Uma recentíssima decisão do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Norte, pela qual considerou propaganda eleitoral extemporânea, condenando, por conseguinte, determinada vereadora e pré-candidata à multa de R$ 5.000,00, pelo ato de distribuição de sabão e álcool gel, causou alvoroço no meio jurídico-eleitoral.
No caso em apreço, a pré-candidata distribuiu “kits” com álcool em gel, sabão líquido e um panfleto com orientações sobre a prevenção de contágio do novo coronavírus, no qual há os dizeres: “acompanhem mais dicas: (símbolo do WhatsApp); (símbolo do Twitter) @nildaprofessora”, sem a identificação do pedido de votos de forma explícita.
Nesse diapasão, de plano surgiu o questionamento acerca do possível acerto ou desacerto da referida decisão, uma vez que não houve o pedido explícito de votos.
A pré-candidata distribuiu “kits” com álcool em gel, sabão líquido e um panfleto com orientações sobre a prevenção de contágio do novo coronavírus, sendo que o referido ato, embora não tenha pedido explícito de votos, foi considerado como distribuição de brindes
LEANDRO MANZANO SORROCHE
Pois bem. Com o advento da Lei nº 13.165/2015, alterou-se o artigo 36-A da Lei 9.504/97, criando-se a figura do pré-candidato, de modo a possibilitá-lo, antes mesmo do início da propaganda eleitoral, a menção explicita de sua pretensa candidatura, bem como a exaltação de suas qualidades pessoais, podendo ter cobertura dos meios de comunicação social, vedando-se, tão somente, o pedido explicito de votos.
Além da referida novidade legislativa, permaneceram outras possibilidades de atos, os quais não caracterizam propaganda antecipada, tais como: participação em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na internet, podendo expor também suas plataformas políticas, realizar seminários e congressos para tratar dos processos eleitorais e alianças partidárias, divulgar posicionamento pessoal sobre questões políticas, entre outros.
Sendo assim, doravante, os pretensos candidatos ao pleito vindouro poderão eclodir um debate democrático através de manifestações expressas das suas pré-candidaturas, além de conferir relevo de suas qualidades pessoais, sem que com isso incorram em propaganda eleitoral extemporânea, a qual tem como penalidade multa que pode variar entre R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais).
Não obstante isso, desde o início da vigência da legislação, possibilitando atos de pré-campanha, surgiram perante o Tribunal Superior Eleitoral inúmeros questionamentos do alcance e limites das referidas regras, isso ante os casos concretos que se aportavam para análise.
Dentre os julgados, cita-se o Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n° 9-24. 2016.6.26.0242, Várzea Paulista, São Paulo, em que se fixou os parâmetros pelos quais devem ser observados na identificação dos limites legais para a propaganda no período pré-eleitoral.
Em síntese, no referido precedente jurisprudencial, foram criadas as seguintes balizas para verificar-se sobre a ocorrência de propaganda antecipada.
Primeiro passo é a análise se a mensagem possui ou não conteúdo eleitoral, de modo que os atos publicitários não eleitorais, assim entendidos aqueles sem qualquer conteúdo direta ou indiretamente relacionados com a disputa, consistem em “indiferentes eleitorais”, situando-se, portanto, fora da alçada da Justiça Especializada.
Após isso, conformando que se trata de conteúdo eleitoral, aprecia-se se há pedido explícito de votos, sendo, pois, positiva a resposta, independente da forma utilizada, caracterizada está a propaganda eleitoral extemporânea.
Por derradeiro, ainda que não tenha pedido de votos de forma explícita, necessário seguir para a terceira e última etapa, qual seja, se a forma utilizada é proscrita durante o período oficial de propaganda eleitoral.
Destarte, ainda que o conteúdo não possua pedido explícito de votos, será caracterizada propaganda eleitoral prematura se a forma em que se exterioriza a mensagem for proibida na ocasião da propaganda eleitoral, podendo citar como exemplo o outdoor.
Assim sendo, diante da fixação desses critérios pelo Tribunal Superior Eleitoral, isso com o escopo da identificação de observância dos limites legais para a propaganda no período pré-eleitoral é que o Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Norte julgou procedente a representação por propaganda eleitoral extemporânea da vereadora Raimunda Nilda da Silva Cruz.
Conforme mencionado alhures, a pré-candidata distribuiu “kits” com álcool em gel, sabão líquido e um panfleto com orientações sobre a prevenção de contágio do novo coronavírus, sendo que o referido ato, embora não tenha pedido explícito de votos, foi considerado como distribuição de brindes, o que encontra vedação no ordenamento jurídico no período oficial de campanha, consoante previsto no artigo 39, §6º da Lei 9.504/97.
Ressalta-se que, no momento em que proferiram seus votos, membros da Corte Regional deixaram assente que somente incidiu a caracterização da propaganda eleitoral antecipada, pelo fato da vereadora pessoalmente ter realizado a distribuição, bem como a vinculação do seu nome no folheto anexo aos brindes.
Diante do exposto, conquanto a decisão tenha causado burburinho entre aqueles que militam no Direito Eleitoral, bem como aos pré-candidatos, o certo é que o Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Norte decidiu estritamente com fulcro nos critérios estabelecidos pelo próprio Tribunal Superior Eleitoral.
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LEANDRO MANZANO SORROCHE
É advogado, vice-presidente do Instituto de Direito Eleitoral do Tocantins, pós-graduado em Direito Eleitoral, Público, Tributário e Estado de Direito e combate à corrupção
leandromanzano@gmail.com