Os truqueiros sabem muito bem o que é ter um zap e um sete copas nas mãos. Basicamente, significa jogo ganho. O truco sempre foi uma diversão em família. Aprendi com meu pai e tios, desenvolvi as habilidades no ensino médio, aperfeiçoei nos intervalos da Faculdade de Jornalismo e fiz o mestrado nas rodas das noites de sexta-feira, nos bares para onde íamos após o fechamento do jornal. Por tantos anos que passou a fazer parte do expediente semanal.
Agora me aposentei. Faz muito tempo que não jogo. Acho que a última vez foi com meu pai e meus filhos — claro, a tradição, que começou bem antes do meu velho, seguirá com a nossa descendência —, pouco mais de um ano antes de seu Heitor voltar ao plano espiritual em 2015. Depois não ocupei mais lugar numa roda de truco. Mas é igual andar de bicicleta. Não se esquece.
Não se pode entregar todo o arsenal já na entrada. Se tem um casal maior — o zap e o sete copas —, é preciso preparar a armadilha. Afinal, os três pontos da rodada estão garantidos. O que se busca é ampliar essa conquista.
Para isso, é preciso persuadir os adversários de que não se tem nada em mãos e torcer para que eles contem com algo que os deixem seguros a trucar ao final da rodada.
Antes, lógico, seu parceiro e você precisam saber da munição que ambos carregam para não baterem cabeça. Se, de cara, jogam uma carta grande à mesa, assustam os patos. Os oponentes precisam estar convencidos de que possuem o melhor no jogo. Assim, a piscada do zap e o levantar das sobrancelhas para noticiar o sete copas devem ser muito sutis. Não espantem as lebres.
Descartem qualquer coisa à mesa, com semblante de derrotados. Esse ardil envolve não só uma carta de pouco valor, mas também todo um teatro: o desânimo no rosto, um desejo fingido de querer entregar logo aquela mão. Se os atores forem canastrões, os adversários sacarão a arapuca a poucos metros, ou minutos, e fugirão rapidinho.
Melhor ainda se nas mãos eles carregam um sete ouro e uma espadilha. Tende a ser o crime perfeito. A primeira rodada precisa ser deles. A emboscada fica um tanto mais dissimulada se abrirmos com algo não tão desprezível, mas mediano, como um ás ou um 2 — é óbvio que não podem ser manilha. Os rivais usarão parte de sua boa munição para começar o jogo em vantagem. Possivelmente com uma carta do casal menor — o sete ouro ou a espadilha.
Se você e seu parceiro foram bons atores, os adversários voltarão à segunda rodada trucando. Aí é hora derrubar a mesa e devolver um “seis” à toda garganta na cara dos patos, que só então perceberão que caíram numa arapuca.
Se a fama de vocês à mesa de truco não for das melhores, de blefadores contumazes, com um sete copas em mãos, é perigoso os bestas pagarem para ver o que será colocado à mesa. A festa aí será geral, e dá-lhe cerveja canela de pedreiro para comemorar.
Saudades demais daquela época, tanto que esqueci de entrar no assunto da crônica, que foi o que me levou a pensar no truco. O senador Eduardo Gomes (MDB) na liderança do governo Jair Bolsonaro no Congresso e agora o ex-deputado federal César Halum como secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, é como se iniciassem uma partida de cartas representando o Tocantins com um zap e sete copas. O adversário, contudo, não é uma oposição partidária, mas a inconstância de um presidente que causa mais problemas para seu governo e auxiliares do que todos os seus adversários juntos.
Gomes já tem sido fundamental no trâmite das demandas do Estado nos mais diversos ministérios. Nesta crise pandêmica liberou milhões de reais em recursos e conseguiu centenas de kits de equipamento de proteção individual e respiradores. No arroz-com-feijão da articulação em Brasília — diga-se: super nutritivo em suas mãos —, é peça estratégica para as prefeituras adquirirem veículos e maquinários, além de verbas para as mais diversas áreas.
Ter um homem do Tocantins — o Estado do agronegócio como essência — na definição da política agrícola do País poderá contribuir imensamente para superarmos este momento e ainda mais no pós-pandemia. Não que haverá tratamento desigual pelo fato de Halum ser um tocantinense. Não é isso. Mas ter alguém que conhece profundamente a política vigente, os corredores da burocracia e que ainda mantém relações próximas e de confiança com quem decide pode fazer toda a diferença.
Com esse zap e sete copas nas mãos, é só Gomes e Halum trocarem os sinais para suas ações terem sincronia e demonstrarem habilidade para jogar na mesa a carta certa na hora certa.
Não tem erro. Se o presidente celerado não chutar a mesa e pôr fim ao jogo precocemente, é colar o zap na testa e gritar: “Seis!”.
Apenas cuidado para não blefar. Vai que algum corajoso pague para ver.
CT, Palmas, 24 de junho de 2020.