É um primor do negacionismo mais bolsonarista possível a ação do promotor Adriano Neves que questiona o decreto da Prefeitura de Palmas para tentar impedir o avanço da Covid-19. A doença já matou 292 pessoas na Capital, onde neste exato momento, oficialmente (porque é mais gente), 3.647 pessoas estão contaminadas. Mais: 91,8% das UTIs de Palmas estão ocupadas. Só o Boletim Epidemiológico da Secretaria Municipal da Saúde trouxe nessa quinta-feira, 11, outros 383 casos, segundo a prefeitura, o maior registro dos últimos seis meses na Capital.
Diante desses números que já levaram às lágrimas um comprometido defensor público, justamente pelo desespero de querer ajudar famílias em pânico e nada poder fazer, o que se apresentou à Justiça nessa ação absolutamente inoportuna foram os argumentos mais rasos, daqueles que todos os dias os “tios de zap” mandam aos nossos smartphones.
Essa ação merece projeção nacional, daquelas que acabam repercutindo no exterior como mostra da nossa mentalidade ainda fixa na Idade Média. Para o mundo — e não tiro a razão —, o Brasil, diante da ignorância que aqui prevalece, perderia milhões de vidas se tivesse que enfrentar hoje a peste negra, como a Europa em 1347-1348, mesmo já tendo a informação científica de que a causa era o carrapato do rato preto. Os bolsominions questionariam essa verdade objetiva, e diriam que isso é coisa dos comunistas globalistas contra Deus e a família tradicional, santa e hipócrita.
Não é à toa que o mundo nos vê nesta pandemia como um país pestilento. Já estamos proibidos de entrar em 17 nações. Produzimos uma variante, a P.1, a pior de todas, por termos um presidente da República que se recusou a derrotar o vírus, firmou aliança com ele e faz do genocídio uma política de Estado para atender seus objetivos autoritários, pregando essas ideias que vão contra tudo o que a parte séria e civilizada do planeta vê como protocolo necessário para extirpar o mal que o assola. Nos tornamos, assim, por ignorância, pela nossa mentalidade medieval, um perigo à humanidade. E essa ação do Ministério Público do Tocantins é mais uma prova à comunidade internacional da nossa selvageria.
O promotor, na sua independência funcional, pode pedir o que quiser, pode ser ou não ser bolsominion, não sei se é o caso. O que seria mais absurdo é se a Justiça o atendesse, mandasse a prefeitura abrir o comércio domingo, 14, e fosse impedida de tomar medidas semelhantes no futuro.
Aí seria teríamos de nos convencer, em definitivo, de que estamos mesmo à deriva. Se o Judiciário se aliar a essa narrativa anticiência, baseada em tweet, em páginas anônimas, em conversinha de “tio de zap”, então, só nos restará apelar a Chico Buarque, de quem parafraseio o refrão de uma antiga música-protesto:
“Chame o vírus, chame o vírus!”
CT, Palmas, 12 de março de 2021.