Não sou dos que se divertem com a desgraça alheia, ainda que seja revestida de aparente ou real justiça. Se plantou, colhe. É a lei da vida. No entanto, estou muito próximo de completar meio século de jornada por esta Terra e nesse bom tempo de estrada dá para aprender algumas coisas. Desvencilhei-me há alguns anos de religião para pensar exclusivamente em termos de espiritualidade. Nunca me arrependi um minuto que fosse dessa decisão. Ao contrário. Sinto-me liberto e cada vez mais propenso a olhar qualquer fato por uma perspectiva humana, a partir do princípio cristão que diz que devemos fazer ao outro o que queríamos que ele nos fizesse.
Assim, quando vejo um “cadáver” jogado por essas operações para os “lobos” das redes antissociais dilacerarem, reparo que espumam e vociferam, sem misericórdia, humanidade, nada. Afinal, domingo tem um culto, missa ou o ato da religião que professam e lá reforçam a sensação infantil de que estão “salvos”, e a vida segue normal. Então, podem malhar o “judas” e tirar-lhe todo o sangue.
[bs-quote quote=”A classe política demonstra a cada dia que não conseguiu entender que o Brasil mudou. Estamos num novo momento do País, de instituições muito fortalecidas e independentes — sobretudo Ministério Público Federal e Polícia Federal” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor da Coluna do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2019/09/CT-trabalhado-180.jpeg”][/bs-quote]
A indignação é justíssima, compreensível, mas a ferocidade que assusta nos desumaniza e, de certa forma, nos iguala ao alvo de nossa ira. Sempre penso que, por mais que o “cadáver” jogado à multidão para linchamento tenha errado, existem um pai, uma mãe, irmãos, esposa e filhos, que merecem, no mínimo, ser tratados com dignidade e respeito. A tal da empatia, colocar-se no lugar do outro.
Cumpro a obrigação de divulgar o que está nos autos, afinal, é meu papel, mas torço tão somente para que justiça seja feita e que a sociedade evolua. Vingança e ódio só nos destroem como seres humanos. Sei que é inútil dizer isso neste momento do mais profundo obscurantismo do Brasil. Mas não dou conta de brindar com taça do sangue alheio, posando-me de justiceiro.
Foi com muita tristeza que assisti a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ainda que defenda até hoje que ela deveria ter ocorrido, mesmo reconhecendo que possam ter havido excessos de conversas entre juiz e procuradores. Porém, não há um só fato que mostre fraude de provas. De toda forma, vi a prisão de Lula como um momento triste do Brasil, de decepção, não de festa.
No caso do ex-governador Sandoval Cardoso, em 2015, foi a mesma coisa. Se errou, que pague pelo que fez, que tenha direito de defesa e, se não conseguir provar inocência, que seja condenado. Mas isso não é motivo de estourar rojões, para linchamentos. O fracasso é, de certa forma, de toda a sociedade.
No caso da família Miranda, ela frequenta o noticiário com denúncias desde o primeiro mandato (2003-2006). A Coluna do CT fez muitas delas na primeira e segunda gestões. Na época, as críticas do site eram atacadas por muitos dos que hoje se voltaram contra os ex-ídolos e passaram a achincalhá-los. Muitas vezes de forma incivilizada, bárbara.
Pior é que o pano de fundo dessas pessoas que observo, do ódio que transmitem nas postagens e do linchamento a que se lançam com ferocidade, não são os erros administrativos do ex-governador Marcelo Miranda, muito menos as acusações de corrupção. Devem-se ao fato de não terem conseguido se encaixar na máquina no início de 2015, quando o emedebista voltou ao comando de um Estado afundado na maior crise fiscal e financeira de sua história, sobre a qual Marcelo é um dos grandes responsáveis, é verdade.
Mas, de outro lado, a classe política demonstra a cada dia que não conseguiu entender que o Brasil mudou. Estamos num novo momento do País, de instituições muito fortalecidas e independentes — sobretudo Ministério Público Federal e Polícia Federal.
Essas investigações — ainda que possam haver indícios de abusos e que exista muita pirotecnia — são fundamentais para a depuração do Brasil. A torcida é para que elas prossigam e que o medo seja o motor que leve a uma mudança de mentalidade e de comportamento da classe política.
Aqui e ali há sinais claros de que os políticos, do Tocantins e fora dele, insistem numa postura que não cabe mais neste novo Brasil que está nascendo. Precisam rever como se pôr diante do erário, do eleitor, das demandas de um povo que quer se erguer e depurar a cena política, na qual se possa respirar ares mais limpos e saudáveis.
Teimar por este caminho dos abusos de poder político e econômico cada vez mais vai gerar sofrimentos a si e às próprias famílias, mais linchamento público e mais marginalização da política de que tanto reclamam.
Continuar dando esse murro em ponta de faca é colher a própria destruição, de suas famílias e carreiras, apostando numa falsa esperteza que, em tempos de alta tecnologia, de delações, etc., se mostrará uma grande estultice que só serve de chave de cadeia.
CT, Palmas, 26 de setembro de 2019.