Na CPI da Covid, nessa terça-feira, 4, o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta mostrou a mesma postura de quando dava entrevistas coletivas diárias para manter a população informada sobre a doença que já preocupava em março de 2020: sério, muito didático, técnico e, sobretudo, aferrado à ciência e à busca por salvar vidas. Quem esperava um show midiático, com oportunismo político, repleto de críticas fáceis e rancorosas ao presidente Jair Bolsonaro, se decepcionou. Justamente por isso, pela ponderação, por ter ficado restrito aos ditames científicos, o depoimento foi tão forte, comprometedor para o governo e de total credibilidade.
O principal ponto foi o fato de Mandetta ter dito que, se o País tivesse comprado todas as vacinas possíveis quando lhe foram oferecidas, não teríamos tido a segunda onda, que ceifou milhares e milhares de vidas. E, sem a segunda onda, com grande parte da população vacinada a partir de novembro, possivelmente teríamos aqui o ator Paulo Gustavo, que tristemente nos deixou nessa terça-feira, meu amigo querido Nilo Alves ainda me passaria mensagens diariamente com sua gaitada inesquecível, nossa amiga Netinha e seus filhos teriam seu marido, nosso amigo Crisna, e tantos outros que se foram ou que estão muito mal em UTIs pelo Tocantins e pelo Brasil.
Esse é o fato. A irresponsabilidade de Jair Bolsonaro, ao tripudiar sobre as vacinas — a “vachina”, a “vachina do Dória”, “vai virar jacaré”, “vai pegar aids”, “um chip chinês será implantado na pessoa” —, custa ao povo brasileiro 3 mil vidas por dia. Agora é preciso a responsabilização. Não pode ficar assim, em nome de todos aqueles que se foram, seus amigos e parentes hoje sob luto e tristeza.
Ficamos sabendo que havia uma gestão paralela da saúde, que era mais ouvida pelo presidente da República do que o ministério então dirigido por Mandetta. Este, a partir de parâmetros científicos; aquele, com base no achismo, no curandeirismo, no que o ex-ministro chamou de “kit ilusão”.
Também fomos informados de que o vereador do Rio Carlos Bolsonaro acompanhava reuniões de ministros e ficava anotando o que se diziam. Por quê? Ele precisa ir à CPI explicar.
Alegar desconhecimento, Bolsonaro não pode. Foi informado em março de 2020 de que, se não houvesse uma condução competente e científica da pandemia, terminaríamos o ano com 180 mil mortos. O ex-ministro errou: morreram mais de 190 mil brasileiros.
Além das verdades que estão sendo trazidas à tona, o governo Bolsonaro tem outro problema sério com a CPI: sua bancada de defensores, absurdamente despreparada. Vem um senador, com “ares científicos”, trazer exemplos de curandeirismo sob o argumento de que o mundo inteiro rejeita os remédios baratos — cloroquina, ivermectina e outras bobagens bolsonaristas — para garantir lucros fáceis aos laboratórios. Atenção nisso: a economia mundial está sendo dizimada, os governos estão investindo bilhões de dólares para desenvolver vacinas, apenas e tão somente para que a indústria farmacêutica tenha lucros exorbitantes. A pessoa que acredita nisso tem sério déficit cognitivo ou profunda falta de bom senso.
O beócio senador, não satisfeito, continuou: usou o exemplo de sua família, que pegou Covid-19, e toda ela “se curou” ou não agravou por conta desse curandeirismo. Essa gente — repito: com déficit cognitivo enorme ou sem nenhum bom senso — insiste em não entender que 85% dos contaminados ou não tem qualquer sintoma ou apresenta sintomas leves. Se eles tomarem água com açúcar terão a mesma reação à doença e dirão que não foram à UTI por conta da água com açúcar. Além disso, os profissionais da saúde todos os dias relatam o tanto de pessoas que morreram mesmo tomando esse “kit ilusão”. É de uma estupidez que só revela a profundidade da ignorância do povo brasileiro.
Mas a bancada governista ainda insistia nesses absurdos e deixou claro, em vários momentos, que suas perguntas vinham do Palácio do Planalto. Primeiro porque não haviam sequer lido o que receberam e, no primeiro contato com as questões, ali, já na CPI, mal conseguiam pronunciar as palavras. Depois, o ex-ministro Mandetta entregou a manobra palaciana, a partir de um erro absurdo do ministro das Comunicações, Fábio Faria, que, por engano, enviou a questão para o depoente e não para o senador Ciro Nogueira.
Questões cruciais a bancada de parvos não rebateu: que Bolsonaro recusou-se a comprar vacinas quando pôde, que agiu deliberadamente contra o isolamento social e uso de máscaras, arrastando as pessoas às ruas pelo exemplo e as levando à morte; e que fez apologia ao uso de remédios inócuos, receitados por curandeiros.
A vantagem de quem defende que essa história seja devidamente passada a limpo é que, com esses defensores na CPI, o presidente Bolsonaro nem precisaria de oposição.
Que seja feita justiça aos mais de 412 mil mortos pela Covid-19 pela condução incompetente, irresponsável e criminosa do presidente da República.
CT, Palmas, 5 de abril de 2021.