Como todos ouvem desde criança, a força de Sansão estava em sua longa cabeleira. Deixou-se apaixonar, veio Dalila, furtivamente, e cortou a bela juba. O herói bíblico, então, foi arrastado e preso pelos seus inimigos filisteus. Lembrei da história ao assistir, silente, o cerco que os senadores Kátia Abreu (PP) e Irajá (PSD), com o ex-prefeito de Palmas Carlos Amastha (PSB), fizeram ao ex-prefeito de Gurupi Laurez Moreira (PDT).
Laurez, de fato, é mais pré-candidato a vice do que a governador, ainda que insista que seu nome está vivo na corrida pelo Palácio Araguaia. E, neste momento da pré-campanha, a disputa mais acirrada é pela vaga de companheiro de chapa do governador Wanderlei Barbosa (Republicanos). No mínimo três nomes de peso concorrem: além do pedetista, o empresário Edison Tabocão (PSD) – candidato dos Abreu – e o ex-senador Vicentinho Alves (PP).
A força de Laurez nessa árdua batalha “era” o denso grupo de que se cercava até esses dias. Todo o PSB local, com o poderoso empresário Oswaldo Stival (PSDB) e seu mais próximo aliado o ex-vereador de Gurupi Eduardo Fortes (PSDB). A aliança desse grupo vinha desde 2018, quando Stival foi candidato a vice-governador de Amastha, e os dois contaram com o apoio do então prefeito gurupiense. Em 2020, a composição se repetiu em torno dos dois mais jovens membros da coalizão: Gutierres candidato a prefeito da cidade com Fortes de vice.
A leitura da atual conjuntura favorecia, e muito, Laurez. Como o mais competitivo pré-candidato da oposição, Ronaldo Dimas (Podemos), é de Araguaína, onde é fortíssimo e pouco provável que perca na cidade (nosso segundo maior colégio eleitoral) e seu entorno, então, a balança precisava ser compensada com o Palácio Araguaia conquistando força total no sul do Estado. Por essa ótica, o nome do ex-prefeito de Gurupi, cuja excelente gestão na cidade ecoa por todo o Tocantins, entrava perfeitamente, uma vez que ele e o grupo do qual fazia parte são extremamente majoritários por lá.
Porém, num movimento estranhíssimo, Amastha acusou Laurez de se mudar para o PDT sem avisar o grupo — ele já havia ido para o Avante sem comunicar a ninguém, e ninguém reclamou — e, assim, fez uma intervenção no PSB de Gurupi, colocando o ex-vereador Wendel Gomides na presidência municipal, ocupada até o início da semana pelo deputado estadual Gutierres Torquato.
A solenidade de posse do novo presidente foi uma declaração tácita de rompimento com Laurez. Lá estavam Amastha, Stival, Fortes – que se filiará na sexta-feira, 25, ao PSD de Irajá – e todos os que os cercam – óbvio: menos Laurez e Gutierres.
Todo esse movimento seria de uma claridade solar se o PDT fosse um partido de oposição ao governo Wanderlei. Como esse grupo está na base palaciana, é claro que precisariam agir para alijar Laurez do processo. Não é o caso. O novo partido do ex-prefeito de Gurupi já vinha sendo presidido por um dos mais importantes secretários de Wanderlei, Jairo Mariano (Infraestrutura). Inclusive, antes de sua posse, o próprio governador chegou a anunciar que iria se filiar ao partido.
Só resta mesmo uma explicação: Laurez tinha que ser tirado da corrida pela vaga de vice-governador, que, pelo histórico dos últimos mandatos no Tocantins, sempre tem chance altíssima de ocupar a cadeira principal do Palácio Araguaia. Pelos movimentos feitos nestes últimos dias, o objetivo claro é emplacar Edison Tabocão na chapa majoritária palaciana.
Mas é preciso voltar à história de Sansão para fechar esta reflexão. Por ter ficado muito tempo preso, o cabelo dele voltou a crescer e, quando publicamente apresentado às pessoas, o herói bíblico, que teve os olhos arrancados pelos filisteus, pediu para ficar encostado em duas colunas. Orou, Deus lhe devolveu a força, com a qual pôde derrubar o templo, matando-se e a todos que estavam dentro.
Laurez não é Sanção, mas, com certeza, teve sua força podada nessa articulação toda e não vai ficar apenas de espectador. Será que se recupera?
CT, Palmas, 23 de março de 2022.