A comissão designada para apurar danos causados pelas aplicações de risco do Instituto de Previdência Social de Palmas (PreviPalmas) nos fundos Cais Mauá e Tercon colocou no rol de “principais responsáveis” pelos prejuízos “atuais e futuros”: o ex-prefeito de Palmas e candidato a governador, Carlos Amastha (PSB), o ex-presidente do PreviPalmas Max Fleury (DC); o ex-secretário municipal de Finanças Christian Zini; e o ex-diretor de investimento do órgão Fábio Costa Martins. Estas conclusões foram publicadas em relatórios de investimentos disponíveis no site da prefeitura.
Segundo os documentos, inicialmente foi proposta uma tomada de contas especial, entretanto, o Tribunal de Contas (TCE), ao ser consultado, afirmou ao conselho que o então presidente do PreviPalmas, Marcelo Alves, instituiu a medida “de maneira errada” e com “vícios na sua origem” que poderiam tornar todo o trabalho “inválido” e sem efeito legal. Diante deste cenário, a presidência da entidade, já a cargo de Carlos Spegiorin, decidiu realizar procedimento administrativo para depois enviar resultado a órgão competente para tomada de contas especial, conforme manual do TCE.
A comissão discorre no relatório que a apuração teve como ponto de partida o próprio PreviPalmas, com consultas às diretorias contábil, financeira, de investimentos e à assessoria jurídica, com posterior contato às instituições financeiras que receberam a autorização para transferir recursos da entidade aos fundos de risco. “Estas buscas se fizeram necessárias para identificar pessoas envolvidas no devido investimento, para que no futuro possa responsabilizar as mesmas por algum ato ilegal que possivelmente tenham corroborado ativamente ou solidariamente”, justifica.
- Clique para ler o relatório sobre o fundo Cais Mauá.
- Confira as considerações sobre a aplicação no fundo da Tercon.
Cais Mauá
Enviado ao presidente do PreviPalmas no dia 30 de julho, o relatório relacionado à aplicação no Cais Mauá também leva em consideração os fatos já apurados por comissão montada pelo Conselho Municipal de Previdência (CMP). Nesta primeira avaliação foi indicado que o diretor de investimento na época teria entregado parecer quanto a aplicação de R$ 30 milhões no fundo no mesmo dia [07/12/2017] em que foi acionado pela presidência do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), que, com o documento, teria aplicado o recurso “imediatamente”.
O próprio relatório de análise de investimento não teria sido conclusivo quanto ser favorável ou não a aplicação na Cais Mauá, entendeu o comissão da CMP. Além disso, o grupo confirmou que a administradora do fundo, sob o nome ICLA Trust, é a mesma NSG Capital que já tinha gerado prejuízo ao Instituto de Gestão Previdenciária do Estado (Igeprev). A própria análise do PreviPalmas sobre a aplicação teria sido feita de forma equivocada, já que aconteceu no processo de credenciamento, e não pela Comitê de Investimento, que teria deliberar em reuniões com atas e deliberações publicadas no Diário Oficial.
Apesar destes pontos questionáveis, a comissão do CMP destacou que o investimento foi confirmado no dia 7 de dezembro de 2017 com procedimentos que deveriam acontecer antes da aplicação sendo feitos posteriormente, como a solicitação de parecer jurídico, por parte da presidência, quanto ao credenciamento da gestora e administradora do fundo; o despacho de aprovação do presidente informando a conformidade com a política de investimentos. Até o anúncio de certidões vencidas das instituições teriam sido feitas depois dos R$ 30 milhões já estarem aplicados.
O relatório da comissão do CMP ainda apontou que, ao contrário do que foi alegado pelo presidente do PreviPalmas na época, a política de investimentos não foi respeitada, isto porque foi estabelecido que a carência da aplicação na Cais Mauá será de 12 anos, prorrogável por igual período. Entretanto, as diretrizes do PreviPalmas determinam que todas as aplicações com prazo para os recursos ficarem retidos deverão “obrigatoriamente” serem aprovadas pelo Conselho Municipal de Previdência.
A avaliação da comissão do CMP já tinha apontado que a aplicação de R$ 30 milhões também desobedeceu resolução do Banco Central que proíbe RPPS ter mais que 5% do patrimônio líquido do fundo. Com o investimento, o PreviPalmas já inciou desenquadrado, com mais de 15% da Cais Mauá. “Verificou-se realmente que o investimento não cumpriu o rito processual correto e nem seguiu as leis e normativas impostas”, comenta o novo relatório sobre aos pontos já elucidados pelo Conselho Municipal de Previdência.
Novos fatos
Neste novo levantamento sobre a aplicação a pedido da presidência, os membros designados – Maria Cristina Araújo, Wilanildo de Almeida e Kauwe Ueda – informam que oficiaram a Caixa Econômica Federal (CEF). A instituição financeira confirmou ter recebido autorização dos “responsáveis legais pelo instituto” a fazer o investimento de R$ 30 milhões, mas ao receber a resposta, a comissão considerou “fato relevante” o fato desta aprovação da aplicação ter ocorrido em data em que as instituições da Cais Mauá “não estavam credenciadas”. O relatório reforça ainda que o ofício apresentado pelo gerente da CEF não condiz com o encontrado no PreviPalmas. “Ou seja, estão divergindo”, anota.
