prefeito se sobrepondo, e de igual modo postulantes a senador, deputado federal, deputado estadual e vereador? Como discutir as questões municipais, estaduais e federais, tudo junto e misturado? Impossível” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2018/02/CTAdemir60.jpg”][/bs-quote]
Típico de uma época que não dá o devido valor ao bem supremo de uma sociedade, a democracia, e que tenta despolitizar a política como se isso fosse a saída para resolver os problemas da nação. E não é. A solução dos entraves do País só se encontrará via política, a boa política. Sem ela, os abismos brasileiros tendem a se aprofundar, porque o populismo se tornará mais presente com seu discurso e “soluções” fáceis e sentimentais, que vislumbram simplesmente o poder pelo poder. À esquerda e à direita.
O principal argumento para a unificação das eleições nacionais, estaduais e municipais num mesmo ano é a economia que o País fará. Outro, acessório, dos prefeitos, é que os processos eleitorais travam as gestões por conta das restrições impostas pela legislação, como para o caso de licitações, contratações e assinaturas de convênios.
Primeiro é importante partir do princípio do que é um processo eleitoral e porquê políticos passam pelo menos 45 dias conversando com os eleitores. O objetivo desse rito que se vê a cada dois anos é discutir propostas e perfis dos candidatos com o eleitorado, fazer compromisso de governo e de legislatura com o cidadão, discutir as demandas sociais.
Como isso será possível com várias eleições congêneres ao mesmo tempo? Como ficará a cabeça do cidadão ouvindo propostas dos mais diversos candidatos a presidente, governador e prefeito se sobrepondo, e de igual modo postulantes a senador, deputado federal, deputado estadual e vereador? Como discutir as questões municipais, estaduais e federais, tudo junto e misturado? Impossível. O debate será ainda mais raso, com claros prejuízos à democracia e com rebaixamento ainda maior da representação popular.
O outro argumento de que os processos eleitorais engessam a gestão só se justifica diante de um quadro de total falta de articulação e planejamento das diferentes instância de governo. Diga-se: planejamento é algo ainda abstrato e longínquos nas gestões públicas brasileiras, que se guiam por instintos sobretudo eleitoreiros.
Claro que precisamos reduzir a burocracia e encurtar os processos decisórios no campo público. Mas é uma luta de aperfeiçoamento das gestões que avança, lentamente, é verdade, mas há conquistas. Por isso, usar esse engessamento como argumento para a unificação das eleições é também muito raso, superficial.
Realmente há um custo que não é baixo para a realização das eleições e que seria reduzido com a unificação. No entanto, é importante considerar que esse gasto é fundamental para o exercício mais libertário numa sociedade, o direito de votar, de escolher os representantes responsáveis pelo nosso presente e futuro. Abrir mão de um amplo debate e banalizá-lo por um processo confuso nos remete à figura bíblica da venda de um privilégio sagrado por um prato de lentilha.
A democracia é realmente cara, mas fundamental para a nossa vida. Barato mesmo é a ditadura, e dela quero distância.
CT, Palmas, 28 de maio de 2019.