O ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello se defendeu nesta quarta-feira, 19, na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado sobre a Covid-19 e disse que o Ministério da Saúde “respondeu por várias vezes” a Pfizer. A informação contradiz os depoimentos do ex-presidente da Pfizer Brasil Carlos Murillo e do ex-secretário de Comunicação da Presidência Fabio Wajngarten, que afirmam que membros do alto escalão do governo federal, incluindo o Ministério da Saúde, ficaram cerca de dois meses sem responder uma carta que reiterava as propostas enviadas pela empresa em agosto.
Questionado por detalhes pelo relator da CPI, Renan Calheiros (MDB/AL), e até pelo presidente Omar Aziz (PSD/AM), o ex-ministro explicou a sua visão. Pazuello confirmou que “a prospecção da Pfizer começou em abril ou maio” e ressaltou que existiam “cinco cláusulas assustadoras, naquele momento”. Entre os pontos citados pelo ex-ministro, estavam a “isenção completa de processos por efeitos colaterais, sem multas para entregas e a assinatura do próprio presidente da República”, algo que “na primeira vez que ouvi isso, achei estranho”.
A fala contradiz novamente Murillo, que ressaltou em depoimento que as condições apresentadas ao Brasil eram exatamente as mesmas dos contratos firmados em todos os países do mundo.
Pazuello ainda afirmou que os órgãos de controle nacionais não recomendaram a assinatura do memorando com a Pfizer, mas que foi assinado mesmo assim. No entanto, todas as instituições citadas enviaram notas para senadores em que informam que não vetaram o acordo.
Pressionado por Calheiros sobre os motivos que levaram o governo a demorar para apresentar um projeto de lei para solucionar os entraves, o ex-ministro disse que foi uma questão técnica.
Ao ser pressionado sobre o assunto, Aziz interrompeu os questionamentos de Calheiros e questionou, então, se a farmacêutica e Wajngarten mentiram.
Pazuello se comprometeu a dar todas as documentações sobre o tema, mas depois voltou atrás e disse que a CPI precisa pedir diretamente ao Ministério da Saúde.
O clima esquentou após o ex-ministro dizer que “Renan deveria saber” que as negociações não são feitas diretamente pelo titular da pasta, mas sim por sua equipe. Aziz interrompeu novamente e disse que Pazuello não tem o direito de questionar as perguntas mesmo que repetidas.
Ainda sobre a carta e os processos para compra, Pazuello informou que ele próprio informava o presidente Jair Bolsonaro sobre as negociações.
Durante o depoimento, o ex-ministro blindou o presidente e destacou que todas as decisões foram tomadas por ele e que, em nenhum momento, Bolsonaro “desautorizou ou mandou adicionar” qualquer regra, medida ou orientação no Ministério da Saúde.
Butantan e Covax
Ainda na estratégica de blindar Bolsonaro, Pazuello eliminou qualquer responsabilidade sobre a compra da CoronaVac do presidente, contradizendo inclusive declarações públicas do mandatário.
“Nunca o presidente me fez desfazer o contrato com o Butantan. Nunca falou para que eu não comprasse um ‘ai’ do Butantan”, repetiu por diversas vezes.
Questionado por Calheiros sobre a postagem no Facebook em que Bolsonaro afirmou a um seguidor que não compraria a “vacina chinesa” e que revogaria o contrato, Pazuello diz que Bolsonaro “nunca efetuou essa ordem”.
Repetindo por diversas vezes que não recebeu ordens, o ex-ministro ainda destacou que não revogou o memorando de compra – contradizendo, novamente, sua própria fala no fim do ano passado.
Já sobre o consórcio Covax Facility, Calheiros lembrou que o ex-chanceler Ernesto Araújo disse que foi decisão do Ministério da Saúde a opção por comprar vacinas anti-Covid para apenas 10% da população – e não os 50% que poderia solicitar.
Segundo Pazuello, as negociações com a Covax – liderada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) – “começaram nebulosas, com um preço inicial de US$ 40 a dose e sem a garantia de fornecimento”. Pressionado por Calheiros, o ex-ministro ressaltou que a opção pelos 10% foi porque houve preocupação “em assumir um grau de recursos altíssimo sem a garantia de entrega”. “42 milhões de doses era o máximo o risco. Estar presente no consórcio era o mais importante e tínhamos a opção de comprar mais. Optei pelos 10% porque não havia firmeza no processo para colocar tantos recursos”
Informação errada e mentirosa
Senadores rebateram a fala do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, que disse só ter tomado conhecimento dos riscos de desabastecimento de oxigênio em Manaus na noite de 10 de janeiro. E que a falta de cilindros no estado só teria durado três dias. A discussão sobre o colapso no fornecimento de oxigênio para os pacientes de covid-19 no Amazonas ocorreu durante o depoimento de Pazuello à CPI da Pandemia.