“Estes fatos levam a crer que este ofício não saiu do PreviPalmas e sim de outro lugar, mas que foi assinado pelos gestores da época, Maxcilane Machado Fleury [presidente] e Christian Zini Amorim [secretário de Finanças], e que as ordens bancárias estão assinadas pelos dois mais Marineide Santana Pereira [diretora administrativa e financeira do PreviPalmas]”, comenta.
O relatório também afirma que as mudanças das nomenclaturas da administradora, custodiante e gestora do fundo não foram feitas na assembleia de cotistas, mas pelo administrador da Cais Mauá. “Ainda verificamos que no site da Comissão de Valores Mobiliários [CVM] não consta nenhuma aviso de mercado sobre o fundo ora em questão, não há anúncio de início de distribuição e nem de encerramento”, acrescenta.
Em relação ao PreviPalmas em si, nada neste sentido foi detectado. “Todos os regulamentos analisados falam que as distribuidoras entrariam em contato com os pretensos investidores e apresentariam na forma de um chamado de capital para subscrição, mas não encontramos em nenhum local estas comunicações entre os distribuidores e nosso instituto de previdência”, discorre. Apesar disto, o relatório aponta que Zini e Fleury assinaram ainda em fevereiro intenção de adquirir cotas do Cais Mauá.
A comissão ainda busca posicionamentos de membros do CMP e do Conselho Fiscal de Previdência (CFP) do instituto. “Ao analisarmos todas as atas de período de 2013 a 2018, constatamos que os conselheiros discorrem sobre a falta de respaldo dado a eles pelo PreviPalmas quanto pelos representantes do Executivo, pois eles estavam ali para fiscalizar, e como o órgão máximo de deliberação, teriam que ser ouvidos e acatado suas decisões”, comenta.
Outro ponto tocado no relatório foi uma das reivindicações do CMP e do CFP: a criação do comitê de investimentos. Apesar de ter sido acatado em julho do ano passado, tal medida foi tida como irregular porque os membros nomeados pela presidência não tinham certificação reconhecida no mercado financeiro e pela inexistência de um diretor.
Ainda segundo o relatório, depois de instituído, o tal comitê só publicou duas atas de suas deliberações. Após ser questionado, o grupo só veio se manifestar em março deste ano, mas com argumentações insatisfatórias. A situação acabou gerando a criação da comissão pelo CMP que apontou as irregularidades.
Neste relatório da comissão da presidência ainda trata das nomeações de Carlos Amastha, que, segundo alegam, fez indicações “políticas” e por “conveniência” para o instituto. “Verifica-se que os servidores ainda não tem o controle sobre o futuro dos recursos do PreviPalmas, pois até hoje continua sendo uma prerrogativa unilateral do prefeito municipal”, acrescenta.
Fundo da Tercon
O relatório da comissão em relação a aplicação de R$ 20 milhões na Tercon é datada de 28 de agosto e assinada desta vez somente por Wilanildo de Almeida e Kauwe Ueda. No documento é indicado que o modo para chegar-se a aplicação temerária foi semelhante com a da Cais Mauá, e alguns pontos citados na avaliação da primeira são repetidos neste segundo levantamento, como as nomeações políticas de Carlos Amastha, a demora na instalação e as impropriedades do comitê de investimentos e a reclamação de “falta de respaldo” aos membros do CMP e ao CFP.
Assim como no relatório relacionado a Cais Mauá, a comissão da presidência volta a recapitular as inconsistências já apontadas por grupo criado pela CMP para apurar irregularidades nas aplicações temerárias, do qual Wilanildo de Almeida e Kauwe Ueda foram membros. Em relação à Tercon, o primeiro erro foi encontrado no processo de credenciamento, já que apenas o gestor foi cadastrado; ou seja, a administradora do fundo não foi credenciada conforme exigido.
Na análise dos documentos para o credenciamento, já havia sido apontado a falta da cópia do demonstrativo contábil que comprove a solidez da situação econômica e financeira da instituição alvo do aporte; certidão negativa expedida pela CEF para comprovar inexistência de débitos junto ao fundo de garantia por tempo de serviço (FGTS), e outra para demonstrar nenhuma pendência também com a Justiça do Trabalho.
Outro questionamento é um parecer do diretor de investimentos pela substituição de uma aplicação em títulos públicos já em andamento para o fundo da Tercon. Assim como na Cais Mauá, a análise do investimento também aconteceu no processo de credenciamento, e não pelo Comitê de Investimento, que teria deliberar em reuniões com atas e deliberações publicadas no Diário Oficial. Mesmo com estas inconstâncias, a assessoria jurídica do PreviPalmas garantiu que toda a documentação tinha sido entregue e nada havia de irregular.
Novamente como a Cais Mauá, o investimento na Tercon também estabeleceu prazo de carência de quatro anos, mas apesar disto, tal decisão não foi discutida e aprovada pelo CMP, conforme exige as diretrizes do instituto. O PreviPalmas também começou desenquadrado nesta aplicação, e com as duas injeções de R$ 10 milhões chegou a ter 46,27% do fundo, quando o permitido pelo Banco Central ao RPPS é ter no máximo 5%.
