A Comissão da Diversidade da seccional tocantinense da Ordem dos Advogados (OAB) e a Associação das Travestis e Transexuais do Tocantins (Atrato) reagiram na tarde desta quinta-feira, 23, à promulgação da Lei 2.853 de 2020. O texto do vereador Filipe Martins (PSDB) proíbe os banheiros de uso comum, os chamados ‘unissex’, em órgãos públicos do município. Ambas as entidades repudiaram a publicação da legislação.
Na contramão
Em nota publicada nas redes sociais, a Comissão da Diversidade da OAB considera que o texto resulta na “reafirmação da transfobia estrutural” e lamentou o retrocesso diante de alguns exemplos positivos conquistados. “A presente lei vai de encontro, ou melhor, na contramão, dos diplomas recentemente promulgados na nossa cidade, e.g. [por exemplo o] Decreto 1.726/ 2019, onde se garante o uso do nome social a todas as pessoas travestis e transexuais nos serviços públicos de âmbito municipal. Em ainda mais recente vitória tal regulamentação também foi decretada no âmbito estadual [Decreto 6.191 de 2020]. Desde 13 de junho de 2019 o STF [Supremo] reconheceu e declarou crime a homotransfobia no Brasil”, anotaram.
Jamais pactuará com preconceito e ódio
A comissão segue reforçando o posicionamento contrário a qualquer forma de preconceito. “Os direitos da comunidade T, a complitude social, passa pelo respeito e garantia da dignidade humana. Esta Douta Ordem jamais pactuará com o preconceito e o ódio. Em um ano tão rígido e doloroso, com mais de 180 mil mortos pela Covid-19 em todo o País, valorizar a vida e a fraternidade da sociedade nunca fora tão essencial”, antou a entidade, que prometeu sugerir a criação de banheiros de gênero neutro no âmbito da seccional.
Ameaça população LGBTQI+
Já a Atrato afirmou em nota à Coluna do CT que a proibição prevista na legislação “configura violação à proteção da dignidade humana e ao direito de liberdade sexual e de gênero”. “É insatisfatório ao movimento LGBTQI+ presenciar vereadores que ousam usar a plenária de uma Casa de Leis para ameaçar toda uma população, configurando em um dano irreparável, visto que incita a violência e o ódio contra a população LGBTQI+ como um todo, quem vem sendo cotidianamente violentada e tenta sobreviver no país que mais mata pessoas trans do mundo. E é exatamente por isso que não iremos admitir este tipo de discurso
Temor às pessoas trans
Filipe Martins utilizou como base para a proposta um caso de agressão sexual em banheiro de gênero neutro nos Estados Unidos e em um reportagem de um véiculo britânico sobre o risco destas iniciativas às mulheres. A Atrato não considera justa a argumentação. “Há quem diga que a utilização de banheiros por pessoas trans coloque em risco a segurança dos demais usuários e usuárias. Esse medo, à primeira vista concedível, não encontra substrato na realidade, nem é capaz de justificar tratamento restritivo. Isso porque não há qualquer dado concreto que ampare o temor de que pessoas trans sejam ameaças ou cometam violência contra usuários e usuárias de banheiros, o que faz juridicamente ilegítima tal restrição, pois encontram-se fundadas em meras suposições preconceituosas, desprovidas de qualquer suporte fático concreto”, comenta.
Afronta às normas constitucionais
Por fim, a Atrato vê ilegalidade no ato. “Reconhecemos também que a norma municipal afronta às normas constitucionais e a disciplina complementar existente, configurando vício de inconstitucionalidade formal, invadindo a esfera legislativa privativa da União, desbordando dos limites da competência legislativa suplementar do Município, o que caracteriza usurpação da competência da União”, afirma.