O senador Eduardo Braga (MDB-AM) disse ser necessário corrigir o dado, sob pena de estarem “sendo coniventes com uma informação errada e — desculpe a expressão — mentirosa”. “Presidente, é preciso dizer ao povo brasileiro: não faltou oxigênio no Amazonas apenas três dias, pelo amor de Deus. Ministro Pazuello, pelo amor de Deus. Faltou oxigênio na cidade de Manaus mais de 20 dias. É só ver o número de mortos. É só ver o desespero das pessoas tentando chegar ao oxigênio. Nós tivemos pico de morte no dia 30 de janeiro. Sabe quando chegou a carga de oxigênio que o senhor mandou do Ministério da Saúde para Manaus? Do dia 24 para o dia 25”, disse Eduardo Braga.
Braga questionou ainda por que o governo teria deixado passar 10 dias, com média diária de mortes de 200 pessoas, e não se empenhou para que a carga de oxigênio oriunda da Venezuela chegasse ao povo amazonense. Ele lembrou que um avião norte-americano estava à disposição do Brasil, mas não foi acionado. “Foram 2 mil amazonenses que morreram. Nós poderíamos ter colocado aquele oxigênio, ministro. E o que nós queremos saber é o seguinte: Faltou dinheiro ao governo do Estado para fazer isso? Faltou vontade política do governo federal em fazer isso? E por que que não fez? Por que que não deu as informações ao ex-ministro Ernesto Araújo [das Relações Exteriores] para que o avião dos Estados Unidos pudesse ter ido à Venezuela buscar o oxigênio e levar para o Amazonas, para salvar vidas? É isso que o povo brasileiro quer saber.”
Inquérito
O senador Humberto Costa (PT-PE) informou que a CPI teve acesso a inquérito do Ministério Público sobre o caso de Manaus, segundo o qual o Ministério da Saúde foi informado da iminência de que haveria falta de oxigênio no dia 8 de janeiro. Pazuello negou diversas vezes, ao longo do depoimento, ter sido informado que faltaria oxigênio na capital do Amazonas. O ex-ministro da Saúde também negou ter sido informado sobre o avião colocado à disposição pelo governo dos Estados Unidos.
Logo após à falta de Humberto Costa, o presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), disse que Pazuello, protegido por habeas corpus preventivo, não precisaria responder a questões relacionadas ao inquérito, que também está sob sigilo, o que voltou a gerar polêmica entre os parlamentares. “Acho que a gente desrespeitar uma decisão que protege o sigilo do processo, nós estaremos indo no caminho errado. Por isso estou dizendo a Vossa Excelência que não precisa responder, porque essa informação é no processo sob sigilo”, disse Omar.
Senadores governistas como Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) e Marcos Rogério (DEM-RO), e da oposição, como Randolfe Rodrigues (Rede-AP), disseram que Pazuello poderia falar sobre a situação em Manaus. Flávio argumentou que a informação seria “praticamente pública”, enquanto Marcos Rogério alegou que quem não poderiam falar, por causa do caráter sigiloso do assunto, seriam os senadores.
Mais tarde, durante a intervenção da senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), que apresentou documento do próprio Ministério da Saúde sobre a oferta do uso do avião norte-americano para transportar oxigênio a Manaus, Pazuello recebeu orientação do representante da Advocacia-Geral da União (AGU) para manter silêncio sobre o assunto.
Ida a Manaus
Ao ser questionado pelo relator da CPI, senador Renan Calheiros, sobre quais medidas foram tomadas pelo ministério após tomar conhecimento da iminente falta de oxigênio, Pazuello disse que já estava com todos os secretários do ministério no estado quando soube do problema. E que, logo após ter se reunido com representantes da empresa White Martins, que fabrica os cilindros de oxigênio, ordenou a abertura do Centro Integrado de Coordenação e Controle com o estado, o município e as Forças Armadas, possibilitando a chegada dos cilindros de oxigênio em 12 de janeiro.
“Estava em Manaus, com a minha equipe. A gente já vinha acompanhando o assunto de Manaus, não havia a discussão ainda conosco sobre oxigênio, mas havia uma curva de contaminação alta, havia um colapso nos hospitais. E, na minha interpretação, como ministro à época, eu precisava avançar para lá o meu gabinete com meus secretários, para poder de lá tomar as decisões imediatas e resolver o problema, ajudar a resolver o problema e não deixar acontecer uma catástrofe”, respondeu Pazuello.
Para Omar Aziz, houve “uma série de equívocos e erros”, tanto por parte do governo do estado, como do Ministério das Relações Exteriores que, segundo afirmou, “foi incapaz de dar um telefonema para trazer de avião oxigênio da Venezuela”. (Da Ansa e Agência Senado)