A Constituição de 1988 fortaleceu o sistema de controle externo exercido pelos Tribunais de Contas em todos os entes federados, numa clara demonstração de que o controle atribuído às cortes de contas na federação brasileira é essencial para o fortalecimento do Estado democrático de Direito.
Em uma federação de dimensões geográfica, econômica e populacional como o Brasil, entender as especificidades de cada ente é fundamental para a coesão de um sistema de controle externo articulado, no sentido de fazer valer as suas prerrogativas constitucionais de forma efetiva.
Neste ensaio, busca-se delinear a importância da uniformidade entre os Tribunais de Contas brasileiros no exercício das atividades próprias de suas atribuições estabelecidas no texto constitucional de 88, tendo como norte o fortalecimento do controle preventivo e concomitante dos gastos públicos, com o sentido de chegar antes do desperdício dos recursos do erário.
É evidente que a fiscalização simétrica, em todas as localidades brasileiras, certamente promoverá instrumentos de aprimoramento da Administração Pública, resultando em probidade dos atos da Administração; regularidade no emprego dos bens e valores pertencentes à sociedade e na fiel execução do orçamento público.
Por força do princípio da simetria, contido no artigo 73, §3º, da CF, os conselheiros dos Tribunais de Contas são equiparados aos magistrados, sendo-lhes aplicada, por analogia, a Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LC nº 35/79). Tal informação possui relevância para esclarecer que, em que pesem as competências diferenciadas, a Loman é aplicável, analogamente, ressalvadas as impossibilidades decorrentes das particularidades institucionais, aos membros das cortes de contas.
Há, contudo, um questionamento a ser respondido: quem controla o controle externo exercido pelos Tribunais de Contas no Brasil? Não é chegado o momento de pensarmos em um órgão a exemplo do CNJ para, como esfera uniformizadora de procedimentos, exercer o controle das atividades levadas a efeito pelos Tribunais de Contas?
No âmbito do Poder Judiciário, a Resolução 441/21 do Conselho Nacional de Justiça estabelece uma importante ferramenta que proporcionará aos magistrados uma Visão Global do Poder Judiciário. A partir dessa formulação do CNJ, os juízes poderão atuar em órgãos do Poder Judiciário distintos do tribunal de origem, exercendo jurisdição no local para o qual foram designados para auxiliar, resguardados o ramo e a especialidade, pelo prazo de, no máximo, seis meses. Importa ressaltar que, na duração do programa, ficam protegidas todas as garantias constitucionais dos magistrados, tais como vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos.
Sugerimos ao sistema de controle externo a adoção de medida análoga. A convivência com a diversidade federativa do sistema de controle poderá ser útil para o fortalecimento da atuação sistêmica dos Tribunais de Contas, tornando o controle externo mais efetivo na sua finalidade precípua, através do compartilhamento de informações e experiências, como instrumento de uniformização, celeridade e qualidade dos serviços prestados, resultantes da troca de boas práticas entre as cortes de contas.
Por outro lado, precisamos entender o controle externo exercido pelos Tribunais de Contas como parte integral da finalidade do Estado, que é a promoção do bem comum, com o desenvolvimento integral da pessoa humana.
Destaca-se, também, o necessário cumprimento isonômico da Lei de Responsabilidade Fiscal por parte dos entes da federação, o que pressupõe a efetividade dos princípios constitucionais que regem a Administração Pública e que podem ser traduzidos na necessidade de que os investimentos dos recursos do erário se prestem a bem atender ao interesse público, destacadamente daqueles que mais necessitam do Estado: os que se encontram em situação de vulnerabilidade social.
Importa reconhecer que políticas públicas eficientes devem estar sintonizadas com o equilíbrio das contas públicas. Tudo isso se completa com a necessidade de uniformização da atuação do controle externo, de modo que o princípio da segurança jurídica, que deve ser observado no desempenho das atribuições conferidas às cortes de contas, seja um instrumento disponível à sociedade no fortalecimento do Estado democrático de Direito.
Diante de todos os apontamentos, destacadamente da necessidade de uniformização e integração do sistema de Tribunais de Contas, medida semelhante àquela adotada pelo CNJ, no âmbito do Poder Judiciário, seria bem-vinda, permitindo que, por exemplo, conselheiros e auditores das cortes de contas atuem, por um período limitado de tempo e nos moldes da Resolução 441/21, em outras cortes pelo país, no sentido de incentivar a aprendizagem e o compartilhamento de boas práticas para todo o sistema de controle externo exercido pelos Tribunais de Contas.
ANDRÉ LUIZ DE MATOS GONÇALVES
É conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Tocantins.
JOÃO ANTONIO DA SILVA FILHO
É conselheiro presidente do Tribunal de Contas do município de São Paulo.
*Reproduzido da Consultor Jurídico, 2 de fevereiro de 2022