Depois de a barbárie sistêmica acompanhar a humanidade por quase toda a sua história, a Organização das Nações Unidas (ONU) adotou em 10 de dezembro de 1948, portanto, há 71 anos — comemorados nessa terça-feira —, uma série de princípios que delineiam os direitos humanos básicos. Foi o ponto em que a humanidade passou a combater de forma institucional as atrocidades contra os mais frágeis. Assim é que abre o primeiro artigo da Declaração Universal dos Direitos Humanos:
“Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”.
[bs-quote quote=”Tratar um ser humano com decência, com dignidade, não significa a defesa da impunidade. Mas, sim, de reconhecer que aquele que errou, muitas vezes da maneira mais terrível, também é parte da humanidade e como tal deve ser tratado” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor da Coluna do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2019/09/CT-trabalhado-180.jpeg”][/bs-quote]
Como se vê, não se trata de uma pregação de esquerda ou de direita. Nem de uma “defesa de bandido”, mas de garantir a cada ser humano que tem o privilégio de nascer neste planeta lindo o direito de desfrutá-lo em plenitude, sendo respeitado por todos aqueles que estão à sua volta e pelo Estado que o abriga.
Claro que a maioria das pessoas que ataca os direitos humanos nunca leu esse importante e fundamental documento. No entanto, apesar das críticas cegas que desferem contra essa carta, seus agressores também são protegidos por ela, e, de uma forma ou de outra, beneficiados pelos efeitos que a Declaração provocou no mundo, como o regramento legal que inibe os abusos por parte do Estado. A Constituição Federal do Brasil, chamada de Constituição Cidadã, é “filha” desse instrumento humanitário produzido em 1948.
O ponto mais polêmico quando se fala de direitos humanos no Brasil se refere ao tratamento defendido pelos organismos em relação ao sistema carcerário. Aí vem as frases do tipo “bandido bom é bandido morto” e “direitos humanos é para humanos direitos”. São resultado de concepções de mundo que se baseiam na Lei de Talião do “olho por olho, dente por dente”, que remete aos primórdios da humanidade, quando a civilização ainda engatinhava. A defesa da Lei de Talião é típico de mentalidades que ainda não conseguiram alcançar o salto civilizatório sobretudo desses últimos 71 anos.
Tratar um ser humano com decência, com dignidade, não significa a defesa da impunidade. Mas, sim, de reconhecer que aquele que errou, muitas vezes da maneira mais terrível, também é parte da humanidade e como tal deve ser tratado. Primeiro como ser humano que é; depois porque tratá-lo como fez com suas vítimas não tornará os “humanos direitos” melhores que eles, mas seus iguais.
Vem então a reclamação de que os direitos humanos querem tratar os presos com mais decência do que os livres. Inicialmente, quem fala isso desconhece o valor da liberdade. De não estar limitado a um espaço — se muito, diante da superlotação dos presídios —, de 8 metros quadrados com a possiblidade de tomar banho de sol por uma hora diária, apenas.
De outro lado, desconhece também a luta das mais diversas entidades de direitos humanos por mais qualidade de vida dos cidadãos das localidades mais esquecidas pelo Estado. Os direitos humanos são a base da constituição das inúmeras entidades que defendem melhorias nos mais diversos setores, como saneamento básico, acesso à educação, moradia, entre tantos outros setores fundamentais para uma existência com dignidade e cidadania plena.
A mínima reflexão levará à conclusão, até óbvia, de que a defesa da causa dos direitos humanos não é dever exclusivo de ONGs de esquerda, de centro ou de direita, nem do Poder Público e suas instituições, mas de cada ser que respira, trabalha e busca garantir, com muita luta, sua sobrevivência e daqueles que dele dependem.
Por isso, os direitos humanos não são bandeira da direita ou da esquerda, mas de todos os homens e mulheres de boa vontade.
CT, Palmas, 11 de dezembro de 2019.
— Leia a íntegra da Declaração Universal dos Direitos Humanos