[bs-quote quote=”O importante para o governo não é fazer coisas que os indivíduos já estão fazendo, e fazê-las um pouco melhor ou um pouco pior; mas fazer aquelas coisas que no momento não são feitas de forma alguma ” style=”default” align=”center” author_name=”John Maynard Keynes (1883-1946)” author_job=”Economista britânico”][/bs-quote]
A economista Monica de Bolle participou da edição desta semana do programa Roda Viva, da TV Cultura, e previu uma crise longa. Não sabemos quando poderemos sair dela porque não depende de vontade, mas de condições sanitárias. É risível ver se falar de abrir os mercados neste momento em que o Brasil ainda está muito longe do pico da Covid-19. Mais: um pico que será atingido em diferentes momentos pelas diferentes regiões. Perto dele neste momento vemos Manaus e São Paulo, por exemplo. Mas o pior para esses dois Estados está por vir, e será o mês de maio. Alguns Estados chegarão no cume em junho e outros no mês seguinte.
Monica ainda lembrou que a abertura será feita em meio a quarentenas intermitentes. Ou seja, novas ondas virão e tudo terá que ser novamente fechado. Essa situação pode durar cerca de dois anos. Isso significa que o mundo não será mais o mesmo de janeiro de 2020 e a economia também não poderá sê-lo.
[bs-quote quote=”Vejo hoje que é absurdamente impossível que possamos evoluir sem que o Poder Público que atue de forma corajosa e inovadora para promover o desenvolvimento econômico e social” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor da Coluna do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2019/09/CT-trabalhado-180.jpeg”][/bs-quote]
A primeira crítica que surge neste momento, e com razão, é ao Estado mínimo do liberalismo clássico, aquele que deve só se preocupar com educação, saúde, transporte, infraestrutura e segurança e deixar que o mercado, com a mão invisível “vista” por Adam Smith, tome conta da economia.
Liberal de raiz, Monica de Bolle foi questionada sobre como fica sua posição ideológica neste momento. A economista, que vem se abrindo para novas perspectivas de encarar a macroeconomia desde a crise de 2008, se saiu muito bem e afirmou que não é dogmática. Para ela, economia, como ciência social aplicada, muda ao longo do tempo e, por isso, a leitura precisa estar em constante renovação.
Há um tempo li no Facebook a sugestão do economista e professor da UFT Waldecy Rodrigues do livro O Estado empreendedor: Desmascarando o mito do setor público vs. setor privado. Comprei, mas ficou parado. Até que veio esta pandemia e comecei a repensar a economia e o papel do Poder Público, diante do caos que o vírus jogou sobre o mundo. Debruçando sobre a obra de Mariana Mazzucato vi uma perspectiva diferente e reveladora do papel do Estado, mas longe da puerilidade do socialismo, que fracassou absurdamente onde foi testado, porque, antes de mais nada, simplesmente não se encaixa ao que somos como seres humanos dentro de uma perspectiva antropológica mesmo.
Mazzucato apresenta o Estado como indutor do desenvolvimento capitalista, a real mão invisível por trás das mais importantes inovações do nosso tempo, como a internet e o iPhone, que receberam investimentos maciços do Poder Público. Vejo hoje que é absurdamente impossível que possamos evoluir sem que os governos atuem de forma corajosa e inovadora para promover o desenvolvimento econômico e social.
Diante da quarentena intermitente que viveremos após o pico da pandemia, Monica de Bolle defendeu ao Roda Viva que o momento mais delicado desta crise sanitária será justamente na saída dela. Concluo eu que, dessa forma, nunca foi tão importante que tenhamos um Estado empreendedor como agora. Sem sua atuação, a recuperação econômica do Brasil e mundo afora, em meio à situação atual e ao que virá, de abre e fecha, conforme a onda de Covid-19 vem e vai, será impossível a reestruturação do mercado e a recuperação de empregos.
O Brasil, que tem uma enorme tradição em ineficiência estatal, terá que dar um salto qualitativo nessa área para que o Poder Público possa contribuir para a superação deste momento tão difícil. O socorro à população carente é indispensável, mas também é necessário estender sua mão ao mercado de forma inteligente, identificando setores estratégicos com capilaridade para dar impulsão à retomada de áreas diversas da economia.
Monica de Bolle lembrou na entrevista à TV Cultura que o governo federal poderia melhor se utilizar do BNDES, o nosso banco de desenvolvimento econômico — também citado como exemplo por investimentos no setor de tecnologia “verde” por Mazzucato em seu livro —, para garantir que os recursos cheguem mais rápido às empresas — já que via bancos privados essa injeção é lenta.
Claro que Estados mais eficientes — enxutos e com estruturas administrativas e tributárias mais modernas — terão mais facilidade para contribuir para a recuperação de seus países. Daí, mais uma vez, vamos pagar por termos adiado as reformas tão essenciais à modernização do Brasil.
De toda forma, com a Covid-19, é preciso reconhecer a vitória do keynesianismo.
CT, Palmas, 22 de abril de 2020.