O fato marcante que movimentou o universo político no feriado de 21 de abril foi a concessão de Indulto ao Deputado Daniel Silveira. Quase como um gatilho armado, foi disparado o decreto imediatamente à decisão de condenação por parte do Supremo Tribunal Federal, dado a forma repentina com qual foi editado o decreto, somado ao momento político que vive o país e o ano eleitoral, transformaram o ato eminentemente constitucional em objeto de discussão partidária.
O indulto individual, também chamado de Graça ou Perdão Presidencial, é instituto do direito, disposto na Constituição que representa a clemência da nação, exercida pelo Presidente da República , em relação a um de seus indivíduos pela prática de crimes. De forma prática, pode-se dizer que é o próprio povo perdoando do pagamento de pena por crime praticado por um dos seus .
Para melhor compreensão, podemos traduzir que quando uma sociedade classifica um ato como intolerável, ela o elege como crime, tipificando-o e atribuindo-lhe uma pena, entretanto, essa intolerância é gradativa, quanto mais reprovável o ato, maior é a pena aos que o pratica. De forma inversa caminha o perdão, quanto menor a gravidade, mais suscetível é a sua ocorrência. Na Legislação brasileira , há crimes, que por sua gravidade, estão excluídos da possibilidade de perdão daqueles que os praticaram, dado o grau de intolerância social contido no ato. Por outro lado, os crimes de menor gravidade são passíveis de perdão.
Partindo do raciocínio acima esboçado, quando o Presidente da República concede o indulto, ele o faz em nome do povo brasileiro, logo, a condição de Chefe de Estado. E é esse ponto que nos impulsionou a proposta deste formulado. Desde a edição do Decreto Presidencial de 21 de abril de 2022, diversos juristas se dividem sobre sua constitucionalidade, onde os pontos mais debatidos são a pessoalidade e a formalidade. Debrucemos sobre esses dois pontos:
Quanto a pessoalidade, entendemos que é precário o debate, visto que o instituto do Indulto individual é por excelência pessoal, o perdão inegavelmente é concedido a pessoa especifica, tal pessoalidade não pode ser confundida com o principio que rege a Administração Pública disposto no artigo 37 da Constituição, pois estes limitam os atos do Presidente da República no exercício da função de Chefe de Governo, enquanto aquela está nas atribuições de Chefe de Estado. A exemplo de quando o Presidente da Republica indica integrantes dos Tribunais Superiores, ele o faz como Chefe de Estado, essa condição o faz líder da supremacia popular, prerrogativa restrita de legitimar a soberania do povo, logo, a pessoa indicada é especifica, não há que se questionar as relações pessoais com quem quer que seja, bastando, tão somente, o cumprimento dos requisitos inerentes ao cargo. Nessa linha, ao nosso ver, não há que se falar em desvio de finalidade, por conta das relações pessoais, pois se assim fosse, desviado da finalidade estaria a composição dos integrantes da própria Corte Suprema.
Quanto à formalidade, questiona-se o momento do decreto, onde sugere-se que deveria aguardar o trânsito em julgado. Aqui, mesmo sendo objeto de discussão jurídica, o aspecto formal não pode suplantar em absoluto o aspecto material. Tratando em especifico o caso Deputado Federal Daniel Silveira, sua condenação foi decretada pela Suprema Corte, os poucos recursos a que tem direito, em nada mudará sua situação, seja pela ausência de Corte Superior reformadora, seja pelos motivos da condenação (ofensa a integrantes da Corte Suprema) ou seja pelo placar (10 votos a 1) a que foi submetido, no sistema jurisdicional brasileiro, qualquer mudança nesse cenário nos remeteria ao campo da metafísica, do sobrenatural, do milagre.
A tempos debatemos em nossos artigos a deficiência na formação política do povo brasileiro, independendo da instrução, seja governo ou governados, há uma grave redução da percepção política por parte da população em geral. Se imaginarmos por um momento que o indulto concedido ao Deputado Federal Daniel Silveira, fosse a outra pessoa, que ano não fosse eleitoral e que o Presidente não fosse Jair Bolsonaro, certamente não teria gerado tanta polêmica e resistência. Mas o que esperar de uma nação que depois de 34 anos da redemocratização, com mais de 240 milhões de pessoas, reduz-se à mediocridade de debater apenas 2 opções (Bolsonaro e Lula) pro comando do país?
Todas as características que englobam o caso do Deputado Federal Daniel Silveira reflete a fragilidade das instituições brasileiras, poderes constituídos com a missão de conduzir a nação minimizados em rivalidade pessoal, disputa infantil pelo poder, birra institucional, vingança sistematizada , típico das brigas de compadres, situação que de forma vergonhosa desvirtua a nobreza na qual deve está revestida toda autoridade pública. A nação se encontra divida por aqueles que tem a missão institucional de uni-la.
Portanto, o indulto é instituto constitucional, adotado em nações civilizadas, atribuído ao Chefe de Estado, que em nome do povo, concede perdão a indivíduos desse mesmo povo, não há nada de extraordinário, não há nada de estranho, não há nada de imoral, não há nada de especial. Entretanto, no Brasil os mais altos integrantes dos Poderes Constituídos (Legislativo, Executivo e Judiciário) se ocupam e se atacam colocando no centro das discussões nacionais tal assunto, por mera vaidade, a insensatez que paralisa a nação, divide o povo, obstrui das decisões e impõe o fardo da maquina publica improdutiva.
RAUCIL APARECIDO
É professor universitário e mestre em Direito Constitucional
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