Muito bom que a Prefeitura de Palmas dê oportunidade para que seus cidadãos possa pagar os impostos devidos em suaves prestações e com redução de até 100% dos juros, como está sendo proposto pelo 3º Mutirão de Negociação para Regularização Fiscal (Refis 2019), que começou nesta segunda-feira, 14 e segue até domingo, 20. No entanto, o volume da inadimplência — R$ 600 milhões — leva, obrigatoriamente, a uma reflexão: os impostos que estão sendo exigidos dos palmenses não estão muito acima do que eles podem pagar?
Conforme a própria prefeitura informa, são 23 mil processos de inadimplência que estão no alvo desse Refis, perfazendo aí os R$ 600 milhões que o município tem para receber de atrasados, dos quais espera conseguir recuperar com esse mutirão apenas 10%, ou seja, R$ 60 milhões.
[bs-quote quote=”Não há a mínima diferença entre os abusos cometidos pelo Luís XVI, Maria Antonieta e todos os seus nobres com o que vemos no mais elevado Olimpo dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário federais, estaduais e municipais” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor da Coluna do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2019/09/CT-trabalhado-180.jpeg”][/bs-quote]
Será que somos cidadãos tão descompromissados com a manutenção da cidade, ou estão nos cobrando muito mais do que temos que condições de pagar? Isso não é algo que diz respeito somente à capital do Tocantins, mas se repete no governo do Estado e na União. Não é à toa que neste momento rediscutindo a reforma tributária, que volta e meia toma conta do noticiário e depois some. Por quê sai da pauta? Simples: é muito difícil falar em redução de impostos em meio ao Estado mastodôntico — em todas as instâncias — que temos que carregar.
A coluna já havia abordado essa questão quando do protesto dos caminhoneiros, que queriam redução do preço do diesel, o que necessariamente passaria por alíquotas menores de tributos. Sempre defendi que isso era impossível de ser feito sem que fosse compensado de uma outra forma. Para o governo abrir mão de impostos num produto, teria que sobrecarregar outro, já que precisa fechar as contas das benesses nababescas que ostenta.
Não há qualquer margem para se falar em menos impostos se antes não forem repensados os inúmeros privilégios que abocanham grande parte do que é recolhido do contribuinte. Temos uma cultura ainda colonial de que o agente público — seja ele eleito, comissionado ou concursado — é um ser iluminado, que está acima de todos os outros cidadãos, e, como tal, deve ser remunerado com salários muito além da imaginação e privilégios sem fim. Dessa cultura que vem o tal capinha, cuja única função é puxar a cadeira para um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) se sentar ou se levantar, a um soldo de incríveis R$ 12 mil ao mês. É ou não uma relação de Corte aos moldes da monarquia, que deveria estar extinta do território nacional desde 15 de novembro de 1889. Tiraram os monarcas, mas os privilégios dos cortesãos são mantidos até hoje.
A indignação com os absurdos tributários foi um dos principais motivos da Revolução Francesa de 1789, levando a monarquia, nobres e clérigos à guilhotina. A burguesia ascendente não suportava mais pagar impostos absurdos para manter as regalias sem fim de nobreza e clero. Livramo-nos da parasitagem desses últimos, mas os primeiros continuam sugando nosso sangue na forma de mandatos eletivos, comissionados e concursados de alto escalão. Não há a mínima diferença entre os abusos cometidos pelo Luís XVI, Maria Antonieta e todos os seus nobres com o que vemos no mais elevado Olimpo dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário federais, estaduais e municipais.
No caso de Palmas, o que agravou a situação é tivemos no último mandato uma política tributária que tornaria tímida as práticas da França do século XVIII. Só de IPTU, o governo Carlos Amastha (PSB) impôs um aumento de 83,2% em 2017 em relação a 2012, último ano de Raul Filho (sem partido). A arrecadação total do tributo em 2012, incluindo multas e juros, foi de R$ 37.038.103,18, e, em R$ 2017, esse valor chegou a 67.836.668,98.
As estripulias tributárias do período foram reconhecidas em forma de decisão judicial em 2018, quando o Tribunal de Justiça considerou abusivo e suspendeu o aumento do IPTU, que chegava a 400%.
Ainda que se considere as dificuldades abismais, com a teia de legislações que protegem corporações de servidores e a resistência dos políticos em reduzir privilégios, a única saída razoável para termos níveis tributários civilizados é fazer esse enfrentamento com os dois setores que perpetuam as benesses da França pré-revolução de 1789.
A paciência da sociedade está por fio, e uma “guilhotina”, claro que de forma metafórica, é uma grande possibilidade.
CT, Palmas, 14 de outubro de 2019.