Animais peçonhentos são aqueles que possuem ferramentas para introduzir toxinas capazes de ajudar a paralisar e digerir o seu alimento (presa). Contudo, estes animais também utilizam essas ferramentas para se defender, quando se sentem ameaçados.
Estamos estudando os animais peçonhentos no estado do Tocantins, com o intuito de promover a educação, pesquisa e inovação. A equipe é constituída por professores/pesquisadores, alunos de graduação e pós-graduação. Os estudos estão sendo conduzidos com os animais que causam mais acidentes no estado: arraias, escorpiões e serpentes (cobras).
Com foco na educação foi desenvolvido material didático (folders, cartilha, revistinhas, jogo interativo) para orientar a população sobre a biologia desses animais, e nestes estão apresentados os fatores que favorecem os acidentes, o que fazer em caso de acidente e como evitá-lo.
Também estamos pesquisando o papel desses animais na natureza e os fatores ambientais que podem interferir no seu comportamento e toxicidade dos venenos. As arraias são peixes dóceis, possuem um ferrão na cauda que é utilizado para defesa, quando são pisoteadas pelas pessoas ou outros animais. Os acidentes com arraias ocorrem com mais frequência no período de pouca chuva, quando aumenta o calor e a população procura os rios e lagos para se refrescar. Para evitar o acidente é importante entrar no ambiente aquático arrastando os pés.
Os escorpiões são terrestres e utilizam seu veneno para paralisar e digerir a presa. Está ocorrendo um aumento dos escorpiões nas cidades, devido à grande disponibilidade de alimento (baratas, por exemplo), e poucos predadores naturais. Os escorpiões mais encontrados no Tocantins não causam alterações clínicas graves. Para evitar o contato com os escorpiões é importante manter frestas e buracos fechados, colocar tela nas janelas e protetor nas portas.
Com relação às serpentes, já foram registradas mais de 112 espécies no estado, sendo somente 12 de interesse médico (surucucu, corais, cascavéis, jararacas). O maior número dos acidentes acontece com as jararacas, e no Tocantins a Botrhops moojeni, popularmente conhecida como malha de sapo ou caiçara, é a mais encontrada.
O perfil epidemiológico dos acidentes por jararacas no Tocantins revelou que este é semelhante ao perfil observado no Brasil, os encontros com serpentes ocorrem mais na área rural, em trabalhadores com idade entre 20 a 50 anos. Os acidentes aumentam nos períodos de chuva, quando as tocas desses animais ficam inundadas. Nesse período também aumenta a dinâmica do trabalho rural, com o preparo do solo, plantio e colheita da plantação, o que aproxima mais o homem desses animais. Para reduzir o risco dos encontros com as serpentes é importante o uso de equipamentos de proteção, como botas e luvas.
O estudo da toxicidade do veneno de Bothorps moojeni demonstrou que esta possui as principais toxinas que causam as alterações clínicas observadas nos acidentes com jararacas, mas que o antiveneno botrópico (soro) neutraliza estas toxinas. Contudo, o problema de sequelas e óbitos desses acidentes ainda permanece. Estudos já demonstraram que o tempo entre o acidente com a serpente e o início do tratamento com o antiveneno é o que agrava o quadro clinico do acidentado.
A população tocantinense relata o uso de plantas medicinais para o tratamento de acidentes com animais peçonhentos. Os estudos com algumas destas plantas estão trazendo resultados promissores. Foi observado, por exemplo, a atividade de repelência de serpentes pelas folhas da planta Petiveria Alliacea L. (erva tipi), pois esta é eficaz em afugentar as jararacas. A erva tipi também reduziu a atividade do edema induzido experimentalmente pelo veneno de jararaca, e a Jatropha elliptica (batata de teiú), reduziu atividade do veneno sobre o nervo frênico do diafragma.
É importante ressaltar que o antiveneno comercial é eficaz no tratamento dos acidentes com animais peçonhentos. Contudo, os estudos de bioprospecção de plantas medicinais poderão contribuir com o tratamento, principalmente para o controle das alterações locais desencadeadas pelos venenos, o que requer mais investigação.
Nossos estudos também estão voltados para fortalecer a imagem dos animais peçonhentos, que não são tão queridos pela população, mas que possuem um importante papel na natureza. Compreender a relação homem-natureza faz se importante para a conservação da fauna e flora do nosso cerrado tocantinense.
PROFA. DRA. CARLA SIMONE SEIBERT
É professora do curso de Ciências Biológicas e do Programa de Pós Graduação em Ciências do Ambiente, da Universidade Federal do Tocantins.
Apoio: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Tocantins – FAPT
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