Não tenho qualquer simpatia pelos empréstimos de R$ 583 milhões da forma como que foram elaborados. Primeiro porque faltou critério técnico e sobrou o político-eleitoreiro. Segundo, um Estado que já paga anualmente cerca de R$ 600 milhões de juros e despesas de operações financeiras não pode se dar ao luxo de pegar um volume desse de financiamento sem o máximo de racionalidade e o mínimo de politicagem. Não foi o caso.
Pelo critério técnico, a coluna sempre defendeu que as obras escolhidas para financiamento deveriam se encaixar em duas condições: ou para reduzir custos do Estado, ou aumentar sua receita. Empresas pensam assim. Como pegar financiamento sem considerar esses dois pontos? Se o governo fosse uma empresa, seu dono tomaria essas operações no “vale-tudo” como foi feito?
[bs-quote quote=”Tratam esses empréstimos como se fossem a fundo perdido, esquecendo-se o quanto de juros a mais significarão para o contribuinte” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor da Coluna do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2019/09/CT-trabalhado-180.jpeg”][/bs-quote]
Temos aquela concepção que está na base da atual crise fiscal de que o caixa do Poder Público não tem limite. O entendimento é de que o Estado vai pagar de algum jeito, ou vai esticar até onde dá. No entanto, a atual gestão é testemunha de que não há mais como esticar essa corda, nem jeito para resolver tantas contas com recursos disponíveis.
Assim, desses empréstimos, são muito bem-vindos os valores para a construção da Ponte de Porto Nacional, uma via fundamental de escoamento da produção e de interligação da região central com o sul do Tocantins, o que gera muitas riquezas para os municípios envolvidos. Também são importantes os recursos que serão alocados para os hospitais, porque aliviará uma demanda reprimida e reduzirá custos operacionais; e para conclusão de rodovias.
No entanto, é totalmente politiqueira a destinação de pouco mais de R$ 1 milhão para cada um dos 139 municípios, para garantir asfaltos de bairros, até rodoviária (é verdade!) e outras obras que são promessas de campanhas eleitorais, cujas contas não deveriam ser repassadas para o conjunto da população do Estado. Se o Tocantins estivesse voando em céu de brigadeiro, poderíamos nos dar ao luxo de fazer esse tipo de bondade.
Mas não é o caso: são cerca de R$ 600 milhões de juros e despesas da dívida de outros financiamentos, entre eles os que geraram as tais “pontes de papel”, estradas pagas duas vezes e não construídas, etc. Além disso, ainda patinamos para sair da maior crise fiscal de toda a história. No entanto, tratam esses empréstimos como se fossem a fundo perdido, esquecendo-se o quanto de juros a mais significarão para o contribuinte.
Claro que essa discussão está vencida, não há mais nada a se fazer, já que os projetos foram aprovados e os recursos serão liberados após longo e profundo debate judicial. Assim, exposto o que penso sobre os empréstimos, é preciso reconhecer que eles são uma vitória pessoal do governador Mauro Carlesse (DEM).
Como presidente da Assembleia, Carlesse procurou ganhar tempo quando os projetos foram apresentados pelo então governador Marcelo Miranda (MDB) em dezembro de 2016. O então presidente do Legislativo só começou a discutir os financiamentos na AL por volta de abril de 2017, fazendo alguns ofícios alegando necessidade de mais informações, uma estratégia claramente protelatória.
Depois, ao julgar que era o momento, puxou para si a tramitação, se uniu à Associação Tocantinense de Municípios (ATM) e desconfigurou completamente a proposta que havia sido apresentada pela Secretaria Estadual do Planejamento, dando a ela um viés completamente político, como os presentes de pouco mais de R$ 1 milhão para cada município. Claro, com cada deputado assinando emendas para garantir a paternidade político-eleitoral.
Depois, já no governo, veio o contratempo da decisão da Justiça Federal que proibiu a Caixa de fazer as operações em pleno período eleitoral, com a disputa suplementar. Também surgiu o debate sobre a constitucionalidade do uso do Fundo de Participação do Estado (FPE), como garantia dos empréstimos.
Paralelo a isso, Carlesse focou no enxugamento do Estado para que pudesse se reenquadrar à Lei de Responsabilidade Fiscal. Com as medidas duras de contenção de despesas e de folha, o governo conseguiu colocar as contas abaixo dos 49% de limite legal, o que teve peso decisivo no julgamento do Tribunal de Contas da União (TCU), dias atrás, para a liberação desses R$ 583 milhões da Caixa para o Tocantins.
Por todo esse percurso e esforço, pelo engajamento pessoal, a assinatura dos financiamentos da Caixa ao Estado, que ocorrerá no dia 8, é talvez a maior vitória de Carlesse após as eleições do ano passado.
Palmas, CT, 31 de outubro de 2019.