A CPI da Covid no Senado recebeu semanas atrás um autoproclamado “reverendo”, que, ao ser confrontado com mensagens em que se gabava de ter falado “com quem manda”, acabou por admitir que não passava de bravata. Depois tomou um esculacho do presidente da comissão, o senador Omar Aziz (PSD-AM): “O senhor é a única pessoa que tem uma missão aqui, de todos nós, de levar a palavra de Deus. Como é que o senhor diz que é bravateiro?”
Esse episódio me veio à cabeça nessa quinta-feira, 9, ao ler a Declaração à Nação escrita pelo ex-presidente Michel Temer e assinada por seu sucessor, Jair Bolsonaro, que tentava remediar os ataques desvairados e irresponsáveis que fez aos poderes e ministros do STF. Além disso, o chefe do Executivo do Brasil teve que passar pelo profundo constrangimento de ligar e se desculpar com o ministro Alexandre de Moraes, a quem, na terça-feira, 7, nos atos antidemocráticos que convocou, chamou de “canalha” e avisou que não cumpriria mais as decisões que tomasse. Típico comportamento de bravateiro, que, em público, grita, arrota, insulta, coloca o dedo em riste, mas, nas coxias, se acovarda, chora e pede perdão para salvar a própria pele. Bolsonaro é um tremendo bravateiro.
Na sua live para tresloucados na noite dessa quinta, retomou as bravatas. Diante das críticas de seus lunáticos seguidores por ter arregado para Moraes e o STF, pediu “calma” e indicou que os ataques à Corte podem voltar, reforçando, ainda que o faça (o que é bem provável), seu perfil de bravateiro.
Mais sinais de que estamos tratando de um bravateiro contumaz. Atacou a China por meses, desde que estourou a crise sanitária. A sandice chegou ao ponto de sugerir que o país asiático criou o novo coronavírus em sua estratégia de dominação mundial e ainda atirou os adjetivos mais desqualificadores possíveis contra a Coronavac, a “vachina”, segundo dizia, o que foi decisivo para que o imunizante passasse a ser rejeitado pela parte mais aluada de seus lobotomizados sequazes. Mas nessa quinta arregou de novo. “Esta parceria [Com a China] se tem mostrado essencial para a gestão adequada da pandemia no Brasil, tendo em vista que parcela expressiva das vacinas oferecidas à população brasileira é produzida com insumos originários da China”, disse o chefe maior do povo brasileiro na reunião dos Brics. Bravateiro!
Não acabou. Desde a grave dos caminhoneiros de 2018 Bolsonaro é um aliado de primeira hora da categoria, da qual alguns líderes, pelo que se sabe, tem até contato pessoal dele. Recebeu representantes do segmento há poucos dias e, antes mesmo dos atos antidemocráticos desta semana, sabia-se que os caminhoneiros iriam fechar as rodovias. No entanto, o “amigão” desses profissionais não agiu para impedir.
Pela falta de cérebro que caracteriza o líder maior da Idiocracia que se implantou no Brasil a partir de 2019, o que se supõe é que avaliou que uma manifestação dos caminhoneiros seria recebida na sociedade como uma demonstração de força diante do seu inimigo imaginário, o STF. Porém, como era óbvio, saiu pela culatra. A população se desesperou, correu para os postos de combustíveis, milhões de prejuízos aos empresários, etc. Tudo o que facilmente alguém com mínimo de neurônios e bom senso veria com muita antecedência. Não é o caso em tela.
Ao ver o tamanho da bomba, Bolsonaro gravou o áudio pedindo que as estradas fossem liberadas, gerando dúvida sobre a autenticidade, depois confirmada pelo Ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, e muita insatisfação nos caminhoneiros, que acreditavam piamente (santa ingenuidade!) que o presidente seguraria o rojão até o fim, porque é “macho”, inclusive o do insano que liderou o movimento, teve prisão decretada pelo STF e fugiu para o México. Mais uma vez: Bolsonaro bravateiro!
Agora, para explicar a Declaração à Nação, já surgiu, como sempre ocorre, uma teoria da conspiração produzida pelo Gabinete do Ódio e disseminada pelos veículos de fakes news mantidos com dinheiro público, para evitar a total desidratação da base de aloprados que ainda sustenta o bravateiro. O documento, por essa versão alucinada, seria parte de um acordo que já vinha sendo costurado há três semanas entre o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP/AL), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM/MG), e o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes.
É simples desmontar isso: a declaração foi redigida pelo ex-presidente Michel Temer (o próprio disse isso à CNN, sem desmentidos até agora), depois de ter sido buscado em São Paulo às pressas na manhã dessa quinta por avião presidencial para um almoço em Brasília que não constava da agenda oficial. Essa informação por si só desmonta a teoria da conspiração fabricada pelo Gabinete do Ódio e disseminada aos quatro ventos pelos veículos de fake news do bolsonarismo para ludibriar os incautos (que, diga-se, adoram ser enganados para continuar acreditando que não foram manipulados de bravata em bravata pelo bravateiro-mor da Nação).
O autoproclamado “reverendo” picareta que foi à CPI é fichinha perto de Bolsonaro, quando se trata de bazófia.
Depois de todos esses arregos, o presidente da República pode (e vai) continuar soltando ainda muitas outras bravatas. Só uma não vai colar: a de que é imbroxável. Nesta ninguém acredita mais.
CT, Palmas, 10 de setembro de 2021.