O autor da célebre frase Toute nation a le gouvernement qu’elle mérite (“Toda nação tem o governo que merece”), Conde Joseph-Marie de Maistre foi um escritor, filósofo, diplomata, advogado e um dos proponentes mais influentes do pensamento contra revolucionário ultra montanista no período imediatamente seguinte à Revolução Francesa de 1789. O nobre pensador realça seu descontentamento com a queda da monarquia francesa e a instituição do modelo representativo de escolha popular implementada no pós Revolução.
Em trabalho pretérito publicado neste site de notícia alertamos sobre os tumultos e confusões que originariam de uma eleição direta suplementar, de igual forma apontamos e registramos as consequências da aplicação da lei que disciplina o tema, bem como o momento em que se deu a decisão judicial que a concebeu. Hoje, com o processo eleitoral em curso e no segundo turno, nos deparamos com uma avalanche de informações desencontradas, ora falsas (fake news) amplificadas pelas redes sociais. Onde esperava-se da eleição direta a legitimidade, deparou-se com a maior abstenção (mais de 43%) na história do Estado do Tocantins, provocando a desmotivação da população em geral, que já não anda recentemente animados com a representação política, seja pelos casos sistematizados de corrupção, seja pela ineficiência na gestão dos serviços públicos.
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O processo eleitoral se transformou e se reduziu, previsivelmente, numa onda de denuncismo, com vistas a tumultuar a campanha entre os candidatos, promovendo ainda mais o desânimo social. Na ultima semana o governo interino sofreu uma ação ostensiva por parte da Justiça Eleitoral, envolvendo grande força policial com busca e apreensão de documentos e todos os requintes de uma investigação minuciosa. Justiça e policia realizando seu trabalho não nos causa nenhuma estranheza, mas nos leva a refletir: Afinal o governo seja ele interino ou não, deve ou não promover a gestão publica na plenitude? Há limites de atuação dos governos na tomada de decisões? As decisões do governo são ou não são necessárias ao bem estar social? Até que
ponto é possível discernir se ação governamental é legitima ou meramente eleitoreira?
Sabe-se que toda e qualquer ação de governo é legitima, pois é devidamente autorizada pela sociedade e as leis, e que, naturalmente toda ação tem consequências politicas que impactam na opinião publica e estimula o senso avaliativo social, que por sua vez, estabelece o reflexo eleitoral. Daí nasce o engodo de um moralismo hipócrita, onde a pretexto de promover o equilíbrio e transparência nas eleições surgem pedidos (Ministério Publico, partidos, coligações, candidatos, entidades) de toda ordem, no sentido de travar a atuação governamental e inibir um suposto beneficio de caráter
eleitoral.
Mas afinal opinião publica positiva e a sociedade satisfeita não seria o objetivo final da administração publica? E que por reflexo seria naturalmente a aprovação nas urnas? Penso que se a ideia adequada for impedir o governo de governar, a essência se desfaz. Imagino que já não é novidade pra população e pros órgãos fiscalizadores que a maioria das ações positivas ocorrem no ano eleitoral, ora pela natureza orçamentária que se viabiliza na segunda metade dos mandatos, seja pelo oportunismo da reeleição. Contudo, há que se levar em conta que o povo em geral, na atualidade, tem a sua disposição mais ferramentas de informação, o que proporciona maior clareza e discernimento na hora de avaliar seus governantes, mitigando a indução. Pois, se os órgãos fiscalizadores arrogarem pra si a detenção da consciência popular absoluta, estariam intitulando e ratificando que o povo brasileiro é de extrema ignorância, incapazes da percepção eleitoral, sendo necessário um tutor permanente pra decidir em seu lugar.
Por outro lado, talvez seja isso mesmo, talvez seja correto e necessários que as instituições devam decidir o nosso destino, pois quando o eleitor é chamado a participar por meio do voto, ocorre a falta de critério, a troca de voto por beneficio direto, a venda deliberada do voto, enfim, elegem-se corruptos de forma consciente e ainda cobram a comissão antecipada. Daí fica quase que programado os resultados futuros quais sejam: cassação de mandato no quarto ano, eleição direta suplementar com direito a dois turnos, governo interino, campanha eleitoral conturbada, administração travada, gasto publico com a realização processo eleitoral, corrida pelo poder, antecipação de campanha, movimentação e sobrecarga da estrutura judiciária, paralisação dos serviços públicos gerados pela instabilidade, a usurpação da consciência popular e tudo de ruim que acompanha toda e qualquer escolha equivocada.
Não defendendo em hipótese alguma tal possibilidade, mas ilustrando nosso raciocínio sobre legitimidade e consciência popular, citemos aqui o caso do Ex-presidente Lula, mesmo preso e condenado, ainda configura como um dos lideres nas pesquisas presidenciais, grande influenciador no comportamento do eleitorado em todo Brasil e ainda determinante na permanência e desistência de certos pré candidatos. Nesse contexto, surge o paradoxo da legitimidade, de um lado as Instituições fiscalizadoras agem no sentido de promover justiça, impondo a responsabilidade aos que transgridam a lei, de outro lado o povo que manifesta a vontade de ter um governante independente de sua conduta moral ou lícita. Em quais dos casos reside o espirito do real Estado Democrático de Direito? Na garantia das Leis concebidas pelo povo e aplicada pelas instituições ou pela liberdade desse povo de escolha? Assim, remete-se a conclusão logica de que o povo brasileiro e por conseguinte, o povo tocantinense tem sofrido diversos processos de inconstância e instabilidade politica dado critério ou a falta deste nas escolhas que tem feito, reafirmando a expressão de que literalmente tem-se um governo que merece.
RAUCIL APARECIDO
É professor universitário e mestre em Direito Constitucional
professorraucil@gmail.com