Novos pontos
Em resposta aos pedidos da comissão da presidência, os documentos enviados pela Caixa Econômica Federal teriam indicado que a primeira aplicação no fundo Tercon de R$ 10 milhões foi feita sem documento do PreviPalmas que “motivasse a transferência”, enquanto a segunda contém ofício assinado por Max Fleury e Christian Zini permitindo o investimento. “O que achamos estranho é que o ofício esta datado de 16 de outubro e a transferência ocorreu somente no dia 7 de novembro”, disse sobre documento de anuência dos gestores.
No caso em que houve ofício, a comissão constatou que o mesmo não condiz com o documento de mesmo número que consta no insituto de previdência da Capital. “Estes fatos levam a crer que este ofício não saiu do PreviPalmas e sim de outro lugar”, repete a comissão. O relatório ainda questiona a velocidade dos procedimentos que resultaram no investimento na Tercon.
“O que pudemos ver também foi a celeridade que foi feito o trâmite de credenciamento e aplicação, pois suposto credenciamento foi finalizado no dia 13 de setembro de 2017 e a primeira aplicação já foi feita dois dias depois; ao contrário do segundo investimento, que teve um prazo de vinte e dois dias entre o ofício e a efetiva transferência”, acrescenta.
Entretanto, o segundo investimento é visto com “estranheza” pela comissão porque o PreviPalmas já estava desenquadrado desde o primeiro aporte e questionamentos em relação a isto eram feitos por conselheiros e servidores desde dezembro do ano passado. “Mesmo assim os gestores tentaram investir em fevereiro no mesmo fundo”, reforça.
A comissão ainda relata ter acionado o fundo por ter ofício da autoria da gestora em que ela se compromete a devolver a diferença da aplicação se o PreviPalmas continuasse desenquadrado. Entretanto, em nova manifestação a Tercon afirmou que a devolução de recursos não seria possível porque se fizesse para o instituto a brecha abrir para todos os cotistas. Ainda alegaram ser de responsabilidade do próprio RPPS verificar os limites da legislação vigente.
Principais responsáveis
Na conclusão dos dois relatórios, a comissão da presidência afirma que houve falhas em relação a legalidade nas aplicações propriamente ditas – Cais Mauá e Tercon – e nos trâmites processuais, bem como houve irregularidades em relação à publicidade. Nos dois casos o grupo responsabiliza as mesmas pessoas e faz a mesma anotação em relação a elas.
“Assim, é entendimento desta comissão que os principais responsáveis pela causa dos atuais prejuízos e dos futuros são o ex-prefeito Carlos Amastha, por ser o responsável direto pela nomeação de todos os outros gestores envolvidos no eventual investimento; o ex-secretário de Finanças Christan Zini, que sempre assinou em conjunto com o ex-presidente do instituto Maxcilene Fleury; e o ex-diretor de investimentos Fábio Costa Martins, que analisou e assumiu o risco de investir sem seguir as normativas do MPS e da política de investimentos que foi aprovado pelo conselho municipal do PreviPalmas”, defende os dois relatórios, tanto o sobre a aplicação na Cais Mauá quanto na da Tercon.
Além destes agentes, a comissão afirma que deverão responder subsidiariamente os outros envolvidos, citando a responsável pela assessoria jurídica e os membros do comitê de investimento. A primeira por ter dado pareceres sem o embasamento legal, e os demais por não terem conhecimento e não se absterem da aplicação temerária e sequer alertarem o CMP. O relatório ainda quer que o município deve ser responsabilizado pelos prejuízos “independente de quem esteja no cargo”.
“Sem prejuízos”
Agora candidato ao governo do Tocantins, o ex-prefeito de Palmas Carlos Amastha se manifestou sobre o conteúdo do relatório. O pessebista se defendeu reforçando que o PreviPalmas se trata de órgão autônomo, tendo o presidente como “autoridade máxima”, sendo assim, não teria subscrito qualquer documento referente ao mesmo.
Amastha ainda afirma “não ter havido prejuízo nós investimentos”, mas destaca que mesmo assim demitiu o diretor financeiro e o presidente na época, determinou tomada de contas e defendeu a propositura de ação judicial contra os fundos.
Leia abaixo a íntegra da manifestação de Carlos Amastha:
“O PREVIPALMAS é um órgão autônomo administrativa e financeiramente, cuja autoridade máxima é o presidente do instituto.
O prefeito não pratica atos e não subscreve nenhum documento inerente aos investimentos do instituto, cabendo tais atribuições respectivamente ao conselho e presidência.
Assim que tomou conhecimento pela imprensa das impropriedades na tramitação interna no PREVIPALMAS, apesar de não ter havido prejuízo nos investimentos, ainda assim o prefeito Carlos Amastha imediatamente demitiu o diretor financeiro e presidente, determinando a instauração de Tomada de Contas e a propositura de ação judicial contra os fundos, nos termos da legislação nacional e a jurisprudência de todos os Tribunais do Brasil”