A previdência social é uma pauta relevante em qualquer sociedade e no contexto brasileiro o tema ganha ainda mais destaque devido à complexidade e às mudanças legislativas que moldam o sistema previdenciário do país. Uma das áreas fundamentais desse sistema é o Regime Próprio de Previdência Social – RPPS para servidores públicos ocupantes de cargo efetivo, previsto na Constituição Federal – CF.
O artigo 40 da CF estabeleceu as bases para o RPPS e sua redação sofreu sucessivas alterações (Emendas Constitucionais nº 20/1998, nº 41/2003, nº 47/2005 e nº 103/2019).
A Constituição da República determina que somente os servidores ocupantes de cargo de provimento efetivo — ou seja, concursados – estão vinculados ao Regime Próprio de Previdência Social.
Apesar das sucessivas alterações, a regra de que o RPPS se destina a servidores titulares de cargos efetivos é mantida no caput do art. 40 da CF.
Um ponto de debate que surge nesse contexto é a inclusão de servidores admitidos sem concurso público no RPPS, situação discutida no julgamento do Recurso Extraordinário nº 1.426.306/TO, que foi interposto pela Procuradoria-Geral do Estado do Tocantins – PGE/TO.
A exclusão desses servidores do RPPS é uma questão que envolve considerações legais, constitucionais e financeiras. A estabilidade garantida pelo artigo 19 do ADCT é uma exceção ao requisito de concurso público para ingresso no serviço público. A estabilidade assegura a continuidade do vínculo do servidor, mas não confere o mesmo grau de vínculo do cargo efetivo, o qual exige a aprovação em concurso público.
No âmbito estadual, e de acordo com a redação do artigo 40 da CF, foram editadas as Leis nº 1.246, de 06 de setembro de 2001, e nº 1.614, de 04 de outubro de 2005, dispondo que somente servidores ocupantes de cargos efetivos, investidos mediante concurso público, seriam segurados do RPPS.
Contudo, apesar das previsões constitucionais e legais acima, diversos servidores estabilizados pelo art. 19 do ADCT (não ocupantes de cargo efetivo) e aposentados pelo Regime Geral de Previdência Social (INSS) ajuizaram ações contra o Estado do Tocantins e o Instituto de Gestão Previdenciária do Estado do Tocantins objetivando a declaração de inconstitucionalidade das leis estaduais e a consequente aposentadoria pelo Regime Próprio de Previdência Social do Estado do Tocantins.
O Tribunal Regional Federal da 1ª Região – TRF1 acolheu os diversos pleitos ajuizados e uniformizou o entendimento de que é possível a ocupação de cargo público de provimento efetivo por servidor não efetivado por concurso público, mas estabilizado pelo art. 19 do ADCT. Entendeu que tais servidores são “titulares de cargo efetivo”, embora não efetivados por concurso, e, dessa forma, subsumem-se à literalidade da norma do art. 40 da CF/88 que assegura o RPPS.
No Recurso Extraordinário nº 1.426.306/TO, que deu origem ao Tema nº 1.254, a Procuradoria-Geral do Estado do Tocantins demonstrou que as decisões do TRF1 violavam os arts. 40 e 41 da CF e o art. 19, caput, e § 1°, do ADCT, pois os regimes próprios de previdência social dos servidores públicos têm cobertura exclusiva a servidores públicos concursados, titulares de cargos efetivos, excluindo, por conseguinte, os estabilizados pelo art. 19 do ADCT.
A PGE/TO conseguiu importante vitória no Supremo Tribunal Federal (STF), demonstrando o trabalho estratégico dos seus integrantes. A defesa do Estado foi acolhida à unanimidade pelos ministros e foi fixada a seguinte tese (Tema nº 1.254): Somente os servidores públicos civis detentores de cargo efetivo (art. 40, CF, na redação dada pela EC 20/98) são vinculados ao regime próprio de previdência social, a excluir os estáveis nos termos do art. 19 do ADCT e os demais servidores admitidos sem concurso público.
A exclusão dos servidores estáveis na forma do artigo 19 do ADCT e daqueles admitidos sem concurso público do regime próprio de previdência social, conforme estabelecido no artigo 40 da Constituição Federal, destaca a necessidade de equilíbrio entre a proteção dos direitos dos servidores e a sustentabilidade do sistema previdenciário.
Nesse contexto, a interpretação e a aplicação das normas constitucionais têm um papel fundamental na definição das políticas previdenciárias. Tais questões precisam ser ponderadas em conjunto com as demandas financeiras e a capacidade do Estado de garantir benefícios previdenciários de maneira sustentável.
A atuação da Procuradoria-Geral do Estado do Tocantins no julgamento do Recurso Extraordinário nº 1.426.306/TO foi decisiva para a fixação da Tese do Tema nº 1.254, e corrigiu distorções atuariais provocadas pelas crescentes condenações do Estado a partir de interpretação equivocada de dispositivos constitucionais.
ALISON BERNARDINO FARIAS
É procurador do Estado do Tocantins associado à Aproeto. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Pará. Especialista em Direito Público e Gestão Financeira. Especialista em Direito Eletrônico. Foi Auditor do Controle Externo do Tribunal de Contas do Estado do Pará. Foi também Analista Judiciário do Tribunal Regional Federal da 1ª Região.
ESPAÇO APROETO – Associação dos Procuradores do Estado do Tocantins (Aproeto)